CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

segunda-feira, novembro 13, 2017

ADRIANÓPOLIS: 1956

Castelinho, logomarca do bairro
Para a história deste bairro, reproduzo uma reportagem circulada em A Crítica (2 agosto 1956). Salientava esta a deficiência de transporte e de infraestrutura das poucas ruas. Para melhor entendimento, esclareço que Manaus estava sob a gerência do prefeito Gilberto Mestrinho e o Estado, do governador Plínio Coelho (1955-59).

É sabido que a administração destes governantes começava a revitalizar o Estado, em especial a Capital. Por isso, entendo que o artigo jornalístico traz muito pouco a acrescentar à vida da primitiva Vila Municipal.


EM DIA da semana passada a reportagem da A Crítica fez uma visita ao bairro de Adrianópolis, com o objetivo de auscultar as necessidades de seus moradores, que hoje somam milhares, pertencentes às mais diferentes classes sociais. Para começo de conversa devemos dizer de nossa luta e a extrema paciência que tivemos de pôr em uso, a fim de que tomássemos um coletivo que nos transportasse àquele futuroso e hoje desenvolvido bairro. Bairro que tem o nome de um cidadão dos mais dignos de nossa terra, esse que se chamou Adriano Jorge, médico ilustre e tradicional, jamais esquecido pelos manauenses que amam sua terra. No “Tabuleiro da Baiana”, tivemos que esperar uma eternidade pela chegada do único ônibus que, pela manhã, fazia aquela linha e pessoas que ali estavam com o mesmo objetivo, começaram a dar-nos os primeiros informes que necessitávamos para esta pequena reportagem.

UM INFERNO QUE PODERIA SER UM PARAÍSO

Depois de quase uma hora do espera, enfim veio chegando o velho carro de transporte coletivo com a placa “Adrianópolis”. A custo de muito esforço e algumas pisadelas e empurrões (pois pessoas mal-educadas e nervosas há em toda parte, muito especialmente nos pontos de espera de ônibus) conseguimos — o repórter de A Crítica, e nossos amigos ocasionais — tomar assento no velho ônibus, o qual saiu, resfolegando, pela avenida 7, rumo àquele distante bairro. O carro, não é necessário dizer, ia completamente lotado. Gente de todas as cores, de todos os tamanhos, com os mais diversos pensamentos, mas todos com uma só vontade na mente — chegar logo ao ponto do seu destino. Esse também era o pensamento do nosso repórter, pois o tempo urgia para outros trabalhos na redação.
Fomos, então, mesmo durante a viagem, tomando conhecimento das necessidades urgentes de Adrianópolis. Dentre elas, pudemos verificar que as mais prementes são, exatamente, o transporte e... a buraqueira existente nas suas ruas e praças, conforme mais tarde iriamos verificar. “Adrianópolis, meu caro repórter, dizia-nos um morador que conosco viajava, é um bairro que podia ser um céu, pois considero-o um dos mais bem localizados e, portanto, o bairro de maior futuro de nossa terra”. Infelizmente tal não acontece, e isso por diversos motivos: não temos um mercado, uma farmácia, a água é pouca e então quando se fala em transportes a coisa é de estarrecer e da gente ficar mudo e vermelho de raiva. Isso significa que, em vez de morar no céu, moramos no inferno.

RUAS BONITAS, COM RESIDÊNCIAS SUNTUOSAS
Verificamos que as queixas dos nossos amigos eram mais que verdadeiras, tinham sua perfeita razão de ser. Vimos isso logo que ali chegámos. Adrianópolis é, de fato, um bairro que faz honra à memória do Dr. Adriano Jorge. Casas residenciais luxuosas e ultramodernas, destacando- se as que ali mandaram construir o capitalista João Braga, Drs. Heraldo Corrêa, Waldir Vieiralves, João de Paula Gonçalves etc., além de ostentar belíssimos prédios de colégios famosos como o Instituto Montessoriano Álvaro Maia, o colégio dos padres capuchinhos de Milão, e o novíssimo Colégio Ida Nelson, dos missionários protestantes — Adrianópolis, em seu conjunto, apresenta um aspecto, realmente, que faz inveja ao próprio centro.


O traçado das ruas é bem feito, denotando o bom gosto de quem o fez, devendo ser ressaltada, neste particular, a obra de Deodoro Freire, um dos pioneiros adrianopolinos. Observa-se contudo, que o desleixo dos poderes competentes é a única nota destoante.
Esses poderes competentes são, evidentemente, a Prefeitura, a Inspetoria do Tráfego e talvez Departamento de Estrada de Rodagens, pois tudo ali é buraco, é capim solto e grande pelo meio das ruas e praças; é lama e, acima de tudo isso, o mais absoluto desprezo pelos interesses das classes menos favorecidas, no que toca nó problema do transporte. (...)

OS POBRES VÊM À CIDADE A PÉ

Uma grande parte dos moradores de Adrianópolis, a gente pobre, operários, comerciários etc., ás vezes que são obrigados a descer para a cidade andando nos seus próprios calcanhares.
A viagem é longa, como todos sabem, mas essas pessoas são obrigadas a assim procederem porque os ônibus que fazem aquela linha primam pela ausência nas horas mais necessárias ao trabalho da daquela gente, que são as horas da manhã, cedinho, e ao cair da tarde (ou da noite), quando todos regressam aos seus lares, após um dia de canseiras na luta pelo pão de cada dia. Um autêntico martírio, senhores que comandam a vida da nossa cidade, senhor Prefeito, Sr. Inspetor do Tráfego, Sr. Governador.
Por que não se toma uma providência em benefício daquela boa gente de Adrianópolis? Por que? Será que só tencionam fazer tal coisa quando se aproximarem as eleições? O povo de lá é que se pergunta isso, pois o povo, devemos dizer, está escabriado, não acredita em mais nada, tais e tantas foram as promessas que ouviu dos atuais detentores do poder — tudo meras palavras que o vento levou, e nada feito até hoje, as coisas piorando sempre, na falta de transporte, na limpeza, na ausência de um mercado, de uma farmácia o outras coisas essenciais a uma coletividade que se preza.
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Aí fica, portanto, o apelo que fazemos em nome dos moradores do bairro de Adrianópolis, esse futuroso e encantador (???) recanto de nossa cidade, preferido pelos homens abastados para construírem suas moradias suntuosas — mas que muitas vezes também os desanimam porque a lama, o mato e os buracos os impedem de ali chegar, dirigindo seus carros de transporte pessoal.
Quanto aos transportes coletivos, a miséria é aquilo que contamos: um único ônibus, velho e pachorrento, para uma população inteira; sendo que este mesmo “um” ameaça para, tal o estado das ruas e praças que têm de atravessar, quebrando-lhe as molas, furando-lhe os pneus.

Providências, senhores, é o que pede o povo de Adrianópolis

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