O sol radiante promete
um calor bem amazônico, mas há de causar uma noite de temperatura amena, para
permitir que a família e os amigos saúdem ao seu Beca, ou se preferir, José
Ferreira dos Santos que aniversaria hoje, atenção: importante são os dígitos: 90 anos!
Convite da festança |
O texto abaixo, saudando o
irmão da Dona Doroteia, nossa saudosa e bem-querida madrasta, pertence ao mano
Renato. Todavia, aproveito o espaço para oferecer uma lembrança do Beca, que passou a morar em nossa residência, no Morro
da Liberdade. Comprado por ele na Zona Franca, recordo de pequeno rádio de pilhas, o qual
nos permitia ouvir (com intensa interferência) a transmissão dos jogos do
campeonato carioca.
Salve caríssimo “tio”
Beca, obrigado pelos sorrisos e pela acolhida.
TIO BECA - 15.07.2019
Renato Mendonça
Aproximava-se o tempo das festas de
fim de ano, os dias estreitavam-se cada vez mais para receber um novo ano. A
casa de Luzia Ferreira Batista estava em ebulição, uma efusão de alegria; o
patriarca João Batista tinha chegado recente de sua viagem rotineira de
trabalho de marítimo, e com ele desembarcava também, além da alegria, os
provimentos que iriam garantir a subsistência pelos próximos dias.
Para completar o júbilo, apareceu de
surpresa, sem que ninguém estivesse esperando, o irmão mais novo do clã dos
Ferreira, o Beca. Era um moço com pouco mais de trinta anos, forte, jovial,
sorriso brilhante reforçado por um dente de ouro. A felicidade estava no rosto
de todos; Doroteia, a caçula das mulheres não disfarçava o seu contentamento,
fazia anos que não se viam; fazia anos que ele não se comunicava com ninguém da
família, nenhuma carta, nenhuma notícia. Luzia também não se continha, era como
se o Papai Noel estivesse ali distribuindo um presente inesperado.
Presente da família Mendonça |
Era difícil entender o que estava
acontecendo, somente consegui atinar que aquele moço, José Ferreira, o Beca,
estava voltando depois de um longo trabalho nos seringais e garimpos, e pelo
que conversavam ele desejava permanecer por perto, não havia mais razão para se
afastar.
À noite, quando meu pai chegou do
trabalho, soube da notícia e foi até à casa da Luzia para conhecer o novo
cunhado. Fui junto, queria participar daquele congraçamento familiar. Só não
esperava que ele me obrigaria a “tomar a benção” daquele jovem moço, como sendo
meu tio. Fiquei encabulado, fiz o ato a contragosto, não estava acostumado com
um tio tão jovem, na minha ótica. Ainda mais que o Beca percebendo a minha
timidez, exigia sempre e ria, um sorriso de satisfação por me deixar acanhado.
Eu pensava que os tios eram sempre mais velhos. Custei a me adaptar a essa
situação, foi um aprendizado para me conformar com situações adversas.
Depois, o tempo foi nosso aliado, nos
aproximou e eu já considerava que o “tio Beca” chegou para emprestar mais
euforia ao nosso ambiente, um adulto com experiência em trabalhos duros e
desafios da vida. Ele gostava de tomar banho no igarapé do 40, e atravessava o
rio na época da cheia, quando estava mais largo. Eu e meu irmão Antônio
tentávamos o acompanhar com dificuldade. Eu normalmente desistia, ainda não
sabia nadar bem, era um principiante, e ficava com medo de me afogar.
O seu trabalho como “moço de convés”
na navegação de cabotagem, entre Belém e Manaus, nos afastou mais um pouco.
Porém, sempre que sobrava um tempo, e uma oportunidade, ele queria rechear esse
tempo com diversão, com alegria. Numa ocasião, um sábado de aleluia, ele
“roubou” um pato do quintal da sua irmã Luzia. Houve uma certa dificuldade para
distrair a irmã, pois o bicho era grande, pesado, arredio e difícil de
conseguir domá-lo sem levantar suspeita. Em seguida, já combinado, pediu à
outra irmã, Doroteia, que preparasse com molho pardo, um pato à cabidela, como
se diz no Nordeste. Depois de pronto, chamaram a Luzia para participar do
banquete, mas em nenhum momento ela suspeitou que fosse o pato do próprio
quintal. Só depois de algum tempo, ela ficou sabendo da peripécia do irmão...
Daqueles dias, ficaram boas lembranças,
belas recordações. E ficou um vínculo de convivência humana. As mudanças de
rumo nos afastam de vez. Quando içamos nossa vela do destino, não imaginamos
para que lado o vento vai soprar, mas sempre queremos que esse sopro parta de
Deus. Ele nos guia e nos conduz. Assim, dessa forma, desejaria que Deus
continuasse a guiar a saúde e a felicidade de José Ferreira dos Santos, o tio
Beca.
Para não esquecer, e sem me encabular:
bença, tio Beca!
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