Eduardo Ribeiro plantou a semente com o mesmo esforço e dedicação procuramos fazê-la brotar. homenagem da Prefeitura de Manaus 1978 |
Ontem,
completaram-se 112 anos da
morte de Eduardo Ribeiro. Morte que prossegue misteriosa. A publicação do
falecido Júlio Uchoa, quase 50 anos depois, portanto, ainda contando com
detalhes bem próximos, trouxe algumas elucidações sobre o acontecimento.
Encerro
hoje esta publicação e, ao mesmo tempo, dou início a divulgação de excertos do
inventário daquele ex-governador, para que se sinta o tamanho de sua riqueza. Riqueza
que foi dilapidada, sem piedade. Como não podia ou devia resistir, nada restou daquela
herança.
*
* *
Júlio Uchoa (*)
Era um caso para apurar, na
ocasião, abrindo-se o competente inquérito pelo poder público. Os depoimentos
do doutor Menélio Pinto e do tenente Emidio da Silva trariam, certamente, os
esclarecimentos necessários. Seria, aliás, de interesse do próprio governo de
então, sobre o qual pesam, ainda hoje, depois de volvidos quarenta e nove anos,
as mais graves acusações.
Vejamos o que dizem os
historiadores regionais. Artur Cezar Ferreira Reis escreve, em História do Amazonas, que a morte de
Eduardo Ribeiro ocorreu “em circunstâncias um tanto misteriosas”; Mário
Ypiranga faz alusão à versão corrente da existência de “umas ervas trazidas
especialmente de Santarém” para envenenar o Pensador.
Muitas outras versões correm
por ai, a respeito da horrível trama que eliminou o saudoso maranhense, sem
nenhuma comiseração à insanidade que lhe combalira o organismo, provocada esta
possivelmente pelo veneno que lhe fora inoculado, mesmo porque, os politicoides
(sic) sem entranhas, temiam o seu
restabelecimento, como predissera o professor Ludovici, eminente psiquiatra
italiano.
Há, assim, a notícia do desaparecimento misterioso
daquele médico residente em Manaus, o qual, depois de examinar detidamente o
cadáver, declarara, em altas vozes, não concordar absolutamente com o parecer
dos seus colegas que subscreveram o atestado de óbito de Eduardo Ribeiro, visto
tratar-se, diante da evidência dos sinais que constatara, não de um suicídio,
como se fizera capciosamente, acreditar, mas de um bárbaro crime, frio e
premeditadamente cometido.
Referiu-nos esse fato, para
nós desconhecido, o digno amigo e colega Antônio de Castro Carneiro que o
ouvira de seu genitor, quando certa vez, viera à baila a morte do inolvidável
homem público. É, assim, mais uma versão sobre o doloroso acontecimento.
Por ocasião da morte do Pensador, o doutor Silvério Nery,
governador do Estado, não se encontrava nesta cidade, pois que na noite de 13
seguira adoentado, com a família, para Paricatuba, em companhia do superintendente
municipal, doutor Artur Araújo, indo este, também com a família.
Comunicada ao chefe do executivo
estadual a infausta notícia, por meio de embarcação rápida que saíra de Manaus
às 7 horas do dia 14, o governador, por estar doente, não pode vir à capital,
tendo delegado poderes para representá-lo nos atos fúnebres, ao doutor Porfírio
Nogueira, secretário do Estado.
Constituiu
o enterro de Eduardo Ribeiro verdadeira apoteose. Nunca se tinha visto tamanha
consagração a um morto por parte do povo. Dez bondes superlotados partiram da
antiga estação, à praça da República (hoje Pedro II), com destino à residência
do falecido.
Quando os bondes chegaram à
Chácara Pensador, já havia ali incomputável massa humana, formada de todas as
classes sociais. O ambiente era de intensa tristeza. Todos estavam compungidos,
diante da tremenda realidade. Já não mais existia o benemérito cidadão que transformara
uma grande aldeia em uma cidade moderna.
No meio da sala estava o
caixão que guardava os restos mortais de Eduardo Gonçalves Ribeiro. Era
riquíssimo, de pelúcia preta, todo guarnecido de rendas e galões de prata fina,
tendo um passarinho nas pontas da cruz, também, de prata; aos pés, bem feito
monograma com as iniciais – E.G.R.
O caixão estava sobre uma essa
de luxo, ardendo quatro velas ao lado. O corpo vestia casaca, gravata preta e
botinas de verniz.
Fez a recomendação monsenhor Benedito
da Fonseca Coutinho acolitado por quatro padres agostinianos. Conduziram o
caixão para o bonde fúnebre, o coronel Afonso de Carvalho (presidente da Assembleia), doutor Porfírio Nogueira, coronel Emídio
Pinheiro (comandante da Polícia) e o
desembargador Joaquim Lisboa; o veículo estava ricamente preparado, de veludo
preto com franjas prateadas e bordas brancas.
O féretro partiu da Chácara
às 17 horas e 15 minutos, abrindo a marcha fúnebre o carro que conduzia o
corpo, seguindo-o 10 bondes apinhados de gente. O préstito chegou ao cemitério
de S. João Batista às 18 horas. A essa hora a necrópole já se encontrava cheia
de amigos do pranteado morto “que numa ânsia dolorosa e triste esperavam o seu
cadáver”.
Em um dia de Finados... |
Falaram a beira da sepultura:
doutor Porfírio Nogueira, secretário do governo, em nome do Estado do Amazonas;
major Domingos Andrade, delegado do Grande Oriente do Brasil; senhor Alberto
Leal, pela colônia portuguesa; doutor Barbosa Lima, em nome do jornal Amazonas; em nome do Congresso
Legislativo discursou o coronel Afonso de Carvalho; senhor Leonel Mota, pela
loja maçônica “Esperança e Porvir”; pelos operários, o senhor J. dos Anjos.
Baixado o caixão à sepultura,
foram lançadas sobre a mesma, pelos amigos do inesquecível cidadão inúmeras
flores naturais. (fim)
(*) O Jornal, Manaus, 16 de
outubro de 1949
*
* *
Despacho judicial demonstra o extremo cuidado para com os bens do falecido. No mesmo dia, 14 de outubro, doutor Bonifácio abriu o processo.
O Doutor Emílio Bonifácio Ferreira de Almeida, Juiz Municipal de
Órfãos, Ausentes e Interditos de Manaus, capital do estado do Amazonas, etc.
Havendo
falecido hoje em sua chácara denominada Pensador, no bairro da Cachoeira
Grande, desta cidade, o Doutor Eduardo Gonçalves Ribeiro, sem deixar herdeiros presentes,
deixando, entretanto bens que devem ser devidamente acautelados, mando que o
Escrivão Nogueira, autuando este, intime os Doutores Curador Geral de Órfãos,
Ausentes e Interditos e o Procurador Seccional da República, para o dia quinze
do corrente, às nove horas no referido lugar, proceder-se à arrecadação e
arrolamento de ditos bens, dos quais nomeia Curador o Doutor Amaro Carneiro
Bezerra Cavalcanti, que também será intimado.
Cumpra.
Manaus, 14 de outubro de 1900
Eu,
Francisco Nogueira de Souza, escrivão, escrevi.
a)
Emilio
Bonifácio Ferreira de Almeida.
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