Chá na sede do Sebão: Sérgio, Almir, Armando e Zemaria, a partir da esquerda |
Na
sexta-feira passada 13, a Academia Amazonense de Letras promoveu um Sarau para
recordar o acadêmico Armando Andrade de Menezes, falecido em junho passado.
João Pinto, um assíduo frequentador do Chá do Armando, quase
sempre conduzindo sua garrafa de polifenol, com razão estranhou o ritual
acadêmico. Com esse espírito, produziu a crônica que segue.
UMA CRÔNICA DO CHÁ DO ARMANDO
João Pinto e o caderno de poemas |
Não sei nem por onde começar esta crônica sobre o Chá. Mas como sempre, com uma mochila surrada, e meu livro
encadernado de poemas com o qual sempre lia lá no Ideal, desci do ônibus e
chego à Academia Amazonense de Letras.
Subi as escadas e sentei ao lado de alguns confrades do Chá. Era um Sarau da
casa em um salão vasto, com um mobiliário antigo e aquelas portas imensas,
talvez pescadas de troncos de árvores centenárias da Amazônia.
Mas havia certas formalidades que não contava à minha índole de andarilho. O
salão não estava tomado completamente. E esperei o Zé[maria] abrir o último
encontro do Chá. Mas quem deveria presidir com uma campa era o historiador para
pedir silêncio.
E eu falei último encontro? Sim, escrevi, seu tonto. Dei uma escapadinha
do salão. Entrei em outra ala da casa onde havia um coquetel, chique e com
iguaria da região. Oh, tomara que ninguém me expulse daqui, pensei. Eu preciso
ver essa riqueza entre pessoas finórias...
Que diferença do outro Chá, onde uma mesa composta de tira-gosto,
cerveja e uísque e tira-gosto. Mas tudo simples. Tão legal que eu jogava meu
vinho seco e um copinho de pinga sobre ela. E puxava uma cadeira e ali à mesa
já encontrava alguns confrades. E já começava a degustar da mesa.
O coquetel nesta casa, mais rico que o nosso fraco manjar. Ah, como tive
vontade de tocar e roubar um docinho. Tomar um suco de goiaba arrumados numa
mesa. Espiei, espiei, cortei o desejo, depois voltei ao salão para assistir às
apresentações.
Alguém passou a declamar ou cantar. Era um ritual tudo programado. Eu
gostaria de coisa mais aberta ou de improviso. Havia aplausos sim. Havia muita
sentimentalidade ao seu Armando Meneses, sim. Mas queria o outro Chá, com o meu
polifenol.
E por que eu estava tão inquieto, jururu mesmo, dentro de uma Academia
onde o riso ninguém se atrevia e os gestos profanos uma indecência? Ali o meu
cavalo não tinha capim para comer. Égua, eu sofro dessas disenterias em
ambientes com selos já marcados.
Ah, eu já te forneci a resposta, meu mano. O Chá sobreviveu mais de uma
década porque seu espírito era de anarquista. Não tinha o corante de seres
tidos como imortais. Eu sempre desconfiei dessa presunção de vestir um roupão
até o gogó e fazer manchete desse lado que deixou a novidade para trás.
Aquilo na Academia não era nosso reunião às sextas. Podia ser uma
homenagem justa ao morto. E sua família ali reunida.
Seu Armando certamente criou o Chá para não ter peias na língua e viver dentro de uma seara lírica. E assim nos legou essa conduta, livre e sem frescura.
Seu Armando certamente criou o Chá para não ter peias na língua e viver dentro de uma seara lírica. E assim nos legou essa conduta, livre e sem frescura.
Oh, eu não estava bem ali,
confesso. Queria declamar algum poema meu e sacolejar meus braços finos no ar.
Queria ver o Aguinaldo mais anarquista e centralizador. Queria o nosso garçom
do Ideal abrir a tampa do meu vinho. Queria ver o Zé[maria] falar alto cheio de
polifenol. Queria todos reunidos. Só não queria o decreto do enterro do Chá.
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