Biblioteca Pública, na inauguração |
Uma parcela de história da Rua
Barroso, cujo ponto de referência, não resta dúvidas, é a Biblioteca
Pública, instalada em seu início. A reportagem aqui compartilhada circulou em A
Crítica, domingo, 15 de setembro de 1974.
Como se verá, o autor (não identificado) cuidou mais das reminiscências, da saudade que o
progresso benfazejo impôs a esta artéria, que começa com a Casa dos Livros e
encerra no alto contemplando o monumental Teatro. Belo passeio, esta leitura.
Recorte do mencionado matutino |
A cidade cresceu de leste para oeste e do sul para o norte; a antiga
Barra de São José do Rio Negro compreendia apenas faixa de terra da margem
esquerda do igarapé de São Vicente aos barrancos do igarapé do Espírito Santo,
que Eduardo Ribeiro aterrou e transformou na avenida que tem o seu nome. — Antônio Barroso passou o igarapé e fez a sua casa. — A casa ainda está de pé —
Até quando?...
"A espaçosa sala de paredes de pau-a-pique e
piso de largos tijolos vermelhos da casa de Antônio Barroso, na antiga Estrada
do Barroso, a qual, ainda hoje de pé, tem o número 30, na Rua Barroso,
testemunhara muitas das horas de inquietação e labor poético do vate
amargurado. Ali, ele residira; e, ali, ele produzira alguns de seus mais
famosos líricos ("É em Manaus — informa em excelente ensaio biobibliográfico
o escritor Josué Montelo — que Gonçalves Dias escreve com o pensamento na filha
morta e na namorada perdida, os seus derradeiros e grandes líricos"),
"certamente dos melhores em que uma vez se vazou a língua de Camões",
diria mais tarde Sílvio Romero.
Coube, assim, à pequenina Manaus dos dias remotos
de 1861, a glória de recolher, e guardar para todas as épocas nos sonhos de
amor de seus românticos namorados, aqueles ecos doridos de angústia e de
paixão, do mais "glorioso e infeliz" dos poetas brasileiros. (Fastígio e Sensibilidade do Amazonas de
Ontem, de Genesino Braga, 1960).
ERA
ESTA A CASA
A casa número 30 da Rua do Barroso, que já teve o número
3, ainda está de pé. Austera em sua arquitetura, nos contempla há mais de um
século. Construída de pau-a-pique, a chamada "casa de taipa",
resistiu às intempéries do tempo, à transformação da cidade, à fúria do
progresso.
A casa é a própria história da rua, que começa na
Avenida 7 de Setembro, cruza com as ruas Henrique Martins, Saldanha Marinho e
24 de Maio, para terminar na José Clemente, ao lado da Praça de São Sebastião.
A casa de Antônio Barroso, segundo se pode ler em
vários livros, abrigou em seu teto centenário personalidades do Império e da
República. Ali estiveram, como hóspedes, além do poeta Gonçalves Dias, Tenreiro
Aranha, o barão de Tefé, o marechal Floriano Peixoto (segundo presidente da
República) e o marechal Taumaturgo de Azevedo [governador do Amazonas].
A
HISTÓRIA DA RUA
Começamos pela casa, para poder contar a história
da rua.
José Antônio Barroso, quando o Amazonas ainda era
Província, adquiriu naquele trecho da cidade vários lotes de terra. E num deles
construiu sua residência, que ainda hoje está de pé.
Naqueles tempos, Manaus ainda não estava arruada, a
atual Avenida Eduardo Ribeiro era um igarapé, quase 50 anos depois aterrado pelo
"Pensador"; nem Teatro, nem outras construções. Por isso o povo, como
ponto de referência, passou a chamar aquele trecho da cidade de "Estrada
do Barroso", porque ali morava José Antônio Barroso, um paraense nascido
em Óbidos. E quando a cidade começou a ser urbanizada, ainda ali se encontrava
a família Barroso. E da estrada, passou a Rua Barroso, homenagem justa à memória
de quem primeiro ali se localizou.
Muitos pensam que a rua, quase uma continuação da
Marechal Deodoro, é homenagem ao Almirante Barroso, vencedor da Batalha de
Riachuelo, cujo navio capitânia chamava-se, por coincidência, Amazonas.
O LADO
DA BIBLIOTECA
A Rua Barroso, embora estreita, é uma das mais
importantes da cidade. No seu início está o prédio da Biblioteca Pública do
Estado, destruída parcialmente por um incêndio a 23 de agosto de 1945, quando
perdeu a maior parte de seu valioso acervo. Mais tarde o prédio foi restaurado
e abrigou, por vários anos, como sede provisória a Assembleia Legislativa do
Estado.
Um dia o teto do salão superior, onde funcionava o
plenário do Legislativo, desabou e a Assembleia voltou ao Instituto de
Educação, para depois retornar ao seu lugar na Biblioteca, até que no Governo
Arthur Reis o salão que servia ao plenário foi completamente reformado, instalando-se
ali o Auditório Alberto Rangel.
O prédio da Biblioteca do Estado, além da própria biblioteca,
sempre bem frequentada, principalmente por jovens estudantes em seus trabalhos
de pesquisa, abriga também o Auditório Alberto Rangel e a Pinacoteca do Estado.
Ocupa todo o quarteirão, da Avenida Sete até a
Henrique Martins. Fazia parte do então Arquivo, Biblioteca e Imprensa Pública,
até que na Interventoria de Álvaro Maia foi desmembrada, passando a se
constituir um órgão independente do Diário Oficial (que ficava onde é hoje o
Banco do Estado do Amazonas).
O escritor, jornalista e homem de letras Genesino
Braga, foi nomeado seu diretor efetivo. É que o mestre Genesino já dirigia a
Biblioteca. Era funcionário da repartição, parece que chefe de Seção,
juntamente com meu pai (Ulysses Paes de Azevedo, já falecido), que por várias
vezes foi diretor da repartição. Com o desmembramento, "seu" Genesino
(desde aquela época tenho por ele grande respeito e admiração), ficou como diretor
efetivo da Biblioteca, e meu pai efetivado como Secretário da Imprensa Pública
(Diário Oficial). Não consigo separar a Biblioteca da figura de Genesino Braga.
Por isso, ele entra na história da Rua Barroso, e me traz saudosas recordações.
A
OUTRA ESQUINA
Ganhando foros de rua, a antiga "Estrada do
Barroso" foi progredindo. Na esquina da Sete, onde estão erguendo agora um
grande edifício, a "Papelaria Velho Lino", fundada em 1913, de
propriedade de Lino Aguiar, que em 1944 passava a se chamar Papelaria Velho Lino
Ltda., com todo o ramo das artes gráficas. Em 1962, o prédio foi vendido e os
antigos empregados da firma, usando a mesma denominação, passaram a ocupar um
prédio ao lado, vizinho à secular casa de Antônio Barroso, onde estão até hoje.
DE
ESQUINA EM ESQUINA
A Rua Barroso é famosa. Lá na esquina da Henrique
Martins está a barbearia do Alencar, um cearense dos bons, que nas horas vagas
é poeta e repentista. O "Farol Verde", lembrando o velho Aníbal; onde
a Caixa Econômica está sendo erguida, ficava a "Reforma", do
"seu" Campos. Muitos prédios foram derrubados, para dar lugar a
outros mais modernos. E assim desapareceram as casas onde funcionaram a Escola
de Comércio Sólon de Lucena, que era
mantida pela Prefeitura, e o Departamento de Estatística.
Lá, na esquina da Saldanha Marinho, durante mais de
10 anos o amigo Vivaldo Michiles possuiu um bar e mercearia, muito bem
frequentado pelo pessoal de jornal. Foi nosso "ponto" de encontro,
principalmente aos sábados, onde o Herculano de Castro e Costa era figura
obrigatória, num "papo" dos melhores, quase sempre com a presença do
saudoso Áderson Menezes, do Zenith Pimentel, Geraldo Pinheiro, José Lemos e
outros amigos. (veja a conclusão)
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