CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

quarta-feira, junho 19, 2013

INVASÃO DA MANÁOS IMPROVEMENTS (V)

Serenados os ânimos em junho de 1913, o poder militar impôs severas regras de controle, m especial, sobre os rebelados da Polícia Militar do Estado. Em decorrência de que os demais jornais foram empastelados, apenas o Jornal do Commercio seguia noticiando. Por isso, volto a reproduzir deste matutino do dia 19, o texto seguinte:

Com a assistência do Dr. Gaspar Guimarães, Chefe de Polícia, e da comissão militar encarregada de proceder a arrecadação dos valores existentes no quartel do Batalhão de Segurança, foi ontem aberto o respectivo cofre.
Este não fora arrombado, como se propalou por aí. Ao contrario, devido a ter atingido um sharapnel (munição de artilharia antipessoal utilizada até a II Guerra) certeiro no departamento da arrecadação no momento em que os últimos amotinados procuravam arrombá-lo, não conseguiram eles levar a termo o seu intento, logrando violar apenas o seu revestimento externo, que é de ferro.
No interior, foram encontrados os depósitos constantes do seguinte: sete contos e cem mil réis em moeda papel; um invólucro com quatrocentos e noventa e oito mil réis (saldo do ex-capitão Passos); (ilegível) quatrocentos e dezenove mil, oitocentos e nove réis, em outro invólucro (soldo em depósito do comandante Flaviano Gastão, que não havia recebido por não ter tomado posse de seu cargo); e doze mil e quinhentos réis em níquel (moedas).
Além disso, havia mais diversos valores em documentos.
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O Dr. Jeronimo Ribeiro, médico legista da Polícia Civil, procedeu corpo de delito em: coronel Adolfo Cavalcante, capitão Severino Corrêa da Silva, 2º tenente Francisco Marques Evangelista, cabo Manoel Paulo Cunha, soldados Lino José de Oliveira, José Felipe Nery, José Claudino Braz e Manoel José dos Reis; populares José Moreno da Silva, Manoel da Silva e Henrique José de Oliveira, ex-cabo da Polícia.
Foram considerados feridos gravemente: coronel Adolfo Cavalcante, capitão Severino Corrêa da Silva, cabo Manoel Paulo Cunha e os paisanos José Moreno e Manoel da Silva. O capitão Sinésio Benevides dispensou o exame de corpo de delito, alegando não haver recebido ferimentos e, sim, ligeiras escoriações.
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Na ausência do Dr. Rocha dos Santos, que está encarregado do inquérito sobre os acontecimentos do dia 15, acha-se assinando o expediente da 2ª Delegacia, o subdelegado Feliciano Ferreira da Silva.
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Apresentou-se ontem ao quartel da Força do Estado o sargento Felinto Joaquim de Oliveira, um dos revoltosos, que assumira as funções de comandante. Interrogado, entre outras coisas disse que o movimento fora combinado entre sargentos, sendo os principais Castro e Falcão, instruídos por dois ex-oficiais. #

Entendo que este jornal cometeu nítida parcialidade, pois as notícias divulgadas são do escaninho do Governo, por intermédio da chefia de Polícia, que apura os fatos. Nenhuma palavra sobre os soldados presos pelo Exército. Sequer a identificação completa dos cabecilhas da sublevação o jornal de Vicente Reis foi capaz de divulgar. Ou não interessava. Àquela época, era assim mesmo: o jornal pertencia ou defendia um partido politico, por isso, o JC calou-se ou intimidou-se, apesar de que as conversas nas praças anunciavam a morte de vários policiais em situação até hoje desconhecida.
Os políticos envolvidos recorreram aos políticos federais, tendo encontrado no ilustre senador Ruy Barbosa o porta-voz conveniente. Obviamente, municiado pelos correligionários amazonenses, o ferocíssimo discurso proferido pelo representante baiano deixa dúvidas sobre as atrocidades cometidas contra os policiais. Falo por mim. Creio que houve uma retaliação superlativa, que a cidade foi ocupada militarmente, mas alguns fatos descritos pelo senador carecem de fundamentação, como é o lance da expatriação de mais de 400 pessoas para Belém do Pará.

Outra passagem, a casa de dois desembargadores – Abel Garcia e Raposo da Câmara – estiveram cercadas pela tropa federal. Objetivo: impedir a ida dos magistrados ao Palácio da Justiça, a fim de não permitir o quórum. Estudando-se a história do Tribunal de Justiça do Amazonas não se encontra qualquer referência a esse acontecimento.
Levou algum tempo, mas a tranquilidade retornou à capital, com repercussão pelo interior do Estado. Em 3 de agosto, o jornal O Conservador, de Itacoatiara, em franco adesismo ao governador Pedrosa,  proclama aos leitores na coluna Ecos:  
 
Página inicial de O Conservador,

          Pouco a pouco, passados os dias tenebrosos de junho, quase     apagados os últimos ecos duma revolta de tresloucados, a vida do Estado foi se normalizando, e hoje podemos confiantes tratar do desenvolvimento moral e material da nossa querida terra.
O Governo transato entregou ao atual uma administração em ruínas, legado de mais um triste quatriênio de sangue, de traições, perfídias e violências. (...)
De resto, a mazorca de junho, que foi uma consequência da que abortou em dezembro, -- e quer uma quer outra, senão fosse a fidelidade de amigos, -- tinha no seu bojo o plano sinistro de tirar a vida do Dr. Jonathas Pedrosa, entravou mais a vida do Estado, já em embaraços com uma tremenda crise financeira.
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Enfim, a serenidade alcançou igualmente a Força Policial, que recebeu seu comandante titular em princípio de agosto, recompôs seus quadros, expurgou os ferrabrases, curou as feridas dos seus e partiu para superar novo período, com disciplina e ordem. Todavia, cabe perguntar, encerrando esse melancólico tema, que representou para aquela instituição esta sedição? A resposta nos é ditada por outro oficial da reserva, desbravador da temática policial militar do Amazonas: Alcides Costa, em trabalho intitulado Sedição Militar (PM) de 1913.

Embora se queixando da escassez de fontes, entende o coronel Costa que “para alguns (foi) um malogro, um desapontamento; para outros, uma ação revolucionária capaz de obter uma mudança política”. Por outro lado, encerra meu colega de quartel: “o episodio serviu par demonstrar a submissão do exército e das forças policiais ao grupo no Poder e aos que lutavam pelo mesmo poder”. 

Ao final do governo de Jonatas Pedrosa (1913-17), que teve em seu vice-governador, Guerreiro Antony, um avultado adversário, a luta armada seria renovada. Mas isso é outra história.

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