CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

terça-feira, abril 23, 2019

ANÍSIO MELLO (1927-2010)

Anísio Mello

Faz uma dezena de dias em que se completou o nono aniversário de morte do multiartista Anísio Mello. Estava prestes a completar 83 anos. Viveu seus últimos tempos num casarão da Manaus da belle époque, situado na avenida Joaquim Nabuco, em frente à Beneficente Portuguesa. Foi ali que o conheci, levado pelo Chá do Armando, a extinta confraria que cuidava algumas vezes de letras, mas sempre do emblemático uísque. A edificação em si chocava, porém o companheirismo do anfitrião e os quadros de sua autoria faziam superar as penúrias do casarão secular. 

Tornei-me um habitué de seu empoeirado acervo. Empoeirado, mas inestimável. Durou pouco esse contato, pois a busca da cura da doença que o acometeu, levou-o hospital. E, de modo lamentável, não houve recursos medicinais para superar esse transe.
Anísio Mello morreu no Hospital Getúlio Vargas na tarde de domingo, de 11 de abril de 2010. Velado na Academia Amazonense de Letras, teve sepultamento na manhã seguinte no cemitério de São João Batista.




Voltei então ao acervo do extinto. Espanada a poeira, deparei-me com preciosidades, relíquias que o descaso, o infortúnio condenava ao entulho da cidade. Recolhi o quanto pude da pilha de desprezados objetos largados. Em casa, inventariando o butim, descobri ao menos quatro projetos de livro. Um deles – Convite a Poesia – saiu pelas edições Chá do Armando. Nesse momento, estou a organizar outro projeto: Estrela Viva, que espero seja lançado em comemoração ao centenário da Casa de Adriano Jorge.

Saquei do livro em organização, para ilustrar esta homenagem, o poema
Acalanto do menino morto 
O rio escorre no sangrado leito
em testemunho calmo e silencioso.
O rezador na ausência de melhor
arranca à várzea a última esperança
num ramo de qualquer verde brotando.
Sobre o corpo agonizante do menino
em cruz como se fossem pinceladas no ar
vai dizendo palavras da crença ribeirinha.
A canoa oscilava no acalanto trágico
e o menino Manuel apenas respirava.
Os olhos fechados punhos contraídos
palidez no rosto os lábios já sem cor.
O benzedor levanta os olhos e com voz contrita
anuncia a cura de esperada ânsia.
– Ele dorme... está aliviado...e até hoje nunca mais sofreu...
 Quantos meninos nesta várzea imensa
foram curados pelos benzedores
e moram para o todo e sempre
no painel da saudade de seus pais...

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