CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

terça-feira, abril 28, 2020

HEMETÉRIO CABRINHA (1892-1959)


Capa do livro

Hemetério José dos Santos, que literariamente usou o sobrenome de Cabrinha (apelido de infância), foi um poeta de qualidade, mas que se manteve no anonimato, e humildemente foi sua vida e morte. Produziu alguns livros de poesia, que outro poeta contemporâneo – Anísio Mello – soube reconhecer, para tanto nos legando um folheto sobre Cabrinha. Morto Anísio (2010) sem que a homenagem ao amigo fosse publicada, tomei o encargo como co-organizador, e, por obséquio da Secretaria de Estado da Cultura (2014), Cabrinha veio a público.

Folheando a pequena obra, revi o soneto Falando a meu coveiro, que nos remete ao caos que o cemitério de Manaus enfrenta devido a quantidade de mortos pela Covid-19. Se não há tempo para despedida cristã, quanto mais para orientar o coveiro.



Falando a meu coveiro 

É aqui neste lugar, ao pé deste cipreste,
junto a este mausoléu. Pega uma enxada, cava
sete palmos de chão! Anda depressa, grava
no teu semblante mudo o riso que escondeste!

Abre o meu leito eterno... O meu lugar é este!
Quero nele abafar minha paixão escrava
Quero enterrar-me logo... a vida já me agrava...
Depressa! a minha dor de dores se reveste!

Alarga-a mais um pouco, afasta mais a areia!
Eia, assim como está, torna-se muito feia,
profunda-a mais...trabalha! Este dinheiro é teu!

Que é isso? Um crânio aí? Dá-m'o, quero beijá-lo.
Limpa-lhe bem o pó! Dá cá, quero estudá-lo
Como alguém algum dia há de estudar o meu!

(“Vereda Iluminada". Manaus-AM, 1932)

Um comentário:

  1. Hemetério Cabrinha realmente teve uma trajetória fascinante: foi escritor, carpinteiro, espírita e militante das causas sociais.

    Recentemente escrevi um artiguinho sobre ele e outros migrantes nordestinos.
    Caso alguém se interesse: https://www.academia.edu/resource/work/73833782

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