CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

segunda-feira, outubro 15, 2012

VIDA E MORTE DO "PENSADOR" (Final)

Eduardo Ribeiro
plantou a semente com o mesmo esforço
e dedicação procuramos fazê-la brotar.
homenagem da Prefeitura de Manaus
1978
Ontem, completaram-se 112 anos da morte de Eduardo Ribeiro. Morte que prossegue misteriosa. A publicação do falecido Júlio Uchoa, quase 50 anos depois, portanto, ainda contando com detalhes bem próximos, trouxe algumas elucidações sobre o acontecimento.

Encerro hoje esta publicação e, ao mesmo tempo, dou início a divulgação de excertos do inventário daquele ex-governador, para que se sinta o tamanho de sua riqueza. Riqueza que foi dilapidada, sem piedade. Como não podia ou devia resistir, nada restou daquela herança. 
* * *
Júlio Uchoa (*)

Era um caso para apurar, na ocasião, abrindo-se o competente inquérito pelo poder público. Os depoimentos do doutor Menélio Pinto e do tenente Emidio da Silva trariam, certamente, os esclarecimentos necessários. Seria, aliás, de interesse do próprio governo de então, sobre o qual pesam, ainda hoje, depois de volvidos quarenta e nove anos, as mais graves acusações.

Vejamos o que dizem os historiadores regionais. Artur Cezar Ferreira Reis escreve, em História do Amazonas, que a morte de Eduardo Ribeiro ocorreu “em circunstâncias um tanto misteriosas”; Mário Ypiranga faz alusão à versão corrente da existência de “umas ervas trazidas especialmente de Santarém” para envenenar o Pensador.

Muitas outras versões correm por ai, a respeito da horrível trama que eliminou o saudoso maranhense, sem nenhuma comiseração à insanidade que lhe combalira o organismo, provocada esta possivelmente pelo veneno que lhe fora inoculado, mesmo porque, os politicoides (sic) sem entranhas, temiam o seu restabelecimento, como predissera o professor Ludovici, eminente psiquiatra italiano.

Há, assim,  a notícia do desaparecimento misterioso daquele médico residente em Manaus, o qual, depois de examinar detidamente o cadáver, declarara, em altas vozes, não concordar absolutamente com o parecer dos seus colegas que subscreveram o atestado de óbito de Eduardo Ribeiro, visto tratar-se, diante da evidência dos sinais que constatara, não de um suicídio, como se fizera capciosamente, acreditar, mas de um bárbaro crime, frio e premeditadamente cometido.

Referiu-nos esse fato, para nós desconhecido, o digno amigo e colega Antônio de Castro Carneiro que o ouvira de seu genitor, quando certa vez, viera à baila a morte do inolvidável homem público. É, assim, mais uma versão sobre o doloroso acontecimento.

Por ocasião da morte do Pensador, o doutor Silvério Nery, governador do Estado, não se encontrava nesta cidade, pois que na noite de 13 seguira adoentado, com a família, para Paricatuba, em companhia do superintendente municipal, doutor Artur Araújo, indo este, também com a família.

Comunicada ao chefe do executivo estadual a infausta notícia, por meio de embarcação rápida que saíra de Manaus às 7 horas do dia 14, o governador, por estar doente, não pode vir à capital, tendo delegado poderes para representá-lo nos atos fúnebres, ao doutor Porfírio Nogueira, secretário do Estado. 

Constituiu o enterro de Eduardo Ribeiro verdadeira apoteose. Nunca se tinha visto tamanha consagração a um morto por parte do povo. Dez bondes superlotados partiram da antiga estação, à praça da República (hoje Pedro II), com destino à residência do falecido.
Quando os bondes chegaram à Chácara Pensador, já havia ali incomputável massa humana, formada de todas as classes sociais. O ambiente era de intensa tristeza. Todos estavam compungidos, diante da tremenda realidade. Já não mais existia o benemérito cidadão que transformara uma grande aldeia em uma cidade moderna.

No meio da sala estava o caixão que guardava os restos mortais de Eduardo Gonçalves Ribeiro. Era riquíssimo, de pelúcia preta, todo guarnecido de rendas e galões de prata fina, tendo um passarinho nas pontas da cruz, também, de prata; aos pés, bem feito monograma com as iniciais – E.G.R.

O caixão estava sobre uma essa de luxo, ardendo quatro velas ao lado. O corpo vestia casaca, gravata preta e botinas de verniz.

Fez a recomendação monsenhor Benedito da Fonseca Coutinho acolitado por quatro padres agostinianos. Conduziram o caixão para o bonde fúnebre, o coronel Afonso de Carvalho (presidente da Assembleia), doutor Porfírio Nogueira, coronel Emídio Pinheiro (comandante da Polícia) e o desembargador Joaquim Lisboa; o veículo estava ricamente preparado, de veludo preto com franjas prateadas e bordas brancas.

O féretro partiu da Chácara às 17 horas e 15 minutos, abrindo a marcha fúnebre o carro que conduzia o corpo, seguindo-o 10 bondes apinhados de gente. O préstito chegou ao cemitério de S. João Batista às 18 horas. A essa hora a necrópole já se encontrava cheia de amigos do pranteado morto “que numa ânsia dolorosa e triste esperavam o seu cadáver”.

Em um dia de Finados...
Do carro fúnebre à capela  do campo santo,  conduziram o caixão os senhores major Domingos Andrade, delegado do Grande Oriente, Leonel Mota,  doutor Plácido Serrano, major José Gonçalves Dias, José da Silva Viana e doutor Gaspar Guimarães.

Falaram a beira da sepultura: doutor Porfírio Nogueira, secretário do governo, em nome do Estado do Amazonas; major Domingos Andrade, delegado do Grande Oriente do Brasil; senhor Alberto Leal, pela colônia portuguesa; doutor Barbosa Lima, em nome do jornal Amazonas; em nome do Congresso Legislativo discursou o coronel Afonso de Carvalho; senhor Leonel Mota, pela loja maçônica “Esperança e Porvir”; pelos operários, o senhor J. dos Anjos.

Baixado o caixão à sepultura, foram lançadas sobre a mesma, pelos amigos do inesquecível cidadão inúmeras flores naturais. (fim)

(*) O Jornal, Manaus, 16 de outubro de 1949
* * *

Despacho judicial demonstra o extremo cuidado para com os bens do falecido. No mesmo dia, 14 de outubro, doutor Bonifácio abriu o processo.

O Doutor Emílio Bonifácio Ferreira de Almeida, Juiz Municipal de Órfãos, Ausentes e Interditos de Manaus, capital do estado do Amazonas, etc. 


Havendo falecido hoje em sua chácara denominada Pensador, no bairro da Cachoeira Grande, desta cidade, o Doutor Eduardo Gonçalves Ribeiro, sem deixar herdeiros presentes, deixando, entretanto bens que devem ser devidamente acautelados, mando que o Escrivão Nogueira, autuando este, intime os Doutores Curador Geral de Órfãos, Ausentes e Interditos e o Procurador Seccional da República, para o dia quinze do corrente, às nove horas no referido lugar, proceder-se à arrecadação e arrolamento de ditos bens, dos quais nomeia Curador o Doutor Amaro Carneiro Bezerra Cavalcanti, que também será intimado.

Cumpra.
Manaus, 14 de outubro de 1900 

Eu, Francisco Nogueira de Souza, escrivão, escrevi.

a)    Emilio Bonifácio Ferreira de Almeida.

Nenhum comentário:

Postar um comentário