CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

sexta-feira, julho 24, 2020

MANAUS DE HELIANDRO MAIA

Pouco sei sobre Heliandro Maia (desta vez, o Google não me auxiliou). Todavia, lembro de sua atuação em órgão de Turismo do Estado e de suas visitas ao quartel da Praça da Polícia, onde trocamos algumas conversas. Sei ainda que pertencia a família de Álvaro Maia, governador do Estado, e escritor consagrado na planície. A família de Maia provém de Goiabal, seringal nas proximidades de Humaitá (AM). 
Heliandro foi educado pelos padre salesianos do Dom Bosco, e, quando encerrou o ensino médio, foi levado para a capital paulista, onde completou sua formação acadêmica. De volta a Manaus, empregou seus conhecimentos em órgãos estaduais.
Alguns dados sobre o autor e a cidade de Manaus estão no texto aqui postado, de sua lavra, que compartilhei de O Jornal (24 janeiro 1965).

Recorte de O Jornal, 24 janeiro 1965
Heliandro Maia

- Heliandro, passa pra dentro! Olha o carro! Quando teu pai chegar vou contar!

Era a Bita, cabocla do Madeira, o meu anjo da guarda. Hoje, a boa Bita está no seringal, lá para as bandas do Goiabal, duas horas depois de Humaitá, cheia de filhos e com certeza esquecida daquele moleque travesso e malcriado. Vou ai, Bita. O meu abraço terá a quentura desses anos de ausência. Pois olha! Nunca te esqueci. Ainda tenho os olhos úmidos das lágrimas derramadas da partida, criança ainda, para o Sul. Em 58 não te encontrei. Estavas no interior do município e eu permaneci poucas horas em Humaitá, tempo suficiente para beijar minha velha avó. Lá vou eu fixando-me em Humaitá. Volto a Manaus, aquela infância querida está lá.

Cachoeirinha cresceu, já vai sozinha a última sessão do Ipiranga. Como eu, tem saudades daquela época. A minha "chácara" — onde levei, recordo-me bem, tremenda surra de meu pai — perdeu sua liberdade, mas, em compensação, parece que para lhe proteger, Deus plantou um templo ao seu lado. As orações ali rezadas conservam-na pura como é a infância de todos nós.
Heliandro, tua avó chegou do seringal. Vem passar uns dias conosco.
 Exultava com essa notícia. Significava que teria a tapioca e o mingau de banana no café da manhã, preparados pelo carinho que só as avós têm. Veria, também, minha irmãzinha. Ana Maria, a caçula, veio do seringal na véspera de nossa partida para o Sul. Tinha seis anos.

Praça da Saudade, outro degrau da caminhada. Agora, não posso mais correr no quintal de meu “templo”, os diplomatas não deixarão. E' contra o protocolo.
Epa! Antes da Praça tão saudosa — iluminada agora, também não é mais a minha namorada — deixei outras peraltices ali perto, na rua Monsenhor Coutinho. Gostava da sirene da ambulância.
Março. Aulas à vista. Mais três meses de especialização na arte de pular de “bonde andando”. Fui bom nisso. Em pegar, não era lá essas coisas, apesar de não ser o último da “classe”.
— Pessoal! Espia só ali... O padre Agostinho vem pra cá.
Era mais um banho de igarapé interrompido.
O grande mestre “acarinhou-me” — certa vez. Condecoração eterna do meu Colégio D. Bosco.
O Guarany, o meu cinema preferido. Fecho os olhos — estou na casa da [rua] Joaquim Nabuco — e ouço o “bang-bang” da matinal de domingo. Não havia santo que impedisse o meu encontro com o Tom Mix. De repente tudo acabou.
— Meu filho, temos que ir para São Paulo. Fui transferido.

Não podia acreditar. Ia separar-me, tinha certeza, de minha infância querida. Voltei e reencontro um pouco da Manaus de minha infância. 

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