CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

sexta-feira, abril 15, 2022

SEMANA SANTA PASSADA

 Estive pela manhã rememorando os atos religiosos da Semana Santa ao tempo em que frequentei o Seminário São José, na década de 1960.

Na Quinta-feira acontecia a benção dos Santos Óleos, material que escoltava o católico do batismo à sepultura. Na Sexta-feira ocorria a Procissão do Senhor Morto, encerrada na Matriz da cidade, e seguida do velório. A cerimônia da Ressurreição acontecia no Sábado, no final da noite. Isso mesmo, pouco antes da meia-noite os oficiantes e os acólitos circundavam a igreja, que tinha as luzes apagadas para representar as trevas, o sepultamento do Senhor. Diante da porta principal, o bispo, tomando o báculo, batia três vezes na porta. Aberta esta, as luzes eram acesas e a solenidade prosseguia. Aleluia!

O texto reflexionável pertence ao Renato Mendonça, o irmão que comigo frequentou o Seminário. E o quadro da Santa Ceia é obra do artista Jurandir Macedo, oficial reformado do Exército, que fez doação ao quartel do 1º BIS(Amv). 

Feliz Páscoa!

  


Reflexões sobre a Santa Ceia

 Renato  Mendonça

         Antes da sua derradeira Festa da Páscoa, Jesus reuniu seus discípulos para uma confraternização. Apesar de toda a dificuldade de logística, arranjaram-lhe um lugar onde pudesse reunir a todos e encaminhar seus extremos ensinamentos neste dia característico; e foram, talvez, os mais emblemáticos para o futuro de seus discípulos, transformando-se num paradigma para suas pregações.

A Santa Ceia e o tríduo pascal nos remetem a profundas meditações e nos convida a uma autópsia espiritual de nós mesmos, para avaliarmos se todos os símbolos gerados nestes dias estão arraigados em nossos corações; se suas lições foram assimiladas.

Jesus usou coisas básicas da alimentação, o histórico pão que nutre o corpo desde os primórdios, desde o Antigo Testamento, quando serviu de maná no deserto e salvou o povo hebreu enquanto se conduzia para a Terra Prometida. Abstraímos também dessa passagem antiga, a mensagem a um povo que busca salvação. — Isto é o meu corpo, que será dado em favor de vós; façam isso para celebrar a minha memória. (Lucas 22:19-20).

O vinho representa o sangue, e serve para saciar a sede; a sede de justiça, e o resultado da luta em favor dos mais fracos e oprimidos. Tem sua relação também com o sacrifício, como era o dos animais citados na Bíblia. Agora, o sacrificado é o Cordeiro de Deus, o símbolo máximo da resignação — Pai, afasta de mim esse cálice, mas não seja feita a minha vontade, senão a Vossa. (Mateus 26:39) —, mas também, fé e esperança. — Eu sou o Pão vivo que desceu dos céus, quem come da minha carne e bebe do meu sangue terá vida eterna. (João 6:51).

Além desses emblemas latentes, há os gestos divinos de Jesus carregados de amor e doação total. O Mestre tirou o manto, derramou água numa bacia e cingiu-se com uma toalha; agacha-se e se curva para lavar os pés dos seus discípulos. Um gesto que denota ao mesmo tempo nobreza e humildade, aquilo que devemos praticar no nosso relacionamento humano. Ele quer nos ensinar que, quando for oportuno, precisamos servir ao próximo, um amor incondicional, independente de reconhecimento ou de recompensa. — Também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais assim como eu fiz para vós”. (João 13: 12-14). É curioso observamos que Pedro estranhou esse gesto de Jesus: “Senhor, tu vais lavar-me os pés?” E Cristo, com toda sobriedade e sabedoria, contestou: “Agora não entendes o que estou fazendo; mais tarde compreenderás”.

A estranheza do apóstolo era porque fugia aos costumes praticados pelos judeus; era costume oferecer água para lavar o rosto e pedir para um escravo lavar os pés do hóspede. Pedro apenas pensou na lógica comum: o menor serve o maior; o servo, o Mestre. Mas, Jesus justifica a atitude: “Se eu não te lavar, não terás parte comigo”. Com esse rito do “lava-pés” contemplamos o gesto divino e humano de Jesus, um gesto carregado de amor em que o evangelista João descreve a mais rica interpretação teológica.

Outro princípio divino, humano e fraterno que podemos aprender sublimemente desse encontro de Jesus com os discípulos é o “repartir o pão”. O gesto carrega em síntese o que já fora praticado tantas vezes na sua vida eucarística. Como por exemplo, quando distribuiu pães e peixes a uma multidão faminta que ouvia sua pregação, também num período que antecedia a Pascoa. (João 6: 1-15). A atitude simboliza o sentimento de solidariedade, de fraternidade e de igualdade. Quer nos mostrar que somos iguais aos olhos do Senhor, sem discriminação. Observe que Jesus, mesmo conhecendo a intenção de Judas Iscariotes, de entregá-lo às autoridades romanas, não o segregou dos seus discípulos. E ainda proferiu a célebre lição de vida: “Amai-vos uns aos outros, como eu vos amei”. E como Jesus amou!    

Na Santa Ceia, nosso grande Mestre sela uma divina e eterna Aliança, sintetizada naquela singular celebração, para se perpetuar na História.

E o pão a ser partido é o Pão da Vida!

Nenhum comentário:

Postar um comentário