CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

quinta-feira, maio 30, 2013

PADRE PAULINO

Governador Mestrinho (à esq.) e padre
Paulino Lemmeier (à dir), 1960
Padre Paulino Lemmeier era, de fato, o alemão chegado a uma cerveja, lembrança da terra natal, certamente. Desembarcou no Brasil, indo direto para Maués (AM), adiante, promovido para a capital, cuidou do rebanho católico do Imboca ou Emboca. Me ajude, professor Figueiredo.
Quando eu era estudante no Seminário São José, no início dos 1960, fui aluno de francês do citado padre. Apesar da canícula, comparecia embatinado, batina preta, para as aulas. Não faltava. Era pontualíssimo. Um dia, sem ideia de traquinagem, enceramos muito bem a sala de aula. O primeiro a chegar foi o padre Paulino, que escorregou e quase foi ao chão com seu corpanzil.
Ouviu as explicações, mas não deixou dúvidas quanto a sua reprovação.  Logo encontrou motivo para sapecar “zero” em todos, menos no futuro padre Epaminondas Lobato. Que Deus o tenha!.

* * *
Arte de estudantes, o saudoso professor Mário Ypiranga (*) conta outra faceta deste sacerdote, que foi o primeiro vigário de Santa Luzia.


PADRE PAULINO

O padre Paulino era alemão de origem e ensinava francês no Colégio Estadual do Amazonas, no meu tempo de professor da casa. Na mesma turma daquele Maíno Maia da Gama. Antes de entrar no Ginásio o padre dessedentava-se com uma ou duas cervejas no bar "Real Colón" (hoje uma filial das lojas Americanas, na proximidade do mesmo Colégio).  

Era muito gordo e não largava a batina, por isso aquelas aulas de uma hora da tarde causavam depressão orgânica e até atonias suores abundantes e tédio. Mas o padre era pé de boi, não faltava,
chegava e saía na hora. Entretanto, suas aulas não aproveitavam porque a turma era das piores que o turno da tarde recomendava.
Assim mesmo o padre Paulino mantinha a disciplina, por isso não era muito benquisto.

Uma tarde, entrando na sala, viu uma quadrinha garatujada no quadro verde:
Paulino sem pau é lino,
Paulino sem lino é mau
Tirando pau do Paulino
Paulino fica sem pau.

O padre não esquentou logo. Pegou o bastão de giz e escreveu por baixo:
Agora é a vez do Paulino
com seu pau e com seu lino
dizer àquele menino
que escreveu verso cretino
que mete o pau no destino

desse poeta pequenino
feio, magro, e franzino,
cujo nome não declino
mas sabem ser o malino
da gama o mais ladino.

Imensa gargalhada recebeu aquela tirada do padre. O safado do Maíno levantou-se, fez uma reverência gaiata e esperou sério, o que viria. Inútil era perguntar quem o autor da pilantragem. A turma era solidária.

Mas, por via das dúvidas, desconfiou do Maíno Maia da Gama. O padre chamou o Cangalhas (inspetor de alunos, estúpido como um carroceiro e ex-craque de futebol) e entregou-lhe a missão de descobrir o autor. Mas antes marcou falta em todos e registrou na pajela o ponto que iria dar e que seria cobrado na primeira prova escrita. O autor não apareceu e a turma inteira foi suspensa por três dias.

 
(*) Mário Ypiranga Monteiro. Histórias facetas de Manaus: anedotas envolvendo figuras amazonenses. Manaus: Edições Governo do Estado, 2012.

segunda-feira, maio 27, 2013

AS ARMADURAS DA POLÍCIA MILITAR


Detalhe da armadura
existente na PMAM
Em seu livro Histórias facetas de Manaus, o saudoso mestre Mário Ypiranga conta uma bem interessante faceta sobre estas peças, adquiridas na França no início do século passado. São duas, e fizeram parte de um pacote que incluía diversos ornamentos bélicos, hoje em exposição no Palacete Provincial.


As vestimentas metálicas eram apresentadas como medievais, quando verdadeiramente eram peças fabricadas como adereços. Mas, como impressionavam!. E, como eram capazes de comportar um homem, em algumas paradas de Sete de Setembro “desfilaram” em carro aberto.

A respeito do desfile há outra faceta acontecida em 1957. Cleto Veras, major do Exército, comandante da Polícia Militar, determinou ao capitão Edmundo Monteiro, comandante dos Bombeiros, que usasse a tal armadura no desfile do Dia da Pátria. O capitão reclamou alegando a dificuldade em suportar o trambolho em meio ao sol forte.

O comandante da PM não admitiu a desculpa, disso resultou uma desavença entre ambos, que por pouco não chegou ao desforço físico.

Eu desconhecia que essa peça metálica tivesse saído do quartel. Assim pensando, promovi uma exposição de material da PM no Shopping Amazonas. A expo foi dividida em três seções, e a armadura representava os primeiros momentos da vida policial militar no Amazonas. Pensava que a “armadura medieval” fosse dominar a exposição.

Isso não aconteceu em função da presença de uma motocicleta Harley Davidson. Essa, de fato, concentrou as atenções de tantos marmanjos, que chegaram a imaginar um clube da Harley.

Mais adiante, quando eu dirigia o Museu Tiradentes, para ilustrar uma entrevista com o comandante da PM, levamos a armadura ao estúdio da TV Amazonas, então situada na avenida Carvalho Leal, na Cachoerinha. Desconheço o ibope alcançado. Isso dito, vamos à faceta contada pelo professor Mário Ypiranga.

COURACEIROS EM MAUS LENCÓIS  (*) 

De vez em quando estou encontrando uma foto batida por mim durante certa parada, ao lado do Teatro Amazonas. Não sei quem o autor intelectual da "patriótica" inovação, mas ela acabou em corre-corre quase fatal. Haviam metido dois soldados arigós dentro das armaduras medievais do museu da Polícia Militar, a fim de desfilarem.

Só mesmo uma cabeça desmiolada poderia conceber aquela farsa extemporânea. Quando o sol começou a esquentar o metal
da armadura completa, os dois arigós não aguentaram o calor e se mexiam gritando, dando azo a que o povo saudasse a marmotada com gritos e assovios, isto porque, para desvestir os dois títeres
deu um trabalhão. Quase morriam sufocados.
 
(*) Mário Ypiranga Monteiro. Histórias facetas de Manaus: anedotas envolvendo figuras amazonenses. Manaus: Edições Governo do Estado, 2012.

sábado, maio 25, 2013

HISTÓRIA DE MANAUS


Mais um texto sobre a história do Amazonas, dessa vez sobre os primeiros momentos da sua capital, escrita pelo autor de História do Amazonas, em 1931. Dois anos depois, em colaboração para a revista Victoria-regia, assina o artigo aqui postado.

A VILA DE MANÁOS (*)

Arthur Cézar Ferreira Reis

 

Foi em 1669, que um oficial português, Francisco da Motta Falcão, de ordem do governador paraense Coelho de Carvalho, veio levantar o fortim de São José do Rio Negro.
Quem verificou o fato? O ouvidor Ribeiro de Sampaio, homem-ação, espírito atilado, culto, ao lado do cumprimento de suas obrigações judiciárias, recolhia quanto interessava o povoado da comarca que lhe tinham confiado. A história do fortim, nos seus primeiros instantes, devemo-la a ele, que a recolheu em meia dúzia de linhas de seu muito estimável “Diário da viagem de Correição etc.”.

Registros dos primeiros momentos de Manaus-AM
 
O estabelecimento militar era de pouca eficiência bélica. Artilhado com quatro peças, servia antes à proteção dos sertanistas ousados que inventavam a escravização do braço indígena. Daí, talvez, a lição de João Ribeiro, quando escreveu que a guarnição ali era volante, querendo deixar patente a constante movimentação da tropa, saída não poucas vezes para cooperar com o sertanista em perigo às sortidas violentas do ameríndio.

À sua volta logo principiaram os tapiris indígenas. Barés, banibas, passés, trabalhados cristãmente por dois jesuítas, cujos nomes se perderam, aldearam-se ali. Foi aos poucos nascendo um povoado. Brancos também começaram a chegar-se à sombra da casa forte.
Na sexta década do século XVIII, refere-se o naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira, alguns centos de nativos, às ordens de Manuel Dias Cardoso, criminoso perdoado por D. José, vieram para o lugarejo, o Lugar da Barra, como então lhe chamavam.

Até 1791, nada de importância lhe veio dar nomeada. O general Pereira Caldas, chefe da comissão de limites com as colônias espanholas no setor norte, votava-lhe simpatia. Por que a capital da Capitania de São José do Rio Negro, edificada em Barcelos, não se levantava ali, ponto magnífico, posição central para as províncias ao Solimões, ao Baixo Amazonas, ao Madeira e ao próprio Rio Negro?
A velha Mariuá fora escolhida, asseguram alguns autores, porque oferecia, no momento da criação da Capitania, melhores acomodações aos governantes, uma vez que Mendonça Furtado fizera edificá-la pomposamente, para o grande espetáculo político-internacional que seria a reunião das comissões portuguesas e espanholas encarregadas dos limites na Amazônia. Então as razões de estado que aconselhavam a transferência da sede da administração não se levavam agora em conta?

Lobo d’Almada, o mais arguto e o mais digno estadista que a Amazônia conheceu, -- fiado em que lhe bastavam essas mesmas razões, aventurou-se ao passo arriscado, dispensando a autorização do Pará e da metrópole. E em 1791, com o pessoal que formava o aparelho diretivo do rio Negro, estabelecia-se no Lugar da Barra.
São unânimes os cronistas, na afirmativa que o povoado não desse ares de maravilhar. Menos que isso até – com população minguadíssima, na maioria gentilidade, ano a ano mandada, pelos decimentos, a engrossar as fileiras dos moradores do pacatíssimo lugar nascente.

Lobo d’Almada, na futura Manaus, não descansou mais um instante. Reformou o pouco que havia. Rasgou ruas, abriu caminhos, construiu os edifícios públicos, instalou fábricas, animou a vida econômica do lugar com o comércio e a agricultura a que deu o mais franco impulso.

Em breve tempo já era outro o Lugar da Barra, provocando, naturalmente, as ciumadas das vilas do Solimões, Baixo Amazonas e Rio Negro. Mas, Lobo D’Almada governava o Amazonas, convém não esquecer. E governava-o com heroísmo, com vontade de acertar. Não era possível, portanto, continuar aquilo assim. O Amazonas progredindo?... A intrigalhada começou. D. Francisco de Souza Coutinho, capitão-general do Grão-Pará, a quem Almada estava subordinado, dispunha de força, de prestígio junto à Corte, em Lisboa – um irmão no ministério! Suspeitando que Almada pudesse vir a substituí-lo nos destinos do vale todo, apressou-se em criar-lhe ambiente negro. Foi feliz na empreitada, pois lhe deram crédito – Almada andava a engordar o bolso a custa da Fazenda Pública, fez crer na metrópole.

Não houve defesa que servisse, mesmo porque a correspondência do infamado não chegava às vistas do pessoal da metrópole, interceptada em Belém ou em Lisboa pelo muito nobre mano de D. Francisco. A história de sempre, não parece ao leitor? Almada era bom, honesto, empreendedor, procurava elevar o Amazonas, logo...
A sede da Capitania, por ordem régia, obra das maldades de D. Francisco, regressou a Barcelos. Ano de 1798, mês de maio. Em 27 de outubro desse ano, Almada, abatido ante tanta miséria (como os tempos se parecem) não pode mais resistir.

A Capitania, o Lugar da Barra entraram a definhar. Em 1804, já o Pará entregue aos cuidados do Conde dos Arcos, a memória do inesquecível batalhador pela grandeza do Amazonas foi louvada, com a determinação claríssima para que a Barra voltasse a agasalhar os governadores do Rio Negro.
É bem verdade que os homens mandados a continuar a obra gigantesca de Almada não lhe souberam seguir as pegadas. A Barra, consequentemente, não teve progresso assinalável. Até o fim do domínio colonial. Teatro de acontecimentos remarcáveis na história amazonense, no período que vai de 1823 a 1833, cresceu em população, desenvolveu o comércio. Nas atas da Câmara de Serpa, que por vezes veio funcionar aqui, há abundante material para conhecer-se do aumento do Lugar com os chãos concedidos, com as autorizações para a abertura de casas de negócio, aspectos sociais interessantes que vou detalhar inteiro mais adiante, em livro em preparo.

Em 1832, havia onze ruas e duas praças, o perímetro urbano grosso estava a área entre São Vicente e a face esquerda do Jardim da Matriz, onde corria o igarapé do Espírito Santo e se levantava uma ribeira de construção de embarcações.
Nos Remédios, começava a formar-se um bairro, em torno da capela iniciada em 1818. Era de difícil acesso, por separada do restante da Barra por igarapés. Da delegacia fiscal para a praça general Osório e daí para cima era a campina. Na Cachoeirinha, aqui e ali, sítios.

*  *  *

Em 1832, em novembro, o governo da regência fez entrar em vigor, para todo o Império, o Código do Processo Criminal. Reformava-se, pela lei sábia, a organização judiciária da Nação. Em Belém, a 25 de junho de 1833, o Conselho Provincial na sua alta ciência de legislador, cumprindo o que estava ali estatuído, alterou a divisão do Pará. A comarca do Rio Negro passava a denominar-se do Alto Amazonas, com novos limites, ilegalmente mandados observar sem a aprovação do Parlamento Nacional como era de direito. Das vilas antigas foram mantidas Barcelos e Ega, sobre os primitivos nomes de Mariuá e Tefé; Serpa (Itacoatiara), Silves, Borba, São Paulo de Olivença, São Jose do Javari, Moura, Tomar, passaram a simples termos, subordinados às duas vilas conservadas e às duas novas criadas – Manaus e Luzéa (hoje Maués).

Esta era dos mais novos núcleos humanos criados. Datava de fins do século XVIII, quando os Mundurucus tinham sido pacificados. Ainda obra de Almada. Contava com a população de 1.627 indivíduos, que cultivavam 129.000 pés de café, 23.700 de cacau, 24.500 de tabaco e 51.900 de algodão. Daria que falar nos dias sangrentos da Cabanagem, com os feitos de Bararoá e de Miranda Leão, o famoso Quebra Ferro.

Manaus, com o título ambicionado, enchia-se de alegria. De então em diante, dominaria o Amazonas. Pelo decreto citado, passava a ter câmara municipal, juiz de direito, juiz de órfãos, juiz de paz, promotor público. Não demorou muito a execução do que a lei mandava.
A Câmara foi instalada a 21 de dezembro de 1833, no edifício da Fábrica Imperial. Os vereadores escolhidos em eleição, realizada a 17 de dezembro, foram – Manoel Gonçalves Loureiro Filho, presidente, Francisco Gonçalves Pinheiro, Matias da Costa, João Inácio Rodrigues do Carmo, Henrique João Cordeiro, Cláudio José do Carmo e Francisco de Paula da Silva Cavalcante.

Houve regozijo público. Na matriz da Nossa Senhora da Conceição, ao tempo no que é hoje a praça Nove de Novembro, frei José dos Santos Inocentes celebrou solene Te Deum. As casas dos moradores estiveram iluminadas por espaço de três dias. A Câmara não pagou logo as despesas. Frei José, a 5 de abril de 1834, compareceu de requerimento em punho, cobrando o que lhe deviam – 26$000!

Os demais cargos também foram preenchidos – juiz de direito, interino, Henrique João Cordeiro; juiz de órfãos, João da Silva e Cunha; promotor, Francisco Alexandre Leite, o primeiro da lista tríplice apresentada à escolha do presidente do Pará pela Câmara manauense.

De humilde Lugar da Barra, sujeito à Câmara de Serpa, à Câmara de Barcelos, Manaus era agora vila, sede da comarca do Alto Amazonas. A Cabanagem (1835-40) estava a estourar e com ela o relevo político do burgo que nascera à sombra da casa forte de Motta Falcão.

(*) Reproduzido da revista VICTORIA-REGIA, circulada em Manaus, em outubro de 1933.

quarta-feira, maio 22, 2013

IGREJA DOS REMÉDIOS (2ª Parte)


LIGEIRO HISTÓRICO DA IGREJA DE N. S. DOS REMÉDIOS
Francisco Bemfica (*)

Altar da igreja dos Remédios,
2004
A 16 de dezembro de 1901, foi solenemente realizada a colocação de uma pedra fundamental para uma nova igreja. Dois anos após, em agosto de 1903, já se achava pronta a sua capela, cuja benção lhe foi lançada a 14 do mesmo mês.
Ainda no referido ano, a lei municipal nº 307, de 2  de setembro, autorizava a Superintendência (prefeitura) de Manaus, a “auxiliar com a quantia de 5.000$000 as obras de reconstrução da igreja dos Remédios”. Outra lei municipal, nº 385, de 20 de dezembro de 1904, dava-lhe outro crédito de mais 5.000$000 para seu auxílio no orçamento de 1905.

Por outro lado, monsenhor Antero José de Lima, que fora em 1901 nomeado vigário da paróquia, despendia esforços para uma definitiva reconstrução da igreja.
Dom Irineu Jofilly
Nesse sentido, convidou seus paroquianos para uma reunião que se realizou a 21 de março de 1904, para a escolha, dentre eles, de “alguns para auxiliarem na indicação de medidas práticas, lembrando cada  um o que  achasse melhor”. Escolhida a comissão, esta ficou assim composta: coronéis Antônio Bittencourt, Ramalho Junior e Francisco Bittencourt; doutores Rodrigo Costa e Elias Tomé de Souza. Eram secretários os coronéis Felipe Minhós e Lopes Braga.
Pelos esforços dessa comissão e a boa vontade dos paroquianos, foram os trabalhos de reconstrução iniciados em agosto de 1905, ficando a direção técnica sob as vistas do arquiteto José Antônio Gomes.
O Congresso, em 6 de outubro do citado ano, apresentava uma emenda, com nº 39 ao projeto nº 11, em que ficava o Governo autorizado a “pagar 40.000$000, a título de indenização, à igreja dos Remédios, pela cessão do terreno em que se acha construído a escola Públio Bittencourt”, hoje secretaria-geral da Instrução  Pública”. Essa emenda foi aprovada na sessão seguinte, a 17 do mesmo mês.

Mas, apesar desses auxílios, dos óbolos dos católicos e a boa vontade da comissão, anos depois, as obras, mais uma vez, eram paralisadas...
* * *
Sob a direção de Dom Irineu Jofilly, em 1920, foi reiniciada, definitivamente, a reconstrução da igreja começada em 1901 com o lançamento de uma pedra fundamental. Organizaram-se listas para os fieis e pessoas amigas contribuírem mensalmente com qualquer importância.
Dessas listas a maior contribuição era de 50$000 (cinquenta mil réis), e a menor 1$000 (mil réis). Afora essas contribuições mensais, outras eram recebidas em esmolas avulsas. E tão grande foi a caridade dos católicos que em setembro de 1922 os óbolos recebidos perfaziam o promissor total de 88.676$100.

* * *
A bondade cristã da Sra. D. Zila Amaral, levou-a a ofertar à igreja uma belíssima imagem de N.S. dos Remédios, de tamanho natural. A benção da nova imagem foi levada a efeito no dia 16 de março de 1923, às 16h30, mais ou menos. Ato brilhante, que muito rejubilou os católicos e o povo.


Serviram de paraninfos os senhores comendador J.G. Araújo, coronel Leopoldo de Mattos, Dr. Samuel Uchoa, desembargador Paulino de Mello, Dr. João Baptista de Faria e Souza, coronel Pedro de Souza, coronel Pedro Cavalcante, Francisco Bonates, desembargador Luna Alencar; e as Senhoras Eliza de Rezende do Rêgo Monteiro (esposa do governador), Cândida Monteiro, Lucia Murity, madame Brestilau de Castro, Lucinda de Faria, Leopoldina de Brito Pereira, Brasilina Cândida de Lima, Francisca Monte de Assis, Emília Reis (mãe de Arthur Reis), Maria Emília Moraes, Virgínia Azevedo Pessoa, madame Flávio de Castro, Benvinda Coelho, Mercedes Madureira de Pinho, Alcinda Sá Antunes, Nini Jardim, Filomena Castelo Branco, Esmeralda Cassiana e a família Borba.
Atingiu a 1.680$000 o total de óbolos oferecidos pelos paraninfos, sendo maior o do comendador J. G. Araújo, que foi 1.000$000 (um conto de réis).
* * *
Falecendo, a 11 de outubro de 1924, monsenhor Antero José de Lima – “um dos vultos mais representativos do nosso clero” – passou a desempenhar o cargo de vigário da freguesia dos Remédios monsenhor Dr. Raymundo de Oliveira, nomeado por Dom Basílio Pereira, bispo da Diocese do Amazonas.


Monsenhor Alcides
Albuquerque, vigário dos
Remédios
Monsenhor Oliveira não poupou esforços para terminar as obras da igreja, que há tanto tempo vinham sendo começadas e logo interrompidas, e que foram a grande preocupação de monsenhor Antero. E afinal, com mais um pouco de esforço, auxiliado sempre pelo generoso povo católico do Amazonas, que jamais se negara a amparar essa obra de tanto valor moral, que há muito vinha desejando se consumasse, conseguiu monsenhor Oliveira terminar, definitivamente, a reconstrução da antiga ermida erguida em 1817.


* * *
E hoje – quando na Espanha e na Rússia se destroem num vandalismo louco centenas de catedrais – a igreja N.S. dos Remédios é mais um templo que possuímos para, num recolhimento sagrado, numa fé verdadeiramente cristã, orar pelos que merecem piedade... pelos inconscientes... por todos os desgraçados que, por falsas religiões, pretendem sem jamais conseguir negar a existência de um poder sobrenatural, formidando, único dominador do cosmos e que leva o homem, mesmo sendo um descrente de sua força, no momento mais crítico de sua vida, quando já não mais espera dos recursos terrenos, a voltar os olhos para os céus e numa derradeira prece clamar – Deus!

Março de 1932.
(*) Reproduzido da revista Victoria-regia, abril de 1932. O autor do texto era diretor e redator da publicação.

IGREJA DOS REMÉDIOS (1ª parte)

LIGEIRO HISTÓRICO DA IGREJA DE N. S. DOS REMÉDIOS

Francisco Bemfica (*)

A ânsia de descobrimentos marítimos no século XV – força poderosa que tanto impedia o homem a ir “sobre o dorso das ondas conquistarem a predestinação dos heróis” em busca do desconhecido, na glória de desvendar novas terras – jogando o aventureiro audaz à Terra do Cruzeiro, trouxe com ele a religião católica.
 
Igreja de Nossa Senhora dos Remédios, em
construção, no início do século passado
 

E foi esta – à qual mais deve o Brasil a sua civilização – a primeira que, pela palavra purificadora de seus missionários, veio dar a ideia do verdadeiro Deus aos nossos nativos, sendo também a primeira que erigiu templos, desde o litoral aos sertões mais distantes das nossas matas, cujas modernas catedrais e as ruínas de antigas igrejas atestam em nossos dias a obra formidanda do Cristianismo no Brasil.

* * *
Majestosa, embora o seu tamanho, olhando a mansidão das negras águas da baía do mesmo nome, está a igreja N.S. dos Remédios encerrando em si um capítulo magnífico da história da religião católica no Amazonas, a terra que “ainda não estava preparada para receber o homem”.
Em 1818, toma conta do governo da Capitania Manoel Joaquim do Paço. Homem escravo do ouro, ambicioso, tratou logo de arranjar meios, embora ilícitos, por onde pudesse realizar sua desmedida auricídia. E assim pensando, erigiu, uns 609 passos abaixo da povoação da Barra, uma capela que denominou de N.S. dos Remédios.

Escudado sob a falsa aparência de seu benfeitor, organizou uma lista dos moradores que podiam dispor de dinheiro, e mandando-os chamar um a um, “arguia-lhes sobre o crime do cordeiro pelo lobo da fábula, e sem mais os deixava ir passear na Barra, e lhes impunha a taxa de esmola para a igreja N.S. dos Remédios de 500$000, 400$000 e 300$000”. E mais, era praxe oferecerem-lhe uma ceia, aumentando as despesas de mais uns 80$000. E só assim poderiam se ver livres...

Felizmente que esse salteador mascarado não demorou muito no governo da Capitania, sendo logo deposto.

Ao chegar, em 1821, a notícia do movimento constitucionalista, foi a metade da igreja destruída pela fúria inconsistente de alguns exaltados patriotas, sendo, porém, pelos esforços do ouvidor Dr. Manuel de Bernardino Figueiredo, reconstruída e franqueada ao público mais ao menos no ano de 1828. Erroneamente J.B. (João Batista de Faria e Souza), em uma monografia publicada sobre a igreja dos Remédios, assinala essa reconstrução no mesmo ano de 1821, pois em ofícios encontrados no arquivo público verificamos que só em 1827 é que chegou à Barra o ouvidor Manuel de Bernardino Figueiredo.
Logo, os reparos por ele feitos, só poderiam ter sido depois de 1827...
* * *
Quando, em 1850, no dia 2 de julho, a igreja matriz N. S. da Conceição foi destruída pelas labaredas de um incêndio, os Ofícios Divinos passaram a ser celebrados na igreja dos Remédios. Devido estar esta situada no bairro do mesmo nome, a E. (Leste) da cidade, e para se ir até lá fosse preciso atravessar alguns igarapés que cortavam a cidade, e em tempos de cheia só houvesse passagem em pequenas canoas, que punham em perigo de vida os seus tripulantes, ou então uma péssima estrada, muito longa, que contornava a cidade, algumas dificuldades se opunham aos fieis dos outros bairros – S. Vicente e Matriz – a irem comumente à improvisada matriz.
Na presidência do Dr. João Pedro Dias Vieira, em 1867, foi-lhe levantada uma torre, que as chuvas não deixaram terminar os últimos reboques, causando isso, mais tarde, a quase destruição da parede-mestra. Também lhe reformaram interior e exteriormente, erigiram à entrada um coreto para música e ao lado do altar uma tribuna, correndo todas as despesas por conta do município e de uma subscrição feita pelo reverendo cônego Vigário-Geral.
* * *
Em consequência de não terminarem os reboques derradeiros da torre e a parede-mestra ameaçar desabar, novos reparos se impunham à igreja, e que não eram descuidados pelos governos, desde 1857.
Wilkens de Matos, em seu relatório à Assembleia Legislativa, em 25  de março de 1870, declara que as obras da igreja dos Remédios estão quase concluídas, tendo feito uma despesa de 10.626$304 (dez contos, seiscentos e vinte e seis mil e trezentos e quatro réis).

No ano seguinte foram os reparos terminados, na presidência Miranda Reis, que gastou mais 2.269$343. Foi somente em 1878 – cinco anos mais tarde depois de sancionada a lei nº 564, dividindo a freguesia de N.S. da Conceição de Manaus em duas – que o bispo diocesano Dom Macedo Costa, canonicamente instituiu a paróquia de N.S. dos Remédios, por ter sido então promulgada a referida lei nº 564.
* * *
Em 1896, a 23 de maio o Congresso dos Representantes do Estado decretou e promulgou uma lei que autorizava o governo a “entregar os próprios estaduais e municipais, destinados aos ofícios da religião católica, ao Bispado do Amazonas”. Como não pudesse entrega-los em perfeito estado, o Dr. Fileto Pires, governador do Estado, ordenou que fosse entregue ao Bispado a quantia de 50.000$000 (cinquenta contos de réis), a fim de serem renovados os próprios ofertados. Desse dinheiro, 10.000$000 tocaram à igreja de N.S. dos Remédios. (veja a 2ª parte)

(*) Reproduzido da revista Victória-regia, circulada em abril de 1932. O autor do texto era seu proprietário e editor.

EXPLICAÇÃO PARA ESTA AUSÊNCIA


Toda esta ausência se deveu a minha pouca ou nenhuma habilidade com a internet, com os comandos, com essa gostosa parafernália. A cada entrave, é um Deus me acuda, tenho que recorrer a tantos, alguns “profissionais” não passam de aprendiz de feiticeiro.

Moral da queixa: durante este período, não consegui abrir este Blog, com isto fiquei impedido de postar. Agora, depois de pesquisar sobre um saudoso regente da Banda de Música da PMAM, consegui através de outro blog me acertar com a internet.

Então, com minha curta e enrolada explicação, to explicado!

quarta-feira, maio 15, 2013

BANDA DE MÚSICA DA PMAM: 120 ANOS (3)


Banda da PM AM em desfile pela av Getúlio Vargas.
Reproduzido do Diário Oficial do Estado, 1942
Há 100 anos, completados em janeiro, o médico Jonathas Pedrosa assumiu o governo do Amazonas, herdando uma desabonada Força Militar, porquanto envolvida em grave rebelião no final de 1912.  O triunvirato de oficiais, comandado pelo tenente-coronel José Onofre Cidade, tomou o comando da corporação e, em seguida, usurpou o Poder Executivo, mantendo essa situação por 48 horas.
A reação do governador Pedrosa foi, reorganizando a Polícia Militar do Estado, expurgar os sediciosos. O Regimento Militar do tempo áureo da borracha já havia sofrido uma rebaixada de escalão ao ser denominado de Batalhão Militar do Estado, desde 1908. A reestruturação promovida neste governo reduziu ainda mais o efetivo, e modificou a denominação da corporação para  Batalhão de Segurança. Estou tratando da força operacional, todavia, por obviedade, as fanfarras sentiram a igualmente a redução, agrupando-se em única Banda, desde 1908.

Encerrado o fausto da borracha, aconteceu uma desaceleração da economia do Estado, levando no bojo a instituição policial militar e, como parte integrante da mesma, a Banda de Música. Ainda assim, perseverou servindo à Força Policial e as farras da cidade; prestou as continências de estilo às autoridades em visita a Manaus; do mesmo modo, alegrou os ágapes oferecidos aos visitantes; acompanhou as procissões religiosas; esteve no Teatro Amazonas, no intervalo das peças em exibição. Realizou passeio (desfile) pelas ruas centrais, sempre nas datas festivas, marcando a cadencia do Batalhão Policial. Tudo isso, até que chegou a Revolução de 1930.
Contudo, não se possui registro atualizado dos regentes no período entre 1913, sinalizado pela morte do capitão Manoel Lavor, e a movimentação atípica da Força Policial em 1924, quando do governo revolucionário de Ribeiro Junior e seus sucessores.
No ano seguinte, em fevereiro, tem-se o nome do 2º tenente Benedito Tavares de Azevedo, que assume o cargo de Mestre de Música. São raras as anotações sobre este: apenas que nascido em Manaus, em 1873, nenhuma nota acerca de sua formação profissional, e que exerceu a regência da Banda até janeiro de 1928. Enfim, que retornou ao batente, quando da reativação da Força Policial em 1936.

A desativação da Polícia Militar em novembro de 1930 promoveu uma barafunda entre seus membros, incluída a Banda. Dispensados do serviço, oficiais e praças buscaram e aceitaram qualquer forma de sobrevivência. Uns se apegaram e foram empregados pelo Governo, outros se retiraram de Manaus, mas nos músicos incidiu uma sobrecarga. Afinal, músico somente sabe tocar.

E foi assim que procederam aos “sem-música”, buscando com a arte prover a subsistência dos seus dependentes. Eram tempos difíceis, por isso, aceitavam qualquer tocata sem distinção de ambiente, afinal estavam destituídos da farda. Mas, tanto tocaram pelas esquinas, que restaram conhecidos pela alcunha de “banda dos abandonados”.  Ao final de 1935 foram socorridos pelo Governo do Estado, mas já o próprio Executivo se empenhava em restaurar a Polícia Militar.
Em abril de 1936, registrou-se o retorno da Polícia Militar à atividade. Havia passado cinco longos anos, consoante os registros alcançados e as palavras de júbilo com que o tenente-coronel José Rodrigues Pessoa, comandante de então, saudou os novos tempos.

Na direção da Banda de Música estava novamente o tenente Benedito Tavares de Azevedo, aos 63 anos. (segue)

segunda-feira, maio 13, 2013

HISTÓRIA FACETA (2)


Outra reprodução de Histórias Facetas de Manaus: anedotas envolvendo figuras amazonenses, livro de Mário Ypiranga Monteiro, lançado mês passado pelo Governo do Estado/Secretaria de Estado da Cultura. 

O PROFESSOR CARLOS MESOUITA: MIOLO DE BOI-BUMBÁ
Revista Victoria-regia,
abril 1932
No dia da homenagem ao hanseniano, na Colônia do Aleixo, foi realizada uma boa festa, com a participação da Legião de Escoteiros, da qual fazia eu parte na categoria de Lobinho, e mais dois bumbás tidos e havidos como ferrenhos adversários: "Mina de Ouro" e "Vencedor”, ido (sic) pelo Sepetiba e este pelo Maranhão. Havia também discursos, declamações e distribuição da separata do belo poema de Álvaro Maia - Elegia de Lázaro. O governador, sua esposa e filhos estavam presentes. No final, quando terminasse a parte artística, haveria um baile dedicado aos internos.
Os bumbás fariam as apresentações antes do baile, diante de sua excelência. Estava também programado o jantar campal sob as árvores, onde cada um pudesse servir-se sem acanhamento. Foi durante o jantar que começou a querela surda entre os dois dirigentes dos "bois”, uma disputa meio idiota por causa do melhor lugar conseguido mais perto da casa de madeira em cuja frente estavam as cadeiras do governador e das pessoas gradas. Esse lugar fora ocupado pelo pessoal do "Vencedor" nenhuma preocupação de prejudicar terceiros. Porém já se tornara mania, desde o princípio do século 20, a atitude hostil do "Mina de Ouro" para qualquer outro divertimento que ousasse passar-lhe à frente. 
 

Começou por um zunzunzum partido lá de trás e com umas visitinhas desdenhosas ao "pasto" do "Diamante Negro”. Disse-me o preto (sic) Maranhão que se fosse a outro lugar aceitaria os desafios malandros, porque o "contrário" só vivia apanhando e não criava vergonha. A ameaça de barulho foi contida por inspiração do comandante Osório (chefe dos escoteiros), que mandou ficássemos estendidos em linha estratégica entre os dois adversários. E cantássemos o belo hino dos Escoteiros, que começa assim:
"Sereis para vencer
Melhores cada dia
E com doce alegria
Cumpri vosso dever" etc.
Parece que a letra do hino sensibilizou a matéria ruim de que era feita aquela matéria provocadora e as ameaças de barulho cessaram. Pelo menos na aparência. Tudo correu muito bem até que se chamasse o pérfido "Mina de Ouro" para o aceiro, o que foi atendido com presteza, naturalmente, por tratar-se de um privilégio, pois o "Mina de Ouro" era realmente um "boi" digno de aplausos, mas não era o decano, naquela altura, pois o mais velho, e único, de que se tinha conhecimento em Manaus, era o "Rei do Campo”, seguido do "Diamante Negro”. Mas vá lá que fosse... O pessoal deste ficou ressentido, mas a desculpa que se deu era de que desejavam colocar a menor distância entre os dois rivais, pois assim que terminasse a exibição, o "Mina de Ouro" deveria retirar-se.
Infelizmente não aconteceu o que se estava tentando, conciliar os ânimos. Logo de saída o amo do "boi" do Sepetiba mandou um cruzado de desafio, que poderia ficar sem resposta, mas não ficou. Os dois bandos engalfinharam-se ali mesmo na frente do governador e de seus familiares e secretariado. Uma confusão de atordoar, de que só se ouvia a voz gritante do moleque Beicinho, o amo do "Diamante Negro”, e grande "tirador de versos” contra o adversário. Naturalmente a turma do deixa-disso acudiu logo, mas eu ainda consegui uns versos alusivos à posição no conflito do professor Carlos Mesquita, que punia pelo "Mina de Ouro":
"Esse tal de jornalista
que esculhamba nossa obra
para galo falta a crista
e pra burro tem de sobra".

O mais extraordinário de tudo é que o "Mina de Ouro" apresentava quatro pernas invés do comum duas, do "miolo”: Quando a sarrafascada terminou, saiu de baixo do "boi" o professor Carlos da Silva Mesquita. E não estava sóbrio... É que tivera a audácia, ou a insensatez, de pôr o bumbá "Mina de Ouro" nas alturas, em detrimento da performance do rival.
Enquanto a indiada disputava a primazia do campo, o "boi" dançava ajudado pelo professor Carlos Mesquita que não havia encontrado um meio de sair da embrulhada, senão aquele.
Parte desta crônica me foi relembrada pelo meu amigo Raimundo Vale, à época brincante índio do bumbá "Mina de Ouro". 

Notas:
1)    Carlos Mesquita, professor, foi diretor do Ginásio Amazonense Pedro II, também conhecido por Colégio Estadual do Amazonas.
2)    O impresso Elegia de Lázaro – “belo poema de Álvaro Maia”, era vendido, com renda destinada à assistência aos lázaros, hoje hansenianos.

domingo, maio 12, 2013

1001 POSTAGENS


Projeto de futura capa
Vinha preparando uma marca para a minha postagem de número 1000, até que visitando a casa de antiquários do poeta Bandeira, na  rua Lima Bacury, encontrei o mote ou a marca. Ali revisitei publicações com as marcas de 1001 discos, filmes, cidades, cervejas e outras curtições mais, que devem ser apreciadas antes da morte do leitor.
Então, tá. Alcancei, pois, essa expressiva baliza de 1001 POSTAGENS, pouco mais de três anos depois de ter inaugurado este blog em março de 2010. Dizia na Preliminar: o incentivo dos amigos e a finalidade de “desovar” muitos de tantos papéis que eu havia catado, e se acumulavam quase sem serventia, abriram o catadordepapeis.blogspot.com . Essa papelada, a “rainha do lar” ameaçava lançar ao cesto... de lixo.
Fiz festejo pela centésima publicação. Havia me prometido a postar diariamente, e houve ocasião em que extrapolei com até três posts. O entusiasmo arrefeceu, levando-me a ausência de até uma semana. Quando isso aconteceu, encontrei um amigo-censor. Logo ele me telefonou, querendo saber se eu estava vivo. E a partir dessa conquista, o Herbert Ribeiro passou a fiscalizar minha presença.

Apesar dos apelos da controladora de blogs, continuo com o formato antiquado. Prometo renovar a cara e o conteúdo do Blog do coronel Roberto. E, como afixei na partida, caro leitor-amigo, aproveite a viagem deste barco, mas, se desejar, deixe sua contribuição. E ela que me faz reparar o rumo.
Até qualquer escala. Obrigado

sábado, maio 11, 2013

BANDA DE MÚSICA DA PMAM: 120 ANOS (2)

Quartel da Polícia Militar (fundos), visto da rua Lima Bacury,
foto do Album Findanza, 1902
 
Há, todavia, outro pormenor a apreciar sobre o aparecimento da música na PM do Amazonas. Trata-se da existência de corneteiros, já referida em 1878, dois anos após a reativação da PM, referida pelo seu comandante, major Silvério Nery (pai do governador de mesmo nome). Um detalhe: é sabido que compete a esses profissionais anunciar cada atividade de qualquer corpo militar, ou seja, o toque de corneta anuncia a atividade diria dos quarteis. Ou anunciava, pois a modernidade vem “aposentando” esse profissional.
Em janeiro de 1890, com a posse do primeiro governador, tenente Ximeno de Villeroy, a organização politica do Estado toma novo encaminhamento.  A Polícia Militar (Batalhão Militar de Segurança) ocupa o edifício na praça da Polícia, ainda que em sua dimensão original, todavia, capaz de abrigar com mais conforto aos policiais. A ampliação do mesmo quartel que herdamos ocorreu em 1895, realizada na administração de Eduardo Ribeiro (1892-96), e era comandante da Força Estadual o major Raimundo Afonso de Carvalho.

A Banda de Música ocupava uma parcela nesse novo endereço. Acompanhava a corporação, que crescia a par da evolução do Estado ou, para ser mais consequente, da capital do Amazonas. Tratando-se de Segurança Pública, em janeiro de 1897, o governador Fileto Pires amplia a Força, organizando o Regimento Militar do Estado, composto de dois batalhões e, quanto ao assunto que interessa a este trabalho, de 56 músicos.
A existência de dois batalhões levou a criação de duas bandas de música. Era a pujança da capital da borracha que permitia ainda o aparecimento de terceira banda, esta para atender ao Corpo de Bombeiros. Há registro de seu maestro e de alguma presença nos coretos de Manaus, apesar de sua pouca duração. Todavia, cabe uma indagação: com tantas bandas militares, como a corporação conseguiu tantos músicos?
Objeta o contramestre Augustinho: os músicos que formaram os primeiros naipes, “podem ter vindo do Nordeste”. Entretanto, ocorre-lhe outra hipótese: aqueles profissionais podem ter adquirido o gosto pela música durante o ensino secundário, que  abrigava o ensino desta arte. Muitos deles “passaram pelo  Estabelecimento dos Educandos Artífices”, cujos mestres de música também ministravam aulas particulares.  De minha parte, acredito que a hipótese mais viável foi o da importação nordestina, cujo sistema ocorreu até o final do século passado.
Essa presença de duas estruturas musicais na Polícia Militar ensejou a criação de uma direção superior, acima obviamente dos maestros. Deu-se a este organismo o título de Inspetor de Música, função que podia ser exercida por oficial do ramo ou da tropa. Alguns aspectos de seu desempenho são descritos pelo autor de A música na Polícia Militar do Amazonas... Era o responsável pela assinatura de contrato musical com particulares para execução pela banda. Cabia-lhe ainda “o recebimento do valor acertado”, e a divisão entre a corporação e os músicos empregados.
Um desses contratos, recolhido pelo Augustinho, em documento de 1910, detalha muito bem o enunciado: “Aprova-se o contrato feito pelo Sr. Inspetor de Música com a diretoria do Whit-club, de sete orquestras da Banda de Música, para tocarem nas funções do mesmo, a realizarem-se (sic) nas noites (de) 8, 15, 22 e 29 do corrente, e nas (de) 5, 6 e 8 de fevereiro; sendo nas noites de 8 e 22 as orquestras de cinco músicos cada uma e as demais de dez ditos, inclusive a pancadaria (instrumentos de percussão), a 150$000 devendo seguir as orquestras às 9 horas da noite e tocar durante seis horas”. Em resumo, orquestras da Banda animaram o carnaval de 1910, no Whit-club, consolidando a elevada categoria nesse tipo de festejo, condição que se perdurou durante décadas.
Neste ensejo, o tenente Manoel Joaquim Pereira da Silva (ainda não bem identificado) era o Inspetor das bandas. Ainda alcancei, ao ser incorporado na Polícia Miliar em 1966, esses dois assuntos: 1) o contrato da Banda para tocar em festejos particulares, com a divisão da renda, e 2) o nível da orquestra na condução em especial de bailes carnavalescos.  
“Outra função do Inspetor de Música era a indicar os músicos à promoção funcional”, assegura Augustinho. Antes de elucidar esse aspecto, devo acrescentar que na primitiva composição da Banda, em 1890, apenas se referia a músicos, sem qualquer hierarquia. Mais adiante, em 1892, no governo atabalhoado de Thaumaturgo de Azevedo, surge a distinção de “músicos de 1ª, 2ª e 3ª classe”, inclusive com a elevação do soldo. Somente no meado do século passado é que os músicos tomaram as divisas de sargentos e o maestro, a de oficial.
Em janeiro de 1912, morreu o capitão Lavor, nascido no Ceará, com 48 anos, regente das bandas da PM. O necrológio foi extraído do Jornal do Commercio: “de uma enfermidade pertinaz, que há dias o prendia ao leito, veio a falecer ontem 13, às 10h da noite, em sua residência no bairro da Cachoeirinha, o capitão Manoel Napoleão Lavor, do 1º Batalhão de Caçadores da Força Policial do Estado”. Prosseguiu o matutino: cidadão que prestara grandes serviços ao Estado, soldado que soube ser sempre disciplinador e brioso, o capitão Lavor era também um músico de merecimento real, compositor distinto e executante de técnica apurada. E, encerrando, assegurou que Lavor “dirigia ultimamente as duas bandas de música da Força, como ensaiador geral”.  (segue)

quinta-feira, maio 09, 2013

FESTA NA IGREJA

A paróquia do Sagrado Coração de Jesus, situada na rua Ferreira Pena, completa hoje 33 anos de funcionamento. Também hoje, seu pároco, padre Luiz Gonzaga de Souza, completa 43 anos de sacerdócio.
Coração de Jesus
Escrevo enquanto a chuva desce com vontade sobre a cidade, por isso, aproveito esta postagem para abraçar o pade Souza, do qual fui colega no Seminário São José. Claro que faz algum tempo, mas  deixemos de lado esse detalhe. Quero reconhecer sua dedicação à Igreja de Manaus, empenho concretizado nas paróquias pelas quais foi condutor.
Para saudar tão respeitável festa, reproduzo uma publicação do poeta Max Charphentier sobre o Papa Francisco (*).   

O TRÍPLICE FRANCISCO
Habemus Francisco! Quase primavera, na noite recém-nascida vaticana, o pastor olhou fundamente o rebanho das luzes, esperanças acesas numa praça. Quem viu, não pode esquecer: aquele olhar tinha toda a ternura da paternidade concentrada no amor. Pai anunciado como Francisco, logo percebi que o pastoral carinho daqueles olhos tinha uma explicação: nele estavam bênçãos de olhos que nunca se fecharam para nós, os de Francisco de Assis, de Francisco Xavier, de Francisco de Sales. Sim: Bergoglio, sendo Francisco, certamente assume e absorve, por evocação imediata e consanguinidade missionária, a presença e a renascença desses superiores da Fé, e portanto não é só Francisco, é Tríplice Francisco.
 
Papa Francisco
Três santos dos mais incensados tanto pelos altares como pela História, não há dúvida de que são exemplos, inspiração e chamado para Bergoglio. Eles foram papas sem cátedra na Terra, mas' com assento desde sempre no Céu. São Pedro não hesitaria em coloca-los entre os seus sucessores. Agora, por unção do nome e por necessidade, juntam-se num só, e deve-se perguntar em que medida, com que carisma cada um contribuirá como esteio e asa do Pontífice jesuíta.
Evoquemos primeiro Francisco de Assis, "esposo da obediência e da pobreza", um revolucionário da doçura, que pregava tanto a homens quanto a passarinhos para ter toda a criação reunida no louvor a Deus. Esse andarilho trovador da Fé invadiu com poesia evangelizadora as portas entreabertas do Renascimento, e seu Cântico das Criaturas é a página ecológica que faltava às Escrituras.
 
Nos "Fioretti", súmula dos ideais franciscanos, a beleza da verdade e a perfeita alegria da paciência são bênçãos de Francisco sobre nós. Príncipe de Jesus em túnica surrada, fez mais pelo bem do mundo do que luxuosas convenções de reinados. Abandonador de guerras e de faustos, ele ouviu do Crucificado o apelo para "restaurar a sua Igreja em ruínas", e atuou de imediato sob a interpretação literal da queixa, reconstruindo igrejas.
Depois, verificando que a ruína era mais doença dos costumes que das pedras, partiu para a atitude curativa e a pregação regeneradora, dentro e fora da Itália. Os estigmas que recebeu no monte Alverne, chagas no corpo abertas como rosas, testemunham sua penitencial configuração a Cristo. E que catedral pode ter torres mais altas do que os campanários invisíveis da sua Porciúncula? Na mediação entre as penúrias sociais e as inconsistências religiosas, Bergoglio há de ter, desse Francisco, a conduta, estrategicamente depuradora do século, de colocar-se exatamente no coração do povo, para iluminação nova dos destinos.
Verifica-se em seguida a contribuição de Francisco Xavier na composição dessa tríade em um só homem. Ele oferta logo o vaticínio dos fundadores, dado que foi um dos sete de Montmartre, que conceberam, sob a liderança de Inácio de Loyola, a inesgotável Companhia de Jesus.
Fundava-se aí a escola simultaneamente alcandorada e prática de Bergoglio. Começa a cruzada das Índias orientais, com Xavier arrastando mares na evangelização transcontinental tão heroica que até hoje consola os apóstolos das brenhas. Embora tenha ajudado na redação das Constituições da Companhia, Xavier foi mais homem de ação que de meditação, tanto que, em uma de suas cartas a Inácio, declarou sua vontade de ir às academias da Europa "sacudir aqueles que têm mais ciência do que caridade".
 
A caridade aí é principalmente a da palavra evangelizadora, que imediatamente afasta o negativismo antropológico que muitos sustentam diante da condição humana. O epistolário entre Francisco e Inácio constitui um compêndio que retrata as mais preciosas convicções destes santos. Ao lado das Constituições e dos Exercícios Espirituais, nessas cartas Bergoglio há de ter encontrado e encontrará de ambos a companhia na Companhia.
Eles seguirão junto a ele desbravando, levantando e construindo, sob a égide do clássico, uno e tríplice preceito inaciano: obediência de execução, obediência de vontade, obediência de entendimento.
Agora chegamos a um ponto de convergência doutrinária e devocional na figura eclética de Francisco de Sales. Bispo, escritor, fundador de congregação (Ordem da Visitação), pregador, diretor de almas, de fé imensa e coração maior. O púlpito flamejante, de onde ele sacudia luzes pontiagudas contra os calvinistas, foi o seu primeiro altar. Marcou de uma vez por todas a história espiritual da França e da Igreja, principalmente ao convocar-nos à devoção também fora dos claustros, à santificação da existência cotidiana.
Ele esclareceu sua predestinação diante da Virgem Negra, e logo dividiu seu coração entre o mais alto amor ao próximo e o mais belo amor a Deus. Com matéria de exegese mística e prática evangélica forjadas em sua têmpera de santo, criou duas chaves que descerram juntas salvíficos segredos: O Tratado do Amor de Deus e Introdução à Vida Devota. São monumentos de doutrina e de ascese que, reunidos aos seus milhares de sermões e cartas de direção espiritual, estão entre as páginas imperecíveis da literatura cristã de todos os tempos.
Francisco de Sales ensinava que a "caridade concreta" é o "êxtase da vida e das obras". Maravilha de síntese. Isto só pode ser palavra oculta do Sermão da Montanha, guardada para ser ouvida bem depois. Bastaria essa formulação, do mesmo nível de paulina, para identificá-lo como coadjutor das bem-aventuranças, como intelectual assistido pelo Espírito Santo. Bem-aventurados aqueles de caridade concreta.
Bergoglio bebeu dessa água que não passa, mas se multiplica e guardou-a em cântaro aberto para todos.O Papa Francisco movimentará dessas três vidas o louvor que busca, a certeza que age, o amor que liberta, assumindo-as no seu orar, no seu dizer, no seu fazer, fortalecendo a súplica, reevangelizando o mundo, redescobrindo o Cristo a todo instante. E isso sob a irradiação da Virgem, de intercessora graça tríplice também: Mãe de Jesus, Mãe da Igreja e nossa Mãe.
Serás feliz, Bergoglio, atirando as tuas redes com as mesmas mãos de Pedro e dos Franciscos. Agora digo, Tríplice Francisco de São Pedro, que o maior tesouro, a maior alma a ser recolhida das ondas conjunturais será - a própria Igreja. E o som da legenda miserando atque eligendo te parecerá sempre ecoando com as sílabas do "Segue-me!".
Tudo para a maior glória de Deus.
Dado em Manaus, quando março de 2013, primeiros dias do pontificado de Francisco.

(*) Reproduzido do Boletim da Academia Amazonense de Letras, abril 2013.