O início da atividade jornalística da jovem Etelvina
Norma Garcia, hoje conhecida escritora e editora de livros sobre a história do
Amazonas, ocorreu em A Crítica. De
sua responsabilidade, a coluna “Vinte e quatro horas na sua profissão”
entrevistou algumas personalidades.
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Recorte de A Crítica, 17 junho 1958 |
Transcrevo parte da entrevista que ela produziu com o saudoso
padre Bernardo Lindoso, pertencente ao clero amazonense, e com se verá atuando
na JOC (Juventude Operária Católica), parte da Ação Católica. Bernardo era irmão
de outro sacerdote, Moisés Lindoso, e do ex-governador José Lindoso (1979-82),
do qual foi secretário de Estado. Ao participar do governo, Bernardo já havia “deixado
a batina”, ou seja, abandonado o sacerdócio.
A foto que ilustra o texto assinala que se trata de Moisés
Lindoso. Não, era mesmo Bernardo nos verdes anos de vida.
VINTE E QUATRO HORAS NA SUA PROFISSÃO
Brasil sofre com problemas do operariado
Texto de Etelvina Norma Garcia (*)
Há alguns dias, no desempenho de suas atribuições de
assistente eclesiástico da Juventude Operária Católica (Região Norte),
encontra-se em nossa capital o sacerdote amazonense Pe. Bernardo Lindoso, que
veio até Manaus a fim de se avistar com o novo metropolita, D. João de Souza
Lima.
O Pe. Bernardo Lindoso tem sobre seus ombros o mister árduo
de assistir a mocidade operária nos estados do Pará, Amazonas e Maranhão, bem
como nos Territórios do Acre, Guaporé, Amapá e Rio Branco, sendo de se
salientar que acaba de participar de duas semanas nacionais da juventude trabalhadora,
realizadas ambas no Distrito Federal, e nas quais foram debatidos e
equacionados os problemas mais graves e mais complexos da massa operária
constatados pelos militantes jocistas no trabalho árduo de todo dia, quando a mocidade das oficinas, dos
escritórios, das fabricas principalmente, se debate com dificuldades infindas,
advindas do meio em que vivem.
A reportagem do “melhor jornal da cidade”, em conversa com
o Pe. Bernardo Lindoso, que se pôs a par da intensidade com que se processa em
todo território nacional esse movimento firmado à base da compreensão e da
fraternidade, engrossado ainda pela mística da ação, que lhe imprime um caráter
humano e cristão, realizando no sentido mais amplo e mais profundo, a igreja
missionária no âmbito do laicato, saindo-se para o setor operário.
Apoiada (e abençoada) pelo papa Pio XII, a Ação Católica,
surgida com a JOC, nos tempos de Pio XI, teve em monsenhor Cardjin a sua mola
propulsora, como advindo de uma técnica de ação intensificada e aprofundada,
descendo às minúcias dos problemas que afetam a massa e se refletem na elite,
buscando suas raízes e procurando colocar um “agir” que se coadune com a razão de
ser da coisa e atue decisivamente.
PROBLEMA DO ADOLESCENTE
Falando à reportagem e dizendo do que foram as semanas da
juventude operária católica, realizadas de 4 a 13 de maio (setor feminino) e de
13 a 22 do mesmo mês (setor masculino) no Rio de Janeiro, com a participação de
todos os dirigentes e assistentes eclesiásticos das seis regiões brasileiras
(Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Leste, Sul e Extremo Sul) o Pe. Bernardo Lindoso declarou que através de um trabalho meticuloso de
penetração da ação basilar da JOC nos diversos pontos do país, levando-se em
conta as dificuldades que o movimento encontra para uma ação efetiva, o
problema do adolescente desorientado foi constatado nesse encontro como um dos
mais angustiantes para a massa operária.
“Jovens obrigados pelas injunções da vida de família, com
as dificuldades inerentes ao tempo a deixar os estudos em idade precoce,
lançando-se no campo do emprego, sem uma compensação satisfatória, monetária, e
socialmente falando, fazendo jus a um salário insignificante que não dá margem
a que o individuo supra as suas necessidades mais elementares. Cada ano, em
todo o mundo (deixando-se de parte o problema nacional e abrindo-se as janelas
para todo o globo) uma média de 20 milhões de estudantes são forçados a deixar
a escola em busca de trabalho para garantir o próprio sustento. No Brasil (e
atestam os inquéritos e as estatísticas), uma média de 400 mil jovens deixam a
vida de estudante, passando a enfrentar as agruras e as dificuldades infindas
das fábricas, das oficinas, sem poderem sequer almejar um âmbito de vida mais
confortável”.
CARDJIN
E A JOC
Muito se fala e muito se ouve falar de ação católica. À
primeira vista, a impressão que se tem é a de que seja uma associação religiosa
como tantas outras que se espalham pelas paróquias, escudadas na fé, e
amparadas pela direção da igreja. No entanto, se descermos às minúcias, vamos
encontrar a Ação Católica e todas as suas ramificações com a participação ativa
do laicato na hierarquia eclesiástica, como uma ação decisiva em todos os
setores da vida humana, através dos militantes de suas fileiras. Encararmos mesmo
a Ação Católica como uma ação social ampla que se firma na mística cristã.
Abordamos então o assistente regional da JOC sobre as raízes
do movimento ao que nos adiantou: “A Ação Católica nasceu como não se
desconhece, com a própria JOC. Mons. Cardjin a idealizou, lançando-lhe as
sementes por volta de 1914, sendo que somente em 1925 foi fundada a JOC, na Bélgica,
tendo apoio do papa Pio XI, seu grande incentivador.
A penetração maior da JOC, no entanto, deu-se depois da
última guerra mundial. Cardjin, preso durante a guerra, taxado de comunista,
tem tido uma vida eivada de grandes tormentos, que é, ao mesmo tempo, um poema
de idealismo e de persistência.
Atualmente é assistente do Bureau Internacional da JOC,
donde promanam as diretrizes do movimento no âmbito universal.
(*) A Crítica, 17 de junho de 1958 (quando eu completava
12 anos)