Capa da revista |
Um ano após sua fundação, o clube intentou editar uma revista, denominada de Madrugada que, no entanto, não passou do número inaugural. Neste, contudo, se encontram algumas diretrizes, na verdade, os amplos objetivos do CM.
Este documento sempre despertou interesse e pesquisadores, porém, estava sumido, ou não era conhecido qualquer exemplar. Um deles, acabo de catar. E dele reproduzo o texto enunciado.
Documento do Clube da Madrugada |
No momento em que o Brasil
sofre uma crise total em todas as suas forças intelectivas, morais,
educacionais, econômicas e sociais, a mocidade consciente do Amazonas, agrupada
sob a égide do Clube da Madrugada, une-se para defender esta herança social
inesgotável que herdamos de nossos antepassados, em cujas causas concernentes à
debacle, atuam grupos de caráter negativo anacrônicos, divorciados da realidade
brasileira e defensores de posições cômodas e de princípios apátridas.
Nesta senda, quanto mais
penetramos, apresentam-se fatores desintegradores que clamam por uma tomada de
posição definida por parte da mocidade, em torno dos problemas que se nos antolham
prementes, menosprezados por esta geração que passa, e que em dias muito breves
virão acarretar as consequências imponderáveis para o alicerçamento de nossa
cultura na sua formação geral.
Se analisarmos, mais
profundamente, a contextura total de nossa sociedade, iremos encontrar nos
elementos que formam a nossa elite intelectual dirigente, uma apatia criminosa,
no que diz respeito à formação e renovação de valores, que serão responsáveis
vindouros de nossos destinos, e, subsequentemente continuadores de nossa
posição continental. Semelhante atitude gera, nos moços, uma repulsa que nos
impulsiona a restaurar esta contextura social, e apresentar novo programa de
ação, com a finalidade primordial orientada no sentido de elevação dos padrões
intelectuais, morais, econômicos e sociais.
Face à esta situação, o Clube
da Madrugada define-se perante às várias categorias que pensamento humano expressa:
Literatura: Não há literatura no Amazonas. Primeiro, fatores culturais e
morais determinaram nos homens ditos de letras, uma posição acomodatícia,
geradora de um individualismo exacerbado, cuja consequência derivou o
afastamento de valores positivos que pudessem fazer perigar o seu totemismo
aceito como absoluto.
Segundo, fatores de ordem
econômica contribuíram para que elementos de valor intelectual procurassem
novos meios, onde espíritos esclarecidos lhes ofereciam melhores oportunidades,
em virtude de seu talento. Como prova do que asseveramos, vimos estes elementos
afirmarem-se nos meios centralizadores do pensamento, onde a luta pela
expressão das ideias não era sustentada por oligarquias intelectuais, fenômeno
este instituído no Amazonas, há longa data.
Fácil será observar o que
acontece na esfera convencionada chamar-se acadêmica, onde campeia a servidão e
estilos e ideias antiquadas, importadas diretamente da Europa, no século
passado. Desconhecem francamente, por meio de um indiferentismo olímpico, a
existência de uma literatura puramente nacional. Tal ignorância redunda,
consequentemente, numa arrogante indiferença diante dos próprios valores da
terra. Porque estes procuram renovar ideias e conquistar formas novas de
expressão e não encontram apoio numa crítica evoluída. Disto resultou o êxodo
anual de moços em direção do Sul do país.
Por isso o Clube da Madrugada
inspira-se nos elementos formadores de nosso ambiente, para a efetivação de uma
literatura condizente com os princípios de liberdade imanentes ao artista, na
sua expressão literária, conjugados com os itens acima referidos, os quais
estratificam uma literatura sadia. Desde já, o Clube da Madrugada exproba o
patrocínio de dogmas do Estado e de elementos que queiram fazer instrumento
seu, a obra que pretendemos edificar.
Escultura, Pintura e
Arquitetura: Infelizmente, stricto sensu, não há os três ramos de
Arte marginados, no Amazonas, digna de menção. Os resquícios que por ventura
existem não formam uma unidade, no ambiente intelectual. Não apresentando
material necessário a uma análise, nos abstemos de aprofundar, neste
particular, uma crítica dentro dos ditames da arte.
Sociologia: Apesar de o Amazonas ser uma unidade da Federação, que apresenta
elementos vastíssimos para a pesquisa sociológica, apenas temos alguns
estudiosos que se detêm nos problemas superficiais que afetam nossa região.
Lastimável sob todos os aspectos, principalmente, para a valorização do
amazônida, quando a presente conjuntura se preocupa na revalidação dos padrões que
regem a Ciência Social, que tem por objeto a integração do homem no meio
cultural.
A ciência do homem, que hoje
revela os múltiplos ângulos pelos quais o indivíduo é envolvido na sua
mesologia, é ainda, no Amazonas olhada com a desconfiança dedicada à magia
negra, na Idade Média. Vive-se, deste modo, preso a um ineditismo criminoso
responsável pela incúria em que, atualmente, se encontra o homem da gleba.
Tanto assim que, as pesquisas mais sérias realizadas na região, são aquelas
feitas por entidades alienígenas, sem qualquer laço com o nosso pensamento.
Deste modo resulta, muita
vez, a deturpação completa dos denominadores encontrados, nesses trabalhos. Por
isso, acreditamos ser necessária a formação de uma elite iniciada nos assuntos
da ciência do homem, em decorrência das necessidades amazônicas, a fim de que
seja revelada a verdade social acerca de nossas populações, por pesquisadores
insuspeitos, irmanados por liames culturais ao homem do Vale.
Nesse sentido, o Clube da
Madrugada está forjando a coliminação desse objetivo, por intermédio de seus
membros, dentro de uma nova dinâmica sociológica, consubstanciada nos processos
analíticos e sintéticos de nossa realidade mesológica, em sua fonte.
Erradicando, destarte, os trabalhos de gabinete que têm surgido sobre os nossos
problemas, os quais falseiam, despudoradamente, a verdade cientifica e moral.
Urge, portanto, o trabalho planejado e científico, olhando para o futuro,
deixando de lado este pragmatismo pernicioso, para nós, dos homens que se dizem
práticos.
Economia: No Amazonas, os estudiosos desta matéria são muito poucos e têm
se colocado à parte, não tomando posição ante a renovação por meios culturais
adequados que venham beneficiar nossa região. Estudos econômicos que se têm
feito no Amazonas não procuram observar a realidade, apegando-se estes a
sistema geral, não penetrando na análise econômica.
Essa deficiência de
estudiosos do ramo da Ciência Econômica tem provocado, por parte dos
administradores, atitude que em vez de incentivar a produção tem, aniquilado
novos empreendimentos econômicos em detrimento de uma nova fase de
desenvolvimento para o Vale.
O Clube da Madrugada estudará
e pesquisará, por intermédio de seus membros, os problemas que mais afligem a
nossa região, e que são resolvidos, comumente, por “jornalistas”, sem
conhecimento de causa, levando o povo a uma falsa orientação. Dependerá,
sobremaneira, de estudos esclarecedores da matéria, uma nova atitude
governamental, em relação a assuntos econômicos ligados diretamente ao desenvolvimento
da Amazônia. Para este fim, por certo, contribuirá uma elite realista,
conhecedora dos verdadeiros problemas da terra.
Filosofia: Pouco existe no ramo, mesmo porque os homens de letras do
Amazonas apegam-se, como impertinência, aos estudos acadêmicos da filologia em
cujo labirinto perdem-se, em prolongadas polemicas, sem resultado algum. E
quando encontramos indivíduo interessado nos estudos filosóficos, é apenas
superficialmente, sem nenhuma profundidade, conhecendo, de soslaio, a história
da filosofia.
Existem poucos filósofos no Brasil,
e no Amazonas nenhum. Contra esse descaso levanta-se o Clube da Madrugada,
procurando sistematizar um estudo dos princípios e fins do homem no Cosmos.
Estudo esse direcionado nos métodos universitários de amplo debate, quando
entra em especulação sistemas filosóficos dos mais antigos aos modernos: sejam
dos aleatas, jônicos, epicuristas, sofistas, espiritualistas, materialistas,
aos marxistas, existencialistas e os neosistemas que têm aparecido. Demócrito,
Epícuro, Sócrates, Platão, Plotino, Confúcio, Aristóteles, Santo Tomaz de Aquino,
Descartes, Kant, Hegel, Bergson, Kieerkgaard e tantos desfilarão nos seminários
que pretende realizar este movimento de renovação.
Esposando os princípios
encimados e refutando o conservantismo rancoroso, o Clube da Madrugada tem por
escopo plasmar uma nova consciência pertinente à realidade brasileira. Desta
assertiva queremos dirimir quaisquer resquícios niilistas ou iconoclastas, mas,
que vivemos uma época de decrepitude senil.
Deste modo, somos contra a
concepção de um stato quo estático.
Nascendo dessa premissa, a nossa concepção dinâmica do processo histórico,
determinando novas representações no pensamento humano, que se coadune com a
evolução de nossas necessidades sociais. Lutamos, portanto, nesta segunda fase
de nossa existência pela emancipação mental de nossa ideologia. Para o Brasil:
artes, ciências sociais, sistema politico e econômico eminentemente nacional,
surgido da premência de nossa idiossincrasia. Esta nossa atitude, achamos
conscientemente, não nos classifica como xenófobos. Pelo contrário, lutamos
contra a xenomania de todos aqueles que advogam soluções literárias, políticas,
econômicas e sociais com a já celebre sentença: MADE IN...
Esperamos, desde já, as compreensões
dos homens de mentalidade abstrusa, que tiveram capacidade intelectual para
acompanhar a nossa evolução social. Porém, a esses, haveremos de arrostar os
empecilhos levantados, com o idealismo moço que nos anima a encetar esta
cruzada, com o objetivo sacrossanto dos jovens livres, qual seja a libertação
do Brasil dessa visão daltônica dos dirigentes, em todos os setores,
responsável por uma consciência amorfa, numa geração que se forma.
Fecho do Manifesto com várias assinaturas
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