Envolvido com os Estudos sobre a literatura amazonense, de Tenório Telles, retornei ao meu “surrão”, como aprendi com Farias de Carvalho. Nele encontrei o poema aqui compartilhado, de Luiz Bacellar, sobre o qual consultei ao poeta Zemaria Pinto, que me assegurou se tratar de uma obra inédita do saudoso autor de Frauta de Barro.
Bacellar, em pé, 1983 |
Nota: no original, como se lê, está A GALO, no entanto, a incorreção presumo cabe à falha de revisão ou outra iniquidade existente nas oficinas.
Luiz Bacellar
(na volta de Áureo Melo
à terra manauara)
Eu hoje
tomei emprestada a pluma
de Neruda,
voltei aos tempos do paganismo
e sacrifiquei
um galo ao deus Apolo.
Não a Apolo retornei
Mas a ti Sol,
próton do infinito,
fonte da vida
que me fizeste nascer
na Terra.
Por ordem de Meu Senhor
era um galo
guerreiro como eu, guerreiro e cantador.
Tinha um peito de oiro
macio e brilhante,
a cauda de esmeralda,
a crista do mais rubro
coral.
Joia de plumas
de macheza
e canto,
grande produtor de ovos
e de alguns frangos,
multidões de frangas.
Ao sacrificá-lo
sacrifiquei-lhe o canto
porque sou cantor
do meu Senhor.
Mas também sacrifiquei-lhe a vida
porque devo a vida
ao meu Senhor.
Senti-lhes os estertores
nas minhas mãos implacáveis
quando torci-lhe a cabeça
para separá-la do corpo,
depois rompi-lhe o peito
e arranquei-lhe o coração
ainda palpitante,
e ofertei-o na palma de minha mão direita
ao Sol,
fonte da vida,
da Alegria,
da Saúde.
(Sacrifiquei o galo
como o ritual
litúrgico
dos flâmines latinos
de Apolo).
Quando as últimos palpitações
do seu pequeno coração
cessaram
na palma imóvel da minha mão
cobri o rosto com ambas
para que o meu rosto
se tingisse de atinjo
como o do Sol, e o Sol me reconhecesse
como seu filho.
Sacrifiquei o galo
com lágrimas nos olhos.
Que me perdoe o meu Senhor
que me proibiu
sacrifícios cruentos.
Pagaste o teu galo a Asclépios.
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