Antes
era Constantinópolis, agora Educandos, o bairro cercado pelo rio Negro e por igarapés.
Essa proximidade complica a urbanização e facilita a construção de barracos de
madeira e de outros materiais de fácil combustão, no espaço. Isso facilita a propagação
do fogo, tornando um incêndio no local de grandes proporções.
Foi
o que aconteceu anteontem 17, no início da noite, quando o fogaréu tomou conta
daquele território. Chamado os Bombeiros, estes tiveram as dificuldades dobradas
seja pela ausência de hidrantes no bairro, seja pelos becos e sub becos
estreitos impedindo a circulação das viaturas de salvamento ou de socorro de urgência.
Restou, pois, aos ameaçados pelas chamas retirar algum móvel e entrega-lo à
confiança de um vizinho.
Estava
escrevendo este texto quando o Jornal
Nacional (JN) registrou esta calamidade, ao vê-lo a emoção me apequenou. Tomou
conta de mim. A cena final (um cidadão desolado, com o enfeite natalino chamuscado
nas mãos, sem dizer palavras) foi mortífera.
Afinal,
eu nasci na rua Inácio Guimarães. A irmã que ainda mora no final do beco São
José (hoje rua Mar de Java) desesperou-se, convocou-me, fui ao local. No
entanto, somente consegui chegar junto a ela quando as forças de salvamento já
haviam controlado o incêndio. Para nossa felicidade, estava ela sã e salva. Curiosidade:
na semana anterior, estive na casa dela, quando fiz a foto que ilustra esta
postagem, ocasião em que conversamos sobre uma possível tragédia. Vê-se na foto
que as residências desaparecidas estão suspensas por arranjos de madeira tão singelos,
desengonçados, a desafiar imensos perigos. Sá podiam desaparecer, e com extrema
facilidade.
Beco do beco São José |
Não
há como culpar os homens do fogo pelo número de desabrigados. O fundamento encontra-se
no embaraço em operar naquele entrançado de vielas, de casas sobre casas, de residências
coletivas, de veículos estacionados, enfim, na desordem urbanística que vige
naquele trecho, e em outros tantos de Manaus. O último desastre semelhante
aconteceu no Bariri, aquele amontoado de casebres à beira de um igarapé, na
entrada do bairro de São Jorge.
O
quadro do JN me relembrou o livro que escrevi sobre os Bombeiros do Amazonas (2013). Voltei a este para rememorar um incêndio
idêntico que aconteceu no mesmo bairro há mais de 70 anos, mais precisamente em
setembro de 1945. Nele escrevi: de fato, 1945 se destacou pela violência dos
incêndios. A cidade ainda não se recuperara do desastre da Biblioteca Pública,
quando, em setembro, as paupérrimas edificações situadas nas ruas Panair (agora
coronel Paes Barreto) e Coronel Gonzaga, no bairro de Constantinópolis, hoje de
Educandos, foram pulverizadas. O relato pertence ao matutino dos Archer Pinto,
com "chamada" bem esclarecedora da adversidade: O pavoroso incêndio de Constantinópolis.
Recorte de O Jornal, 30 setembro 1945 |
“Quadro dantesco, de dor e desespero,
presenciou a nossa reportagem, durante o dia de ontem, no largo trecho do
bairro de Constantinópolis, assolado às últimas horas da manhã, por terrível
incêndio, que se iniciou no longo arruado de casas de palha, na estrada,
passando-se, depois, num salto espetacular de morte e destruição, para a rua
Vista Alegre, perpendicular ao seu ponto de origem, onde se verificou,
igualmente, uma destruição monstruosa de moradias de pobres trabalhadores,
sendo atingidos também pequenas casas de negócios ali estabelecidas.”
Uma
das casas de negócios, a Casa Suburbana,
de Luís e Helena Carvalho, sofreu o desastre. A família se recuperou,
transferindo depois o estabelecimento para a avenida Leopoldo Peres. Outro detalhe:
as dependências da Fábrica Labor, de
I.B. Sabbá, foram postas à disposição dos desabrigados. No atual desastre, o supermercado
Atacadão, sucedâneo no terreno da
Labor, igualmente colaborou. (leia a 2ª
parte)
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