Recentemente empreendi a busca pelos dados dos oficiais da Polícia Militar do Amazonas (PMAM). As perguntas são múltiplas, porém nesta postagem vou avaliar o desdobramento das primeiras promoções, ou como eram incluídos os primitivos oficiais.
A formação de oficiais concretizada na própria
Polícia Militar do Amazonas suportou alentado atraso (e quanto!), ultrapassando
várias fases até o funcionamento de sua Academia, em 2002. Não obstante a longa
existência, posto que a corporação foi criada em 1837, antes mesmo da
instalação da província amazonense. A indigência da província logo impôs a dissipação
da Força Estadual, até que em 1876 esta foi recomposta e, desde então, segue
assinalando sua respeitosa presença nos espaços amazonenses.
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Diversas tomadas do antigo quartel da PM na Praça da Polícia |
A fim de instruir este levantamento, cabe
inquirir: como a corporação provia seu corpo diretivo, ou seja, como se aparelhava
quanto aos oficiais? Refiro-me ao primeiro instante de sua organização, inda no
Lugar da Barra, a denominação primitiva de Manaus, que crescia na beira do
barranco, cercada de igarapés e das diversas etnias em sua ilharga. Distante de
tudo e de todos, Manaus somente podia contar com material e pessoal militar escassos,
porém. A segurança pública era efetivada pela Força Terrestre, com uma marcante
deficiência de pessoal. Reservado aos homens, poucos eram os voluntários para o
serviço de vigilância pública, desse modo, restavam
engajados os analfabetos e os arrivistas (alguns estrangeiros).
A extração do látex trouxe um descomedido
alento ao território na virada do século 20, no qual a fortuna corrente
impulsionou a administração pública em todos os rumos, atraindo imigrantes
daqui e de além-mar. Evidente que a Força Militar Estadual foi contemplada. Com
a instalação da República (1889) e o usufruto da “fase áurea da borracha”, o
estado do Amazonas tomou pujante impulso. Vejamos apenas a evolução da Polícia
Militar, então denominada Regimento Militar do Estado, título este conservado entre
1896 e 1906.
O corpo de oficiais era integrado por
oficiais do Exército, em particular no comando, e de cidadãos escolhidos ou
indicados ao governante, segundo lhe permitia a legislação, e, enfim, os provenientes
da classe subalterna dos sargentos. No fundo mesmo, as promoções ocorriam em
função da afeição e do compadrio (no linguajar castrense: da peixada). Portanto,
inexistia a formação de oficiais.
Encerrado o boom da goma elástica
(cerca de 1920), quando a benfeitora exploração da borracha mudou de continente,
a derrocada financeira tomou conta do Estado. Órgão estadual, a Força Pública
foi no banzeiro, após período em que esteve desativada (1930-36), teve a
redução de efetivo e de soldo até alcançar o fundo do leito do igarapé na
metade do século passado. O balizamento desse descalabro pode ser notado pelo “efetivo
previsto para o exercício de 1950”, contados em 326 homens (lei 438/49).
Desativada em novembro de 1930, o
Amazonas prosseguiu sem força policial. Consolidando os esforços da Câmara Federal,
no início de 1936, Getúlio Vargas promulga a lei 192, de 17 de janeiro, com a qual
“reorganiza pelos Estados e pela União, as Polícias Militares, sendo
consideradas reserva do Exército”. Entretanto, o interventor Álvaro Maia já
havia sancionado a Lei 55, de 31 de dezembro, em que “restabelece a Força
Policial do Estado”, posto que não se tratava de estruturação. Uma das
diretrizes (art. 1º) estabelecia que sua implantação ocorresse em até seis
meses, todavia, o imperativo de policiamento e o grande afã de seus
ex-integrantes contribuíram para que, em 20 de abril, a Força retornasse às
atividades.
No bojo desta legislação federal encontram-se
regras, ainda que indiretas, sobre a formação de oficiais. Nela ficou
estabelecido que, após 5 anos de existência desta legislação federal (art. 25),
“só concorrerão ao provimento das vagas de segundo tenente, os candidatos que
possuírem o Curso de Formação de Oficiais, de sua corporação ou da Polícia
Militar do Distrito Federal; (...)”. Não foi dessa vez que algum candidato acudiu
à vaga inicial do oficialato portando o CFO, até porque o decreto-lei 1.623/39
revogou o citado artigo.
Dez anos depois, nova alteração ocorreu
na lei de reorganização das Polícias Militares. Com o país alforriado do
governo ditatorial de Getúlio Vargas, Gaspar Dutra baixa o decreto-lei
9.460/46, alterando o art. 8º, sem que modifique o entendimento sobre a
promoção aos candidatos a 2º tenente, que persiste “por merecimento
intelectual”. Concurso neles, pois! Na contramão, a Força Estadual amazonense como
não possuísse recursos para implementar essa decisão, prosseguia com o preceito
consuetudinário, aproveitando os sargentos e os “indicados” para o quadro de
oficiais.
1.
Oficiais da Reserva (R/2)
Em 2 de abril de 1941, Gentil João Barbato,
major do Exército, assume o comando da Força. Imbuído dos regulamentos
militares, obtém do Interventor a sanção do decreto-lei 581, de 2 de junho, que,
modificando legislação anterior (decreto 108/36), estabelece normas básicas
para a promoção ao primeiro posto do oficialato. As vagas destinavam-se aos
graduados, porém, se houvesse civis inscritos, dispondo do CPOR, “terão estes
preferência, sendo dispensados do concurso”. Pode ser alcunhada de lei Neper
Alencar, o primeiro beneficiário.
Ocorreu, no entanto, ligeira variação:
o acolhimento de oficiais R/2, sendo o primeiro deles formado no CPOR (Centro
de Preparação de Oficiais da Reserva), sediado em Belém (PA), turma de 1940;
logo, outros chegariam do NPOR (Núcleo de Preparação de Oficiais da Reserva)
pertencente ao 27 BC local, turma de 1942/43. Além disso, é conveniente
registrar que o primeiro oficial a concluir o CAO (Curso de Aperfeiçoamento de
Oficiais) foi o então capitão Omar Gomes da Silveira, na PMDF (em nossos dias
RJ), em 1954. Este oficial, sendo tenente-coronel, em 1967 assumiu o
comando-geral da corporação.
O capitão EB Pará Bittencourt assume o
comando em 12 de setembro de 1947, e logo se confronta com a lei 82, de
25|11|1947, a qual ordena (art. 16) que “a partir de 1º de janeiro seguinte
funcione na Polícia Militar o Curso de Formação de Oficiais”. Incrível, somente
40 anos depois se renova o empreendimento para a formação de oficial com a criação
da “Academia de Polícia Militar Coronel Neper Alencar” (lei 1.876, de 18|12|1988).
E mais 12 anos para seu funcionamento, a despeito de malmente aquartelada.
Outra cláusula (letra “d” do art. 15) estabelecia que a promoção de segundo
tenente, seria feita “por merecimento intelectual”. Logo, mediante concurso.
A lei 494, de 16|12|1949,
aprova o “Estatuto dos funcionários públicos civis do Amazonas”. Este código,
ainda que destinado a civis, certificou certas atividades e funções na
corporação da Praça da Polícia, nem sempre de forma republicana. Somente
para elucidar: foi aproveitado para comissionar um oficial médico EB no posto
de tenente-coronel PM e, servindo-se desta lei, designar o “comissionado” na
chefia da Casa Militar (07|1960).
A
promoção, que amiúde serve de pretexto para suspeita ou disputa acirrada entre
camaradas, já continha regras fundamentais, algumas bastante vagas, todavia,
cumpridas com higidez. Inexistia a figura do oficial excedente ou do agregado, expediente
tão comum em nossos dias. Em 1952, a lei 21, ao estabelecer as “normas para o
ingresso no oficialato da PM e para as promoções”, tornou-se um marco incisivo desse
processo.
2. Primeiros
oficiais de Escola
Em
1959, ao assumir o governo do Estado, o professor Gilberto Mestrinho nomeia ao
doutor (advogado) Francisco de Assis Albuquerque Peixoto para a função de coronel
comandante da Polícia Militar. Ao final desse ano, a corporação promove a
seleção de candidatos para o CFO (Curso de Formação de Oficiais) da PM da
Guanabara, hoje Rio de Janeiro. Foram selecionados três moços, nascidos em 1939:
Pedro Câmara, Pedro Rodrigues Lustosa e Hélcio Rodrigues Motta (um quarto,
desistiu – Pedro Falabela, saudoso prefeito de Urucará e gerente da Afeam). Tornaram-se,
pois, os primeiros alunos a oficial, adiante, os cadetes e, enfim, os oficiais
da PMAM com formação apropriada.
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Antigo logotipo da PMAM, circulado em 1991 |
A experiência exibiu à corporação o
elevado proveito em enviar seus candidatos a oficial para outras coirmãs,
possuidoras de Academia. Tornou-se conveniente para ambos os lados, e a força
amazonense aproveitou a ocasião. Em frente, com a instalação do Regime Militar
(1964-85), que criou a IGPM (Inspetoria Geral das Polícias Militares) para
gerenciar as polícias estaduais, em 1969, esse intercâmbio expandiu-se, alargou-se
tanto que onde houvesse escola, certamente, havia amazonenses. Espalharam-se pelo
país inteiro e, tem mais, até pelo continente, pois uma turma concluiu o CFO
nos Carabineros do Chile (1985).