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sábado, dezembro 28, 2019

DESPEDIDA DO "CHÁ DO ARMANDO"

Convite expedido

Aos 91 anos, em junho de 2017, faleceu o fundador, entre outros títulos bem mais relevantes, do Chá do Armando, o acadêmico Armando de Menezes. Quatro meses depois, na sexta-feira, 13, a Academia Amazonense de Letras promoveu um Sarau em homenagem ao ex-presidente daquele sodalício.

A direção deste evento coube ao também acadêmico Zemaria Pinto, que me escalou para relembrar a caminhada do Chá do Armando. Essa página, aqui postada, foi lida na ocasião.


Último Chá do Armando

Há pessoas que costumam acenar às estrelas quando alguém pergunta pelo seu ente querido morto. Nesse sentido, a caminho deste convescote literário, passei o olhar pelo firmamento e, acreditem, o venturoso Armando de Menezes me sorriu. Ao menos, foi isso que percebi quando certa estrela paidégua deu-me aquela piscadela.
Voltei a sentir aquele beijo fraterno com o qual o Dr. Armando saudava seus pupilos, quando estes adentravam ao salão onde era consumido o Chá que lhe emprestou o nome: Chá do Armando. Esse afago ocorria com todos, mas eu me considerava privilegiado, porque, por um momento, eu me sentia seu filho, acariciado, incentivado, porém, oportunamente ralhado. Assim, ecoando o cancioneiro popular, “mas que seu filho, eu me tornei seu fã”.
O Chá do Armando foi esse movimento lítero-musical-etilista, que nunca foi anônimo. Começou no IGHA, no início do século, quando esta agremiação se empenhava em recolocar de pé a Casa de Bernardo Ramos. Eu estava lá, era o vice-presidente, e cuidava do layout e da acomodação do acervo. Os recursos financeiros existentes permitiram festejos conduzidos pelo tesoureiro Humberto Figliuolo, homem de boa boca e do melhor gosto, tanto que promoveu suntuosos chás acadêmicos.
No entanto, o dinheiro escasseou. Razão pela qual passamos a reunião para o térreo, quando por obra e soldo de Armando de Menezes surgiu à mesa, ora o Red ora o Black de paladar quase unanime. Ali, os confrades discutiam o avanço da Casa de Bernardo Ramos, os entreveros políticos e fechavam a sessão marcando o próximo encontro. Sempre às sextas, encerrando a tarde, abrindo a noite.
Logomarca da associação
Todavia, sempre há um desencontro. Nesse fugaz desacordo, a reunião mudou de CEP, abrigando-se na Casa de Adriano Jorge ou ainda, a Academia Amazonense de Letras. Ajeitamo-nos na secretaria, espaço que também servia de biblioteca. Era presidente da agremiação o poeta Max Carphentier que, ao anunciar o Chá do Armando, batizou esse divertimento e lhe crismou a notoriedade. O inesperado selo carphentiano pegou, e serviu de logomarca por mais de uma década.
O espaço diminuto e impróprio para tal tipo de afluência obrigou, entretanto, nova mudança, que foi decididamente benfazeja. Quando nos abrigou o falecido multiartista Anísio Mello em sua mansão provincial. A despeito da reduzida comodidade, tornou-se o emblema desse encontro. Como me agradava rever, a cada sexta-feira, as telas de Anísio. Chegamos a estabelecer a musa do Chá (a tela retratava uma donzela desnuda, em ambiente amazônico), cujo quadro encontra-se hoje em “lugar incerto e não sabido”.
Naquela mesa de trabalho, festejamos os 80 anos de Armando, com uma esmerada tartarugada, brinde do jornalista Simão Pessoa. A esposa do mecenas, Dona Ivete, esteve presente enlevando o festim. Esposas e namoradas de convivas estiveram no jantar.
Como a vida humana tem “prazo de validade”, chegou o dia do Anísio Mello. Ao curso de um largo período de convalescença, em abril de 2010, Anísio Mello passou à imortalidade. Em consequência, o Chá teve que buscar nova instalação.
Não sei se pela ordem, mas o Chá passou pelo Sebão do Diniz (do Antônio, sobrinho do acadêmico Almir Diniz), ali na rua Joaquim Sarmento. Cercados de livros e de importunos flanelinhas, curtimos algumas sextas-feiras. Então, experimentamos a Lanchonete Pina, na avenida Joaquim Nabuco. A passagem acola durou pouquíssimo, pois a escada que levava os convidados ao pátio superior e o cardápio “salgado” do português Chico Mendes espantaram a tribo.
Sergio Pereira, Almir Diniz, Armando de Menezes e
Zemaria Pinto (a partir da esq.), no "Sebão" do Diniz.
Na mesma calçada da mesma avenida, fomos nos abrigar no Salão dos Belos Quadros, uma dependência da Universidade Federal ocupada por terceiros. Alguns transtornos depois, veio, então, a sala da presidência do Ideal Clube, por deferência do presidente Humberto Figliuolo, até que aconteceu a derradeira mudança, novamente para o citado prédio da Ufam.
O Chá ocupou o Ideal por um bom tempo, até que os males da idade atingissem ao patrono do movimento. Armando de Menezes foi diminuindo a presença, até que uma prescrição médica vetou seu comparecimento, impedindo de ver seus pupilos. E a mesa, sem ele, doía tanto. Ainda assim, ele os mantinha confortados com os destilados e outros petiscos, mas exigia saber da presença dos seguidores e dos debates acontecidos. Para tanto, seguia para ele uma espécie de Ata da sessão. (segue na próxima postagem)

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