CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

segunda-feira, dezembro 01, 2014

DE: GENERAL PARA: ALMINO AFONSO


Almino Afonso, no IGHA, em 2003

Almino Álvares Afonso, cumprindo o segundo mandato de deputado federal, foi contemplado com a escolha de seu nome para liderar o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro). Aconteceu em 1961, ano que ficou marcado pela renúncia do presidente Jânio Quadros e a complicada disputa pela posse de Jango Goulart.

A criação da Petrobras, a mesma que hoje não consegue sair do noticiário policial, ocorreu em 1954, ainda no governo de Getúlio Vargas. Na época, cruzou o país um movimento pela instalação desta estatal, com a denominação de “O petróleo é nosso”.

Na campanha, Almino Afonso entrou de cabeça, enquanto estudante da Faculdade de Direito de São Paulo. Conhecedor dessa atuação, o general Leonidas Cardoso, pai do futuro presidente FHC, enviou ao então deputado a missiva que abaixo reproduzo.

A carta ficou conhecida, em Manaus, devido a veiculação no jornal A Gazeta, que a publicou com destaque. No entanto, o original da carta desapareceu do arquivo do destinatário, que a buscava sem sucesso. Certo dia, procurando eu “papeis velhos roídos” pelo tempo, encontrei a carta. Noutro dia, encaminhei-a ao meu confrade do IGHA que, prontamente, me agradeceu a “descoberta”, relatando alguns pormenores.

CARTA-ABERTA A ALMINO AFONSO (*)
Leonidas Cardoso (General)


Prezado amigo Deputado Almino Afonso.
Afetuosas saudações

Recorte da carta, em A Gazeta
Jamais deixarei de preocupar-me com os acontecimentos políticos de nossa pátria. Venho-os acompanhando, mais diretamente, desde 1909, quando meu saudoso pai, Joaquim Inácio Baptista Cardoso, então tenente-coronel do glorioso Exército Nacional, reuniu em torno do mesmo ideal os velhos republicanos Quintino Bocaiuva, Lopes Trovão, José Mariano, Coelho Lisboa, J. da Penha, Andrade Silva e muitos outros.
Habituei-me, daí, ao trato dos homens e aprendi a julgá-los também através os ensinamentos de Emerson: “Usa a linguagem que quiseres, nunca poderás dizer senão o que fores”, porque segundo a sabedoria popular: “Ninguém se deve fiar nas aparências. O tambor, apesar de todo barulho que faz, está cheio de ar, simplesmente”.
De instante a instante – retomando as minhas palavras iniciais – os fatos da nossa vida social se sucedem e de todos eles o que mais me atraiu a atenção, ultimamente, foi a escolha de seu nome para líder do Partido Trabalhista Brasileiro, na Câmara Federal. Considero-a uma consequência lógica das campanhas nacionalistas que, em São Paulo, tiveram em você um dos seus mais eficientes elementos.
Lembro-me do acadêmico Almino Afonso, na tradicional Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, sempre na primeira linha dos combatentes, consciente e atuante. Tudo que aconteceu aquela época – e longe seria enumerar os ingentes esforços dos patriotas – podemos nós hoje afirmar, foram em suma verdadeiras e corajosas pregações cívicas, em defesa do monopólio estatal do petróleo, principalmente, nas quais contamos com o decisivo apoio dos brasileiros independentes de todos os quadrantes do país.
Tenho minha confiança na firmeza da sua posição, face aos legítimos interesses nacionais. O que vem impedindo a muitos homens públicos de se conservarem fiéis às necessidades do povo no desempenho dos cargos administrativos e dos mandatos eletivos que lhes têm sido confiados, são os VISCOSOS EMBARAÇOS DE ORDEM MATERIAL. Destes, entretanto, você está livre, graças aos principados da moral política que segue e da perfeita compreensão dos seus deveres de cidadão.
Moço que você é, já com grandes responsabilidades nas lutas pela emancipação econômica do Brasil, quero aqui recordar um exemplo histórico: FLORIANO! Jovem, com 26 anos de idade, segundo-tenente do Exército, marchou ele para os campos de batalha do Paraguai, de lá regressando galardoado com três promoções por bravura. O major Floriano, mesmo no governo imperial, sem ser um áulico, cedo atingiu o generalato, imposto pelo seu passado militar e patriotismo. Filho de lavradores, modesto, bom cidadão e bom soldado, sem os artifícios da palavra exuberante, acompanhou o desenrolar da política do povo brasileiro, até a implantação do regime democrático em 1889.
Coube ao seu caráter de homem íntegro, independente, de ação discreta mas enérgica, a grandiosa obra da Consolidação da República, que constituiu a fase brilhante da nossa nacionalidade em que os brasileiros viram agitada a bandeira do nacionalismo até o paroxismo, na célebre frase de Floriano: “A BALA!”.
Concluindo, retorno a sabedoria popular: “As ações são sempre mais sinceras do que as palavras”, ou em sentido mais completo, na opinião de Frederico Bricha: “A multidão julga os homens pelas palavras, a história julga-os pelas ações”. À sua inteligência e perspicácia, deixo o trabalho de pesquisa e identificação, para uma justa aplicação, nos nossos dias, dos conceitos contidos nos provérbios citados.

(*) A Gazeta, 5 abr. 1961