CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

domingo, outubro 13, 2013

BOMBEIROS DA PMAM: CORONEL OSÓRIO (2)


Os Bombeiros do Amazonas foram comandados, entre fevereiro de 1978-79, pelo então tenente-coronel Osório Fonseca Neto. Leia o final da entrevista que este concedeu para o livro sobre a corporação. As indagações (em azul) são de minha autoria. 

Viatura APQ (Auto Pó Químico) em desfile do Sete de
Setembro, na av. Eduardo Ribeiro (1975)
Como você conheceu o serviço dos Bombeiros? Eu não conhecia os bombeiros. Assim, qual foi a minha atitude? Não palpitar em ações próprias de bombeiros. Comandar como militar, sem me envolver tecnicamente, por entender que eu não possuía competência para tanto. Aprendia com eles. Tanto que após cada atuação reunia o grupo envolvido, o comandante da operação e os demais. A equipe explanava as medidas tomadas e dava aula sobre os resultados.
Lá pelas tantas, em Manaus despontou o problema de abelhas africanas. O primeiro ataque que tive conhecimento ocorreu na Vila Militar da Cachoeirinha, perto do Hospital Militar do Exército.


Em que ano ocorreu? Em 1978. As abelhas “africanas” atacaram dois cachorros na residência de um oficial do Exército. Mataram os cães por asfixia. (...) os bombeiros foram acionados. Ninguém tinha experiência alguma com abelhas, ninguém sabia que fazer. Acreditando que já podia palpitar, opinei: “Vamos vestir um homem-rã ou o bombeiro que efetuar a operação com a roupa de mergulho”. Quero dizer, roupa de neoprene preta, a máscara contra gases, assim podia melhor respirar. A estratégia: o operador sobe a escada, tira parte do telhado onde as abelhas se aninham e, então, a gente acaba com elas!


Aconteceu, entretanto, verdadeiro desastre: as abelhas revestiram o corpo do bombeiro, milhares delas. Assim, ele virou enorme gorila. E pior, elas atacaram aos que apreciavam a operação, e todos foram atingidos. Por sorte, eu sofri duas ou três picadas, mesmo assim, fui acometido de enjoo, com febre e mal-estar. Quem estava lá sofreu com o veneno das “africanas”. Portanto, o meu palpite foi desastroso, porque a abelha africana é peçonhenta, venenosa e, dependendo da intensidade de picadas, pode matar.

Também isso é ser bombeiro. Nos quase dois anos que comandei a instituição, tive emoções fortíssimas. Meu coração bateu forte inúmeras vezes, quando vi, quando presenciei e, usando uma expressão atual, quando saquei o que esse povo fazia. Não era só apagar incêndio, ou como se dizia: “Pra apagar incêndio, basta chamar os bombeiros!”.


Alguma história peculiar? Houve, sim, uma história inesquecível. Ao lado da padaria Santo Antonio (hoje Cintia), próximo ao Hospital Militar, existem umas casas geminadas, em uma delas morava uma senhora obesa, bem gorda mesmo, acompanhada da filha. Quando saiam para compras na padaria, frequentemente esqueciam a chave da entrada, ora pelo lado de dentro, ora o vento batia a porta. Resultado: ficavam “presas” do lado de fora. Chamavam os bombeiros, que repetiam a mesma operação: armavam uma escada, subiam, passavam pela janela, abriam a porta e libertavam as “presas”. Ora, isso exigia levar a escada e repetir toda aquela manobra.

Decisão: fez-se uma cópia da chave da casa e, quando chamado, o bombeiro ia de motocicleta abrir a porta, claro, trazer a chave. Assim se resolveu parcialmente o problema das senhoras trancadas por fora, às vezes, trancadas em "trajes menores".

Lembra algum grande acidente de que, sendo comandante, participou? O maior acontecimento foi, sem dúvida, o incêndio da fábrica Potência, no Distrito Industrial. Para nós, o incêndio foi classificado de grandes proporções, em razão da perda total da indústria, que operava material sintético. Além deste, armazenava no interior do prédio, lubrificantes e combustíveis; inflamáveis que contribuíram fartamente para o resultado.

Nesse combate, assisti um grave acidente com um soldado e um sargento. Um desses heróis anônimos, tentando remover um tambor de óleo lubrificante, e como a tampa se desprendesse, foi atingido pelo material efervescente. Teve baixa hospitalar, com queimaduras graves. Outros apenas se feriram. Sofri queimaduras leves nos pés, apesar do calçado, porque a fibra sintética derretia-se, espalhando-se pelo solo.


A intensidade do fogo obrigou-nos a usar água de piscinas de clubes ao redor. Enfim, eu olhava para aquelas estruturas de ferro retorcidas, ou que se retorciam ao fogo, pingando como lágrimas altamente incandescentes. Como era assustador sentir as temperaturas elevadíssimas. Confesso, foi uma visão terrível!

Então, recorde as alegrias que teve. O reconhecimento da população aos serviços prestados pelo Corpo de Bombeiros. Aquele “muito obrigado”, ou aquele gesto que chegava no dia seguinte, ou aquela visita ao quartel, para dizer: “Olha, muito obrigado pra vocês, porque vocês fizeram isso”. “Nós perdemos o nosso filho... ou “Perdemos o nosso motor, mas se não fossem vocês...”. Esse retorno, nessas condições, muito nos reconforta. Para quem aqui trabalha, é deveras reconfortante.


Esses gestos enterneciam a você? Certamente. Vem-me outra alegria. O Corpo de Bombeiros tem grande orgulho de seus mergulhadores. Mergulhar no Amazonas não é como mergulhar em águas claras, em águas oceânicas. Eu tentei me exercitar nas águas amazônicas e me desesperei, porque não enxergava nada. Não há lanterna, não há meios que ilumine a lama do rio Solimões ou as águas do rio Negro. Nossos homens mergulham em profundidades, vão lá, retiram o que buscam. Possuem uma noção espacial-submarina incrível, própria deles. Por isso, quando olho para eles, primeiro os vejo com enorme inveja, porque poucos são capazes de realizar o que eles realizam. Depois, repleto de orgulho, pois eles são do Corpo de Bombeiros.
Renato, atual sargento da
reserva, recebe medalha
 
Nota: Os feridos mais graves no incêndio da Potência foram o soldado 2101, João Istanilau da Silva Pedrosa, recolhido ao Pronto Socorro e Hospital dos Acidentados (av. Joaquim Nabuco) com “queimaduras nos membros inferiores direito e esquerdo de 1º e 2º graus, sobre 15% da superfície corporal”. Recebeu alta hospitalar em 4 de dezembro, e seguiu sob os cuidados do Serviço de Saúde da corporação. Seis meses depois estava de volta ao serviço e, em 2011, subtenente PM aguardava a transferência para a reserva. O outro foi o 3º sargento 0265, Eunesimo Batista Serra, com ferimentos leves, medicado no pronto atendimento. Todavia, sua sorte tem nome e graduação: soldado Renato José Monteiro Rola que o socorreu, evitando o pior.

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