CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

domingo, novembro 10, 2024

POESIA DO DOMINGO

O poema deste domingo foi elaborado por Carlos Farias Ouro de Carvalho
(1930-97), consagrado ao amigo intelectual, desembargador André Araújo, tendo sido publicado há 55 anos, no Jornal do Commercio (19 out. 1969).
 
Recorte da página do JC, 19 out. 1969


Eis-me aqui.

Aqui. Sobre esta gávea de assombros,

carcomido de vento e de silêncio,

tão duramente cego ainda,

como no instante estúpido do espasmo

que me trouxe a este mar do não-saber.

Meteoro ignoto,

cumpro-me em rotas claras de estilhaços

Nesse buscar-se atônito e remoto,

ande a trilha das traças nas estantes

mais escurece o abismo dos instantes

distantes, do saber; mergulho inútil,

esse naufrágio em lagos bolorentos

rebuscando o esqueleto das palavras

nos seus sarcófagos frios e poeirentos.

De que serve a mecânica dos astros

esculpida nos riscos e equações

desses mapas de humana geometria

se sobre o pântano, a corola fria

do lótus guarda mais sabedoria  

do que todos os ciosos pergaminhos

que se hoje são, é porque ontem foram

sombra e ninho à margem dos caminhos?

 

OH! Os relâmpagos do caos, por essas messes,

que não sabemos, mas, em nós,

enfuna as bujarronas do viajar

por esses mares todos feitos de ar!

 

OH! Os relâmpagos do caos, por essas messes,

onde a inútil colheita apodrece

nos desastres da busca, palimpsestos

acolhendo em seu ventre, como cestos,

essa poeira vã dos cérebros aflitos

que as lunetas gastaram, pobres gritos

afogados nas noites desse lodo,

onde ainda orquestramos nosso engodo.

O melhor é gozar entre os crepúsculos

incêndio do festim, e nesse ir

de desastre em desastre, plantar musgo sobre

o muro da pálpebra, e dormir.  

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