Prossigo na
postagem do material do geógrafo Ab’Sáber, sobre o crescimento da cidade de
Manaus. Recordo que o Correio do Norte era
o quinzenário mantido pelo casal Anísio e Lindalva Mello, em São Paulo.
O crescimento da
cidade de São José da Barra
Correio do Norte,
São Paulo, 1ª quinzena setembro
1959.
Mário Ypiranga |
A estatística mais antiga que possuímos do lugarejo remonta a 1774: o Lugar da Barra possuía a esse tempo 220 habitantes, contando-se os soldados da guarnição e os índios. Uma estatística de 1788 acusa 256 habitantes, distribuídos da seguinte forma: 34 brancos, 220 índios e dois escravos negros. Como observa Mário Ypiranga Monteiro, cujas informações nos estão guiando muito de perto, a lei de 6 de junho de 1755 sustou a escravidão do índio, e, ao mesmo tempo, abriu as portas aos primeiros escravos negros, através de uma corrente extremamente reduzida.
Os dados estatísticos de Alexandre Rodrigues Ferreira, em relação ao ano de 1786, mostram o crescimento lentíssimo da população local: havia por esse tempo apenas 301 habitantes (47 brancos, 243 índios e 11 negros), repartidos por 40 habitações. Irrisória, portanto, a população do aldeamento, um século após sua fundação.
Barbosa Rodrigues |
Produzia-se de tudo um pouco na região, visando-se o auto-abastecimento: milho, café, algodão, tabaco, arroz e castanha. Fabricava-se farinha, em relativa abundância; teciam-se redes, as "moqueiras" tradicionais; praticava-se uma criação rudimentar e ínfima (20 cabeças de gado, em 1786). A tartaruga já interessava ao homem da região, quer como alimento, quer como fonte de produção de manteiga; cita-se mesmo que os primeiros e poucos escravos negros especializaram-se no fabrico da manteiga de tartaruga.
Em 1783, o Forte de São José da Barra já era uma sombra inútil dos tempos iniciais da dominação portuguesa na Amazônia. Desaparecida aquela tensão militar dos primeiros dias e assegurado o domínio português por quase toda a Amazônia, as modestas bases intermediárias perderam sua função. Daí o fato do Forte da Barra ter sido desarmado, por volta de 1783, e dele nada ter restado na
paisagem urbana.
A ação administrativa de Lobo D’Almada em relação a São José da Barra marcou um verdadeiro período de evolução para o lugarejo. Em poucos anos fez-se mais do que em todo o primeiro século de vida do povoado. Construiu-se o Palácio dos Governadores,
multiplicaram-se as iniciativas úteis e práticas para melhor abastecer a região em produtos de uso corrente. Instalaram-se uma pequena fábrica de tecidos de algodão, uma cordoaria, uma olaria, uma padaria, uma fábrica de velas e outra de redes. Fez-se um pequeno estaleiro
para construção de canoas
e barcos; estabeleceu-se um depósito de pólvora. Ampliou-se a guarnição
local para 300 homens. Enfim, Lobo D’Almada foi para Manaus, guardadas as devidas proporções,
uma espécie daquilo que o Príncipe Regente seria anos mais tarde, para o cidade do Rio
de Janeiro.
Em
1804, a vila da Barra do
Rio Negra era feita capital da Capitania do Rio Negro, depois Província do Amazonas, que se separou do Pará
em 1852. Foi, portanto, apenas no alvorecer do século XIX que o Lugar
da Barra transformou-se em capital adquirindo
pela primeira
vez funções administrativas
mais ponderáveis. Esse aspecto
tardio da aquisição das funções
de capital tem muito a
ver com a história do crescimento da cidade.
Uma
estatística de 1839 acusa 4.188 almas para a população da pequenina capital, além da presença de 379 escravos. Outrora, para um reduzido
número de indivíduos livres, havia uma pequena
massa de escravos; aos poucos,
a inversão feliz
se operou. Por essa época, entretanto,
o Palácio dos Governadores era o mesmo edifício tosco, coberto
de palha, mandado construir 50 anos antes por Lobo D’Almada. O número de
moradias da cidade não atingia a meio milheiro.
Vila da Barra de São José do Rio Negro (1848) |
Quando
o casal Agassiz visitou a cidadezinha,
em 1865, possuía ela
todos os defeitos urbanos e sociais
de um povoado amazônico,
minúsculo e segregado, nascido e crescido de um aldeamento de índios e à sombra de uma rústica fortaleza de soldados-colonos. Daí
a observação irônica de Elizabeth Agassiz: (1) "Que poderei dizer de
Manaus? E' uma pequena reunião de casas, a metade das quais prestes a cair em ruinas, e não se pode deixar de sorrir ao ver os castelos oscilantes decorados com o nome de edifícios públicos...”
minúsculo e segregado, nascido e crescido de um aldeamento de índios e à sombra de uma rústica fortaleza de soldados-colonos. Daí
a observação irônica de Elizabeth Agassiz: (1) "Que poderei dizer de
Manaus? E' uma pequena reunião de casas, a metade das quais prestes a cair em ruinas, e não se pode deixar de sorrir ao ver os castelos oscilantes decorados com o nome de edifícios públicos...”
Manaus,
a esse tempo, era sobretudo uma cidade índia,
onde o população de origem índia e os resíduos de costumes
e atividades do índio, eram um fato
na movimentação da vida urbana: apenas os índios pareciam ter uma vida mais livre e agradável, em face ao clima e do ambiente físico. A iluminação pública
do lugarejo, desde havia algum tempo, era feita por um sistema de lampiões alimentados por manteiga de tartaruga, óleo de peixe-boi ou óleo de mamona. Nada de mais amazônico poderia ser
imaginado do que esse fato.
À
medida que a população urbana crescia, as condições de abastecimento alimentar tornavam-se mais difíceis e precárias. Quando Henry
Bates passou pela Barra
do Rio Negro, pela primeira vez, em 1850, anotou que a cidade "sofria
de escassez crônica dos gêneros alimentícios mais necessários." Por
ocasião de sua volta
à cidade,
em 1856, persistia o mesmo problema. De passagem, lembramos que foi por essa época, entre
as duas estadias do naturalista na cidade,
que a mesma adquiriu o seu atual nome de Manaus (1852).
AGASSIZ, Luiz e AGASSIZ, Elizabeth Cary. Viagem ao Brasil (1865-1866), tradução de Edgar Süssekind de Mendonça. São Paulo: Comp. Editora Nacional, 1938, pp. 247-248.
No próximo número:
MANAUS E SEU CRESCIMENTO MODERNO.
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