Gravura existente no memorial de Antônio Conselheiro, em Canudos |
Decreto governamental estabelece que a Polícia
Militar do Amazonas relembre, em 8 de novembro de cada ano, o retorno de
sua tropa expedicionária a Canudos (BA). A determinação vai ser cumprida, na quinta-feira
8, quando esse evento completa 115 anos.
De minha
parte, autor de Cândido Mariano &
Canudos, a fim de repassar o envolvimento da força estadual amazonense no
conflito, vou reproduzir em cinco capítulos o trabalho que organizei para o
Museu Tiradentes.
- AS ORIGENS DO MOVIMENTO SOCIAL
Algumas
dificuldades brasileiras de antão: em 1888, a princesa Isabel extinguiu a
escravidão negra no Brasil. Sem qualquer preparativo ou cuidados básicos, os
beneficiados se viram desagregados: sem patrões e chibatas, mas sem empregos e
moradia. De repente souberam de um acolhimento que, conta a lenda, seria um
local de “cuscuz e leite”. Localizava-se às margens do rio Vaza-Barris,
favorecido por um entroncamento de caminhos ligando o sertão baiano: o Belo
Monte do Conselheiro. O extinto
Canudos.
Ali
se achegou respeitável número de negros emancipados. No ano seguinte (1889)
desabou o Império e, com isso, a mudança do regime. O regime republicano,
contudo, foi consolidado à força. As Forças
Militares, preparadas para se ombrear em defesa da “ordem e progresso”, em
alguns episódios estiveram se enfrentando. Por ocasião de Canudos, Prudente de
Moraes (1895-99) presidia o País. Fora o primeiro presidente civil; mas, os
militares e outros saudosistas do imperialismo destacavam a incompetência deste
presidente.
A
religião católica dominava fortemente a crendice da população brasileira, com
total prestígio nos brejos e descaminhos do País. Servia tanto para o controle
social quanto político. Foi esse prestígio que a Igreja tentou, quando, em
1895, dois emissários do bispo da Bahia abriram as Missões, em Canudos. A pregação religiosa conflitou com a religiosidade
prática inerente àquele tempo, com a orientação do Conselheiro.
Bastante conhecido por reformar cemitérios, opondo-se à decisão dos dirigentes da República que retirou este serviço da Igreja e o passou ao encargo do Estado. Mas, a ele também se atribuía a reforma e a construção de igrejas. Outro fato proeminente era sua condição de atrair devotos, que o seguiam, acampando em propriedades de terceiros, em caminhadas por municípios, em território sem estradas ou caminhos, apenas demarcados pela passagem de animais de carga. Como era reconhecido, Antônio, primeiro foi beato, depois, dispondo de barba esbranquiçada e longo traje, e apoiado em bastão, conquistou o topo da hierarquia: Conselheiro. Com essa dignidade, faleceu em Canudos (1897).
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Tal
qual o País, também o Exército passava por uma reformulação, que ainda curtia
os princípios estratégicos da Guerra do Paraguai (1865). Estava defasado tanto em
estratégia quanto em mobilização. Certamente, por esses predicados, foram
desperdiçadas tantas vidas e vitalidade em quatro expedições. E, talvez por isso, tenham os governantes da
Bahia, o governador e o comandante do Distrito Militar, disputado o poder sobre
a diligência militar. Resultado: a Segunda Expedição foi derrotada muito mais
pelos desacertos dessas autoridades. No mesmo sentido, as polícias estaduais
que foram apenas consignatárias.
A
imprensa sediada no Capital Federal, ou melhor, na Rua do Ouvidor, ampliava o
problema, olhando como segue acontecendo de longe. E, de bem distante. Talvez,
saudosistas do militarismo dos primeiros dias da República impuseram o
comandante da terceira e desastrada expedição: coronel Moreira Cesar. Quase no
mesmo quarteirão localizava-se o Poder Legislativo (Senado e Câmara) do Brasil.
Local de discussão apregoava o temor do retorno ao poder imperial, atribuindo
ao Conselheiro esse poder.
A
derrota de Moreira Cesar, comandante da Terceira Expedição, causou uma comoção no
País. Era preciso vingança. Era necessário destruir os conselheiristas ou jagunços, entre tantas alcunhas concebidas. De
Norte e do Sul levantaram-se as vozes e forças para a retomada das ações. O
Governo Federal toma para si a empreitada e designa um general para o comando.
Desafortunado, o Exército cuidou de melhor aparelhar a investida, organizar a
campanha. Assim, duas colunas foram organizadas contra Canudos. Naquela, saída
de Aracaju (SE), estava presente o major Constantino Nery, nosso conterrâneo e
futuro governador do Amazonas (1904-07).
Alguns
Estados, especialmente os governados por militares, prontificaram-se em
colaborar com recursos humanos e financeiros.
O Governo Federal já denunciava expressivo déficit com as operações
executadas contra Canudos. Deste modo, entre tantos oferecimentos, a presidência
da República aceitou a cooperação dos estados da Bahia, do Amazonas, do Pará e
de São Paulo. A Bahia, porque estava envolvida desde o primeiro instante,
afinal a peleja se desenrolava no seu território; os estados do Norte puderam
agir dessa maneira coadjuvados pela riqueza que a borracha proporcionava; e São Paulo, que já começara prosperar com
a cafeicultura, dava os primeiros passos rumo ao progresso que hoje
indiscutivelmente assegura. (segue em 2/5)
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