CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

quarta-feira, junho 17, 2020

MEUS RISONHOS 74 JUNHOS

 Acontecem hoje, no meio dessa ressaca sanitária. E diante da impossibilidade de uma “romaria” de familiares e de amigos, pensei em montar um painel, sem cogitar como. 

Roberto, ontem
Encarava esse dilema, quando logo pela manhã fui despertado pela mensagem de meu irmão Renato. Antes mesmo da leitura já descartei o painel, decidi que ela seria o carro-chefe deste flashback. Após a leitura, não deu outra: uma intensa emoção me tocou, tanto que as lágrimas afluíram. Desculpei-me, todavia, aprovando que coração de idoso (de velho) se torna bem maleável.
Além do texto fraterno, publico algumas fotos. Pessoais e da nossa turma (1966-67) na Polícia Militar do estado, para observar de que “éramos todos jovens”. Não deixa de ser o painel imaginado.


Mano,
Renato Mendonça
Nestes seus longos anos de vida, você me deixou muitas lições. Algumas aprendi, outras não. Faltou-me o tino e o senso de observação, às vezes. 
Mas, não me faltou nunca, nem nunca faltará a admiração que tenho por você, todas as atitudes, os gestos fraternos ficarão guardados na minha memória, até que o Alzheimer venha me roubar.
E, nesta data especial, desejo a você mais muitos anos de vida com saúde, muitos projetos realizados e muita luz em seu coração.

Um grande abraço, deste seu irmão-fã,
Renato Mendonça



SORO CASEIRO
17/06/2020

Beto chegou em casa sorrateiro numa tarde de calor. Ainda não era o Roberto, era um menino também, o irmão mais velho que sumia, de vez em quando, enquanto estávamos distraídos entre nossos livros e cadernos, entre caminhadas ao Grupo Escolar Municipal, ou entre os deveres de filhos zelosos com o quintal e com a criação. Ele já frequentava o Seminário, pois fora extraído do seio familiar prematuramente. Todavia, nós — eu e meu irmão, Antônio — não atinávamos para a sua fuga intempestiva, apenas sentíamos sua falta completando a família, como um precursor filial, abrindo picadas na estrada da vida.
Estávamos aquartelados na casa do Beco São José, ao lado do Cine Vitória, nos Educandos da nossa antiga e bucólica Manaus. E nosso pequeno universo lúdico estava restrito ao nosso quintal; raras vezes, aos domingos, escoltados pelo pai, um banho nas águas escuras do Rio Negro. Assim que era anunciado, saíamos correndo até o limite da casa 303 da av. Leopoldo Peres. Seu Manoel Rosseti, da varanda do seu chalé, ficava a postos, colhendo a brisa do domingo e nos vigiando com seu olhar de preocupação. Impacientes, aguardávamos a presença de nosso pai, para atravessar a rua e encarar logo a descida íngreme pela encosta escarpada da margem, que exigia agilidade e destreza, até alcançar uns troncos de madeira armazenados longe de palafitas. Os troncos eram como as paredes de uma “piscina da natureza”, e nos permitia nadar com suposta segurança. E de lá, o cheiro do rio, misturado ao do sabonete, trazíamos impregnado no nosso corpo e na alma.
Roberto, visto pelo Marius Bell

Naquela tarde, o calor nos incentivava a fazer uma limonada, era o refresco mais prático de ser feito artesanalmente, com poucos recursos. Quando estava pronto, deixamos que cada um adoçasse à sua maneira. Beto se prontificou a adoçar os nossos. Deixamos por conta dele, sem atentar para a peraltice que arquitetava sua mente. Por distração, não vimos que ele colocou um pouco de sal, e não açúcar nos nossos. Simultaneamente, sorvemos o primeiro gole com avidez. “Putz, salgado!” — falamos juntos.
Beto ria, ficamos fulos (chateados). Mas, logo depois rimos como crianças, rimos de mais uma traquinagem comum entre irmãos. Ficamos com pena de jogar fora o que sobrou nos copos. E concordamos que poderíamos recolocar na jarra com o restante, e adoçar completamente, usando mais açúcar. Fizemos isso. Adoçamos mais, e mais, porém não foi suficiente. O gosto final ficou salobro.
Embora sem o delicioso sabor, bebemos tudo, para evitar o desperdício. E, sem querer, acabamos inventando o “soro caseiro sabor limão”, que serve para curar disenteria, diarreia e outros males do estômago.
Velhos tempos. Minha memória me alerta: o ano era 1958.

fotos do arquivo pessoal


Efetuei a adição das fotos abaixo, no dia seguinte, por recomendação médica.



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