Artes do futebol amazonense são aqui apresentadas por um lembrado
cronista esportivo. Leal da Cunha conta-nos duas histórias, e, como assegura
o próprio autor, a primeira vem travestida com as lendas recolhidas em nossos beiradões.
A segunda é verdadeira. Ainda há quem a confirme, por ter participado do
acontecimento. Não assisti ao jogo (1962), mas encontrei no quartel da Praça da
Polícia (1966) alguns personagens, tanto jogador do quadro nacionalino quanto policiais
presos.
Futebol com doze
Pode até parecer mentira, brincadeira ou gozação, mas o
certo é que o Juca Zangão conta essa passagem no futebol como verdadeira e real.
Desenrolada no interior do Estado.
Jogavam dois times da mesma Liga. Dois times de grandes torcidas
e dirigidos por gente muito importante. Era uma decisão de campeonato promovida
pela tal Liga. Tão importante que para dirigi-lo, à sua arbitragem, foi convidado um juiz (árbitro) do município vizinho.
À hora do jogo todos estavam a postos. Jogadores, juízes e bandeirinhas.
Foi dado início ao jogo, e, de repente, o capitão de uma das equipes se dirigiu
ao árbitro para reclamar do time adversário, por quanto estava jogando com doze
elementos em campo, o que não é permitido pela regra de futebol.
O juiz se dirigiu ao jogador que estava protestando contra
aquele absurdo e esclareceu: - Olha aqui, meu filho: três jogadores foram escalados pelo juiz de Direito; três, pelo promotor; mais três jogadores, pelo prefeito, e ainda mais três, pelo padre paroquial. Logo o que é que jogar onze elementos num time.
- Ora, rapaz, não me venha com esse negócio de regra ou de Lei! Há tanta coisa que a Lei proíbe e, no entanto, muita coisa também se prática ou se comete em desrespeito à lei. Deixe isso pra lá, amigo. Nós vivemos num país que "manda quem pode e obedece a Lei quem quer ou é leso!” Por isso, aconselho que você coloque mais um jogador no seu time pra ficar tudo igual, isto é, doze contra doze.
E, assim foi dito e cumprido, sorte que tudo terminou bem,
não havendo mortos nem feridos.
O estádio do Parque Amazonense em demolição,
vendo-se apenas a o prédio coupado pelos cronistas,
1991.
Parque Amazonense
Pois bem meus amigos, em Manaus, em 1962, aconteceu no
Parque Amazonense, um fato também pitoresco e que pode dissipar a dúvida de
quem achou pouco confiável o que antes foi dito.
A regra de futebol é clara quando diz que o jogador expulso
de campo NÃO pode ser substituído (grifo nosso). Rionegrinos e nacionalinos decidiam
no velho Parque o título de campeão amazonense de 1962. O meu brilhante amigo
Josué Claudio de Souza era quem mandava no time rionegrino, enquanto o Dr. Plínio
Ramos Coelho, à época governador do Estado, era o presidente do Nacional.
O Parque estava cheio de gente. Na partida preliminar os
juvenis nacionalinos abriram uma porrada com os soldados da Polícia Militar. Alguns
“garotos” tomaram uma cacetada. O Dr. Plínio Coelho não gostou de a sua polícia
bater nos seus meninos e, ato contínuo, ordenou a prisão de um dos soldados que
ali estavam para o quartel.
Porém, o negócio mais pai-d’égua foi no jogo principal. Aos
16 minutos do primeiro tempo, o arbitro expulsou o jogador Lacinha, que era do time
nacionalino, consequentemente, o time do governador. Então, diante de toda essa
embuança, criou- se aquele ambiente
de sai e não sai, com o tempo desenrolando e jogo paralisado, e apenas 16
minutos haviam sido jogados.
A essa altura do campeonato sempre aparece um "profeta",
desse tipo como político demagogo que se diz defensor do povo. Foi chegando
perto os conflitantes e sempre dizendo: "o povo não pode ser prejudicado;
o povo pagou para assistir 90 minutos de jogo e não 16 minutos. E agora ninguém
pode devolver o dinheiro, porque as entradas não tinham o canhoto".
O pessoal das emissoras de rádio queria saber o que o árbitro dizia. E, sua Sia.
não se fazia de rogado: o jogador Lacinha está Expulso de campo. Algumas
pessoas falavam: cuidado, "seu" árbitro, o Sr. está expulsando um
jogador do time do governador!...
E, aquela figura de político de campo de futebol voltava
atacar: "o povo não pode ser prejudicado". Ele dava a entender que o
povo
não podia ser roubado como se fosse aquela a primeira vez que o povo era
roubado.
Conversa vai, conversa vem, e, depois de muito jogo de
palavras acordaram as partes litigantes que, para o “bem do povo e a felicidade
geral da Nação”, o jogador ali expulso de campo poderia ser substituído. E
assim foi cumprido. Saiu o Lacinha e entrou o Luizinho. O jogo também chegou ao seu final com a vitória dos rionegrinos por
2x1, sagrando-se, portanto, o
campeão da cidade.
Assim meus amigos, isto é, aqueles que duvidaram que um
time de futebol não pode ter doze jogadores em campo, assistiram diante desses
fatos que um jogador expulso de campo foi substituído por outro jogador de sua
equipe, é claro.
No entanto, se alguém duvidar do que aqui escrevemos
podem perguntar ao Baú Velho, do Carlos Zamith, do meu amigo CIóvis Lemos de
Aguiar e do velho jornalista Josué Claudio de Souza.
(*)
O texto foi
publicado em A Crítica, em 17 de novembro
de 1991
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