Na segunda 17, Manaus ficou em saber do avanço da
expedição em busca dos mortos, porque não circulava qualquer jornal. Novamente o
padre-cronista L. Ruas traduzia com o texto abaixo o desalento que tomou conta
da capital, quiçá do país.
O SALVAMENTO
L. RUAS (*)
O poeta Jorge Tufic (de bigodes) e o padre-cronista L. Ruas, sem data |
O
fato de já haverem decorrido três dias e, até agora, esta dúvida ainda
continuar é, realmente, de estarrecer.
Conversando
com várias pessoas que estiveram tomando parte ativa no trabalho de localização
do aparelho desaparecido, ouvimos algumas explicações que, à primeira vista,
parecem justificar este retardamento. No entanto, uma pergunta nos tem
perseguido constantemente: O que pode justificar a perda de uma vida humana?
E
o que é mais curioso é pensarmos que o problema do salvamento tem sido colocado
na base de hipóteses: "Talvez não sejam os destroços do avião”... Parece
que não há sobreviventes... etc. Mas, pensemos, agora, em termos positivos: e
se forem Mesmo os destroços do avião? E se houver ou se houve sobreviventes? Já
não aconteceu de, em desastres aéreos, onde tudo parecia estar destroçado,
haver sobreviventes? Se as buscas tivessem sido mais rápidas, mais eficientes,
no caso daqueles dois moços caídos nas selvas de Mato Grosso, eles não teriam
sido salvos?
É isto
que nos causa pasmo. Manaus, plantada no coração da estupidez desta selva
amazônica, imensa e impenetrável, centro geográfico de uma enorme região
permanentemente cortada por aviões que a cruzam de norte a sul, de leste a
oeste, continua, no entanto, completamente desprovida de todo equipamento de
salvamento para eventualidades como esta que, embora, não desejemos jamais
tornem a acontecer, sabemos, porém, que podem acontecer. A desculpa de que o
local onde, presumivelmente, se despedaçou o Constellation da Panair do Brasil, é de dificílimo acesso, pode
explicar tal situação, mas, de maneira alguma, a justifica. Por que Manaus não
tem, ao menos, um helicóptero? Por que é dispendioso para o Brasil? Dispendioso
para o Brasil que se dá ao luxo de possuir um inutilíssimo porta-aviões? Ou
Manaus não está devidamente preparada para estas emergências, apenas, porque se
trata mesmo de Manaus, esta sempre esquecida e abandonada cidade de Manaus,
capital deste Estado que continua sendo, para o Governo Federal, apenas, alguma
coisa, uma porção de terra, geograficamente ligada ao restante da União?
Bom,
graças a Deus, já chegaram os helicópteros dos Estados Unidos...
Esperemos
que no momento de colocarmos o ponto final nesta crônica, já os aviões
norte-americanos nos tenham trazido alguma notícia, algum indício que dissipe,
de uma vez, esta indecisão que nos tortura, nos atormenta e revela uma
criminosa inaptidão nossa.
(*) Extraído de seu livro Linha d´àgua: crônicas. Manaus, 1970
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