O ACIDENTE Renato Mendonça
O pessoal retomava mais cedo do que de costume de outra Plataforma de Produção de Gás, localizada aqui no litoral do Rio Grande do Norte. Para ir até lá, só mesmo de barco. É como se fosse uma pequena ilhota de ferro no meio do oceano; também, como se fosse um sobradinho muito pequeno, composto só de quarto e sala. Os recursos de habitação são mínimos, apenas um minúsculo banheiro para as necessidades fisiológicas de evacuar, já que para fazer xixi ninguém usa. Como só têm homens trabalhando por lá, é mais fácil mijar direto no oceano Atlântico.
O pessoal vai de manhã,
trabalha o dia todo e retoma à tarde, o mais tarde possível que as condições de
mar permitem, normalmente às quatro da tarde. O transbordo matinal, a partir da
Plataforma Central, onde ficamos albergados, é feito usando-se uma cesta — que comporta
até quatro passageiros em pé —, que é içada pelo guindaste e depositada no
convés de uma lancha. À tarde, no retorno dos trabalhadores, a operação é inversa,
resgatando-os do barco.
Nessas plataformas pequenas,
que fazem parte dos campos de Pescada e Arabaiana, esse transbordo é feito usando-se
o "pulo do Tarzan", tanto para embarcar como para desembarcar. Explico:
o barco aproxima-se ao máximo do atracadouro, o "peão" pega uma corda,
cheia de nós, e se lança para alcançar seu objetivo. Nunca, nesses meses todos,
ninguém soltou a corda. Parece até que Deus os conduz e dá força a esses
destemidos peões. Vejo, com admiração, que gordos ou magros tem a mesma vocação
para o pulo e nunca erram, como se uma força invisível os empurrasse.
A rotina deixa as pessoas
experientes e confiantes. Tenho regozijo em ver que operários velhos, novos,
carecas ou grisalhos adquirem o mesmo padrão depois de algum tempo. Quando
sinto que alguém ainda não tem muita confiança, procuro elogiar depois de cada
pulo. É uma forma singular de motivar e melhorar a carga psicológica para o
próximo salto. É esse, talvez, o momento mais crítico e perigoso das atividades
diárias.
Hoje, no retorno, com mar
agitado, ao ser içado com a cesta, um dos quatro passageiros foi jogado contra
a balaustrada — espécie de corrimão feito com tubo grosso, que cerca o barco — da lancha, bateu com as costas e caiu no piso do convés. Eu estava
no alto, próximo ao guindaste que fazia o içamento e presenciei a cena; momentos
antes, justamente o que se machucou acenou pra mim. Parecia um aviso.
Por um momento havia
pensado em parar a manobra porque o mar estava bravo e a embarcação tinha um
dos motores avariados. Mas, vacilei, e nesse segundo de hesitação o acidente
aconteceu. O acidentado foi retirado pelo guindaste da outra plataforma, anexa
à nossa, que opera como auxiliar de sondagem, usando a maca da enfermaria e
levado, como emergência, de helicóptero até Guamaré e daí até Natal em
ambulância da Petrobrás.
À noite, fiquei
sabendo que nada de mais grave tinha lhe acontecido. Nenhuma fratura, apenas
luxação. Josimar Rebouças — um velho soldador, aposentado, que retomou
ao trabalho — passa bem.
Graças a Deus!
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