Somente
a 17, com a Força Policial subjugada ao controle do Exército e enterrados os
mortos e socorridos os feridos e protegidas as instalações da Improvements, os jornais voltaram às
ruas. Dos que então circulavam, resta-nos o centenário Jornal do Commercio, do qual reproduzo os detalhes desse
movimento. A agitação teve repercussão
nacional, a meu ver, por três motivos: o emprego da Força Terrestre; a cobrança
judicial interposta pela concessionária inglesa; e a peculiaridade da revolta.
Deu
no Jornal do Commercio, de 17 de
junho de 1913.
Recorte do jornal, de 17 de junho
Sejam
as nossas primeiras palavras uma condenação formal a tudo quanto se passou
nesta cidade nos dias 14 e 15 do corrente.
Somos
perfeitamente coerentes. Censuramos acremente o bombardeio de Manaus e verberamos
os tristes fatos de que foi teatro esta cidade em dezembro do ano passado. Não
podemos, portanto, deixar de profligar esta revolta e os atentados contra a
imprensa, isto é, contra os quatro jornais que aqui se publicavam.
Estamos
numa terra com foros de civilização e tais acontecimentos, perturbadores da
ordem, aniquiladores da paz das famílias, são deprimentes, geram anarquia e
colocam-nos em posição muito mesquinha diante dos que nos olham de fora.
Não
sabemos, nem queremos saber, a origem de semelhantes fatos. Seja qual for eles
merecem a nossa decisiva repulsa, agrade ou desagrade a gregos ou troianos, a
desvairados ou a loucos.
x-x-x
Só
hoje que a calma voltou à cidade, circula o Jornal
do Commercio, não o tendo feito ontem, pois a atmosfera de incerteza e de dúvidas
que pairavam sobre a população, impedia que nos manifestássemos, com segurança,
sobre os tristíssimos e lamentáveis sucessos ocorridos no dia quinze, à tarde,
tendo princípio no quartel do batalhão militar de segurança do Estado.
Vamos,
porém, recapitular ligeiramente os fatos, procurando dar quanto possível a
verdadeira súmula dos acontecimentos, de acordo com os informes que nos
pareceram mais acreditáveis.
Assim,
no dia 15, cerca de 13h30, correu célere pela cidade a notícia de que praças do
batalhão militar do Estado se haviam revoltado. De
fato, tiros de carabina se ouviam, partidos do quartel e, pouco depois, em
debandadas, passavam praças em todas as direções, alguns feridos.
Procurando
sindicar de quanto havia, fomos informados de que parte dos praças, comandados
por inferiores (sargentos), se havia
revoltado, atirando sobre os companheiros de uma das companhias que tinham
ficado fieis ao Governo, ferindo a vários e alvejando alguns oficiais que
avisados de que alguma coisa de anormal se passava no quartel, para lá tinham
ido a fim de dominar a soldadesca indisciplinada.
No
dia 15, depois da revista regulamentar do meio-dia, em lugar de se retirar, os
praças foram para as reservas, arrombando as arrecadações, armando-se e
municiando-se e, ao mando de sargentos, formando no patamar superior do
quartel.
A
esse tempo, o tenente-coronel Adolfo Cavalcante, comandante interino do Batalhão,
já avisado de que se tramava qualquer movimento sedicioso, dirigia-se ao
quartel, mandando prevenir a oficialidade, comparecendo, pouco depois, os
capitães Severino Corrêa da Silva, Raimundo Sinésio Benevides, este ajudante do
Batalhão e aquele comandante da Companhia de Bombeiros; 1º tenente Benedito Martins de Souza e o 2º
tenente Francisco Marques Evangelista e mais alguns outros, cujos nomes não
conseguimos apurar.
O
comandante Adolfo Cavalcante, tendo sido recebido pelo oficial de estado (de dia), tenente Raimundo (Eduardo) Rocha, ia chegando ao patamar
da escada, que dá para o andar superior, quando nos alojamentos desse andar
rompeu grande alarido, ouvindo-se alguns tiros.
Punha
o pé no primeiro degrau o comandante Cavalcante, quando um praça, aparecendo no
topo da escada, apontou-lhe a carabina, fazendo fogo. O comandante
imediatamente caiu, com um ferimento no pescoço, tendo a carótida quase
atingida pelo projetil. O capitão Severino, vendo-o cair e correndo em seu auxílio,
foi alcançado por uma bala que lhe esfacelou o antebraço direito.
A
esse tempo, acorreu também o tenente Raimundo Rocha, oficial de estado, que ao
chegar junto a um grupo de soldados amotinados, foi por um deles enfrentado,
recebendo um tiro que lhe penetrou o crânio, prostando-o mortalmente ferido e
sucumbindo poucos minutos depois.
O
capitão Raimundo Sinésio Benevides, intervindo, recebeu um tiro que lhe atingiu
um dos pés, sendo agredido pelos soldados que bastante o maltrataram, a couces
de arma.
Saíram
também feridos o tenente Francisco Marques Evangelista, com um projetil no
braço direito, e o 2º tenente Arthur Martins, consta ter sido também baleado o
tenente Benedito Marques de Souza.
O
tiroteio então se tornou medonho. Uma das companhias, conservando-se fiel à
ordem e ao Governo, foi atacada pelos praças revoltados, resultando sair um dos
soldados morto e vários feridos. Vendo que não podiam resistir aos amotinados,
fugiram os que os enfrentavam, tomando então os sediciosos conta do quartel, e
perseguindo à bala seus companheiros, que saltavam o muro ou tentavam sair pelo
fundo do edifício.
Dentre
os feridos estão os soldados José Maciel de Melo, no braço direito; Pedro Cruz
de Araújo, vulgo Macaco, no quadril
esquerdo; Francisco Pacheco, na perna esquerda, todos com ferimentos leves.
Foram ainda feridos, Lino José de Oliveira, nº 22 da 2ª companhia, com duas
balas, uma que o atingiu no rosto e outra no ombro direito; Manoel Paes da
Cunha, nº 8 da 3ª companhia, com um ferimento no ombro esquerdo.
Disse
este praça a um de nossos companheiros que, estando no Mercado (Adolfo Lisboa) pela manhã, foi chamado
por um ex-oficial que lhe dissera ir ocorrer um levante no quartel, pois
contava com cerca de 100 praças para esse fim, acrescentando que morreriam
todos os que não aderissem ao movimento. De posse dessas informações, Cunha foi
até a casa do comandante Cavalcante, narrando o que ouvira.
Este
oficial, porém, segundo ouvimos dizer, parece não ter dado crédito ao
denunciante, mandando-o para o quartel, o que fez, vendo pouco depois de uma
hora romper o fogo, que partia da 2ª companhia, sendo atingindo quando subia a
escada.
O
soldado José Felipe Neto, do esquadrão (de
cavalaria), foi ferido no peito, lado esquerdo, saindo a bala pelas costas,
sendo seu estado considerado gravíssimo. José Claudino Braz e Raimundo Corrêa
de Moraes foram atingidos, o primeiro com uma bala na perna, e o segundo também
por bala na coxa direita. Ao que nos disseram, foi este último soldado que fez
fogo sobre o comandante Adolfo Cavalcante. (segue)
Nenhum comentário:
Postar um comentário