Anísio Mello |
Escrevi este texto para encaminhar um novo livro de Anísio Mello, a ser editado - assim espero, assim seja - pela Academia Amazonense de Letras, da qual Mello foi membro efetivo.
Não tenho como desassociar o Chá do Armando do homem de tantos instrumentos (pintor, escultor, poeta, crítico, músico, contista, folclorista e, ainda, jornalista e inventor, segundo o “inventariante” Artur Engrácio), o multiartista Anísio Mello (1927-2010). Conheci-o mais amiúde quando aquela confraria lítero-cultural-filosófica (de cunho beberativo), abrigou-se na residência dele, situada na avenida Joaquim Nabuco, em frente à Beneficente Portuguesa. O endereço em si assustava, porém, a camaradagem do anfitrião fazia superar as carências, as penúrias do casarão secular.
Anísio Mello observa sua tela exposta na Casa do Artista |
Rotineiramente servido à noite de sexta-feira, lá pelas tantas, o eflúvio alcoólico consentia aos chazistas superar os fantasmas multifaces para imunes, confraternizar com os anjos e os artistas de vários matizes que por ali desfilavam. De igual modo, semanalmente revíamos do dono da casa as composições artísticas e melódicas; as histórias de sua família e dos habitantes da floresta; sua produção em prosa e verso; os livros lançados e os "prometidos"; o jornal Folha do Norte, editado em São Paulo (SP) e o desastre do seringal em Eirunepé (AM). Enfim, a pujante saga do imortal Anísio Mello, que continuamente retemperava os partícipes do Chá e de quantos frequentaram sua residência.
Chazista (seguidor do Chá) militante, eu me converti em seguidor emérito do mestre da Escola de Artes Ester Mello (fundada por sua mãe, que Anísio fez funcionar até sua morte). E, porque residíamos próximos, foi dessa outra maneira que me tornei habitué de seu empoeirado acervo. Empoeirado, porém inestimável!
Nada daquela desorganização, todavia, me surpreendia, afinal me ufano de minha fortuna em tais ambientes, e naquele também fui inegavelmente bem-sucedido. O tratamento da doença que acometeu Anísio Mello, em seus derradeiros momentos, levou-o à hospitalização. De modo lamentável, não houve recursos medicinais capazes de reverter o quadro, assim, para meu pesar, na tarde do domingo, 11 de abril de 2010, estava morto o admirável elaborador de tantas belezas. Empenhei-me tanto no velório quanto no sepultamento.Então, retornei ao acervo do extinto.
Espanadas as teias de aranha e a poeirada, deparei-me com preciosidades, com relíquias que o descaso, o infortúnio condenava ao entulho da cidade. Aqui é o momento de registrar um “salutar” pecado: levei do desprezado acervo o quanto pude. Ao inventariar o butim, relacionei ao menos quatro projetos de livro. E, no intuito de expiar a minha infração, já retirei das sombras dois desses propósitos: o primeiro foi Convite à Poesia, em 2011, inaugurando as Chá do Armando edições e lembrando o primeiro ano do desaparecimento do seu autor. O outro foi Hemetério Cabrinha, poeta, que as edições do Governo do Estado e a Secretaria de Cultura deram vida, em 2015.
Enfim, diante dessa mobilização, sinto-me indultado pelo delito confesso. No entanto, em favor de Anísio Mello, há dois projetos em elaboração: Óscar Ramos, diretor do Museu da Cidade, organiza uma amostra do material reconhecido. E, no próximo ano, décimo de sua morte, já aparelho, associado ao chazista Nonato Braga, uma exposição com o quanto de seu arsenal artístico ainda existe.
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