CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

segunda-feira, junho 13, 2011

"Santo" Antônio... Mendonça


Henrique Antonio, final dos 1970
em Manaus

Hoje é dia de Santo Antônio, procurado pelos casais para diversos fins. A maior festa deve ocorrer em Borba (AM). Mas, me perdoe o querido santo, hoje é aniversário de outro Antônio, bem próximo de mim, portanto vou, vamos louvá-lo.
Hoje é aniversário do meu irmão Henrique, que completa seu nome com o do santo do dia,
Antônio. Estava buscando a melhor forma de abraçá-lo, ele na Barra da Tijuca-RJ e eu no Igarapé de Manaus. Salvou-me o outro mano, o Renato, que escreveu o texto abaixo. 
Li no JB, antes do seu desaparecimento na versão impressa — obviamente antes de 31 de agosto passado — sobre a essência de uma crônica. Em outras palavras, dizia-se que ela tem dupla filiação. Herda do jornal a concisão, e da literatura, a poesia.
Já me aventurei a escrever algumas, mesmo sem ter a veia jornalística e sem a ternura e inspiração do poeta, à guisa de contar parte da minha história de forma homeopática, em conta-gotas. 
Quis aproveitar, naturalmente, o que a nossa infância nos ofereceu naquele cenário rico em fatos e temas reveladores, nem sempre com um final feliz.Desta vez, não sou o personagem, apenas mero coadjuvante e grande beneficiário. Na verdade, quero prestar, de modo fraternal, uma merecida homenagem e reconhecimento, embora tardio, muito relevante para mim.
Ocorreu-me dizer isso antes, entretanto faltou a oportunidade clara, o tempo preciso e espaço adequado. Os compromissos tão exigentes e prioritários me impediram de falar sobre o assunto em tantas ocasiões que estivemos juntos, mas o “feeling” é importante, a ocasião, propícia. Não faz mal, agora, não posso adiar o momento de falar dele. Valho-me desse computador e do papel que servem de interlocutor.
H. Antonio, 1949
Sem mais delongas, vou direto ao assunto: o homenageado é meu irmão Antonio, ou Henrique, nos meios profissionais e também no seio da sua pequena família, que agora é o seu universo.
Para me ajudar a remexer e reaquecer a minha memória, revejo no blog de meu outro irmão -- a sua foto tão jovem, uns vinte e poucos anos apenas. O capacete embaixo do braço traduz existencialmente toda a sua trajetória de “pião”. Explico as aspas: não há sentido pejorativo no termo empregado, na verdade, ele é um pião requintado, e altamente requisitado. Rodou o País de cabo a rabo; produziu e ajudou na construção de vários brasis, emendando tubos, construindo plataformas, edificando plantas de processo, enfim, fazendo também a sua plataforma de vida: alicerçando uma família e educando a filha até tornar-se médica.
Quem o vê na sua pequena estatura, não imagina o enorme cidadão que ali se estabelece. Não pode imaginar a sua luta desde que concluiu o curso de contabilidade na longínqua década de 1960, e não apostou nesse mercado senão noutro, o da indústria. Antes, porém, perambulou em empregos menores do comércio, como a loja de espelhos e quadros. Teve o tino para saber que ali não era o seu lugar. 
Abandonou tudo, a sua Manaus e seu diploma, botou a carteira de trabalho no bolso e partiu em busca de novo eldorado. Com os sonhos de um vitorioso chegou aqui, no Sudeste, fincou os pés, as mãos, a cabeça, e toda a sua juventude. Usou, principalmente, sua obstinação adquirida desde os tempos de seminário e com altruísmo dedicou-se à família. Como meta, carregou para perto de si os pais e irmãos menores. Era um fardo, mas, para ele, parecia não pesar, tinha o prazer de vê-los sorrir.
Quis chegar aqui a esse ponto. Fiz de sua história um breviário para me incluir nela. Temo não encontrar palavras adequadas para enaltecer seus méritos e agradecer-lhe o carinho depositado e o cuidado que teve comigo.
Destaco principalmente a minha apresentação à indústria do aço e do petróleo quando eu  havia deixado o serviço militar; reconheço a sua preocupação em me mostrar os atalhos da obra e as arapucas que a vida nos prega. 
Devo-lhe, obvio, a oportunidade que precisava para a incipiência da minha vida profissional. Ainda que o destino, de algum modo, tenha negado o cruzamento de nossos caminhos profissionais, nesses anos todos, ouço sempre falar bem dele. E me envaideço sempre ao ouvir os relatos, os mais diversos, com elogios à sua conduta e ao seu labor.
Depois desse tempo, rumino um prazer especial que me encoraja a descrever e relembrar cenas de minha infância ao seu lado. 
Recordo com exatidão, os primórdios do meu jardim de infância, naqueles tempos, a primeira fase da vida escolar de um garoto, aos sete anos. Nos primeiros dias de escola, fiquei “assistindo” aulas na sua sala, ao seu lado, na mesma carteira. A minha insegurança era tamanha que eu não conseguia ficar na minha sala. Com algum sofrimento, me afastei dele aos poucos, até por causa de ameaças de meu pai. E vivi algum tempo à sua sombra, nas brincadeiras, nas peraltices e nos meus temores infantis. 
Depois, o acaso nos afastou. O colégio interno o tirou de mim, por muitos meses durante o ano, e me deixou órfão de irmão mais velho. O destino nos pregou outra peça: quando fui para o colégio interno, ele saiu. Motivado pela necessidade de ganhar a vida, ficou logo adulto, procurando trabalho.
Renato Mendonça, autor da crônica
É desse homem-menino que eu gosto de me lembrar de um de seus gestos mais ternos. Um dia, já amadurecido, os cabelos enbranqucendo, envelhecimento começando a roubar-lhe o vigor, chegou à minha casa e entregou-me o crachá de uma firma. A primeira onde eu trabalhei. Emocionei-me como um garoto que ganha o seu brinquedo de Natal. Mesmo acostumado às rudezas da vida, meus olhos marejaram. Havia guardado por muito tempo, sabe lá com que carinho, com que prazer.
Talvez com o prazer dos homens de bom coração e o carinho do menino que não envelhece nunca. Por tudo isso, como nas estórias em quadrinhos, ele é um dos meus heróis.
Que Deus o dê saúde e paz! Ele merece.
     


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