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quinta-feira, dezembro 05, 2019

EXPEDIÇÃO PADRE CALLERI


O desaparecimento da expedição padre Calleri marcou com angústia a cidade naquele final de 1968, portanto, há mais de meio século. A amargura somente se atenuou quando os esquifes, pequenos caixões com os restos mortais dos expedicionários, foram alinhados à frente do altar-mor da Matriz de Nossa Senhora da Conceição, para a encomendação dos mortos. Eu fui presente naquele cerimonial.
Padre Giovanni Calleri (1934-68)
Bastante se falou sobre a aventura do padre italiano Giovanni Calleri, nascido em 1934, missionário da Consolata, servindo na então prelazia de Roraima. Apesar das consequências, a rodovia BR174 foi concluída, e hoje serve àquele Estado do extremo Norte. O sacerdote não foi esquecido: em Manaus, encontra-se a Escola Municipal Padre Calleri, e, em Boa Vista, encontram-se seus restos mortais, sob o altar da igreja Matriz.
O texto aqui compartilhado foi sacado do matutino Jornal do Commercio (1º novembro 1969), escrito por uma freira, que analisa a conduta do sacerdote do ponto de vista religioso.
 
Artigo sobre o padre Calleri - Jornal do Commercio, 1º nov. 1969
  
Há quase um ano, chegava eu a Manaus. Eram dias de expectativa e de dor, motivados pelo misterioso silêncio que, há quase três semanas, envolvera a expedição de Padre Calleri. Hoje, embora distante, recordo Manaus vivendo aqueles dias... e, depois, enlutada, chorando o desfecho trágico – a morte dos expedicionários!
Tudo eram lágrimas porque, humanamente falando, tudo fracassara e de todas as esperanças acalentadas, de todos os projetos e sonhos, restaram, simplesmente, aquelas pequenas urnas, que, no seu violáceo, pareciam enfeixar todas as amarguras da orfandade e da viuvez, da solidão e da saudade que cruciavam os parentes e amigos...
Transcorre, hoje, um ano. Agora, já libertos daquela carga imensa de emotividade, torna-se menos difícil buscar uma resposta às perguntas que nos ocorreram naqueles dias. Não nos referimos às respostas que a história – “mestra da verdade” — certamente no-las dará. Muitos “porquês” devem ser respondidos por quem nos deve essas respostas...
O que, hoje, quereríamos compreender, à luz da fé e da reflexão, é o sentido deste “fracasso”: um padre jovem, cheio de vida, vibrando de ideal, abraça uma missão tão árdua, com a alegria de um garoto que escala as montanhas; com o entusiasmo  de um verdadeiro herói, lança-se nas matas, no desconhecido. Tal era a sua vontade de pacificar, que não temeu a adversidade, embora ela o rondasse... Mas, ele fracassou, morreu...
Como? Quando, cristãmente, poderíamos afirmar que Padre Calleri fracassou? A palavra fracasso não pode coexistir com uma visão de fé, porque a semente quando morre é que germina, e, se não germina, não frutifica (Jo. 12:24). Ninguém fracassa, senão aquele que se opõe ao Bem, porquant0 o homem só se realiza quando adere à Verdade, quando opta pelos valores que sua consciência hierarquiza. A morte do Padre Calleri foi o coroamento de sua trajetória ascensional ao encontro do Sumo Bem, através dos irmãos pelos quais, livremente, entregou a própria vida, a fim de que eles conhecessem ao Pai.
Desde pequenino, adestrara-se para o heroísmo e outra coisa não foi a sua vida senão uma caminhada para o martírio. Porque ele muito amou foi capaz de entregar-se ao Ministério, à Missão, à morte; e, assim, parecendo autodestruir-se como homem, como cidadão e como ser, outra coisa ele não fez, senão galgar o caminho da verdadeira Vida (Jo. 12:25).
O sentido da morte está interrelacionado com o sentido que damos à essa vida. Se a vida é uma triste experiencia que nos desgasta cada dia; se vivemos receando que se extinga, (ilegível no original). Mas, se viver é encaminhar-se para a plenitude, plenificando-nos nela, se viver é crer numa transcendência vertical, então o morrer é engolfar-se nesta Plenitude, transcendendo a nós mesmos para nos abismarmos em Deus.
 Hoje, os que não creem, devem tristemente recordar um fracasso.  Mas, nós os que cremos com um olhar límpido, fitamos o espaço infinito protestando crer no sentido da morte daqueles que dão um profundo sentido à sua vida.
Padre Calleri não fracassou: a sua vida germinará, qual semente fecunda e, pela comunhão dos Santos, nós mesmos usufruímos dessa germinação. 

2 comentários:

  1. Belo texto. Fez atiçar a minha curiosidade a respeito da expedição do Padre Calleri, seus objetivos e o triste destino.

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  2. Eu estudei nessa escola citada, lembrei do nome da mesma e decidi pesquisar sobre o Padre Calleri, não me arrependi nem um pouco.

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