Capa do livro da 2ª edição, 2006 |
A Rebelião liderada por Ribeiro Junior, em 24 de julho de 1924, marcou
em especial Manaus. Durante décadas foi festejada por aqueles que vivenciaram
os dias de entusiasmo e de ardor cívico.
Nos últimos anos, ninguém mais fala do
episódio, não mais se ouve o foguetório que festejava a data.
Próximo do centenário, ainda se encontram duas ruas com a denominação
de Ribeiro Junior, uma, no bairro de São Francisco (69063-150), e outra, em
Flores (69028-290). Além dessas homenagens, temos o Conjunto residencial
situado na Cidade Nova.
Por óbvio, restam as lembranças da família Ribeiro Junior. As últimas
ocorreram em 1998, quando sua filha Eneida Ribeiro publicou o livro Ribeiro Junior: redentor do Amazonas; posteriormente,
em 2006, foi a vez da neta Beatriz Ribeiro, com a 2ª edição da obra (foto), ambos com
o suporte do Governo do Amazonas.
Participei da primeira festa com o texto paralelo, que narra a refrega
perdida pela PMAM. No post anterior, encontra-se a primeira parte.
A Força Policial e a Rebelião de 1924
O
ataque
No início da noite de 23
de julho, o capitão José Carlos Dubois, comandante do 27° BC, aquartelado na
Praça General Osório (hoje Colégio Militar de Manaus), apetrechou o trem de
guerra e marchou sobre o Palácio Rio Negro. Para tanto, desceu a avenida
Eduardo Ribeiro, tomou à esquerda na rua Henrique Martins e assim alcançou a
avenida Treze de Maio (em nossos dias, Getúlio Vargas), estacionando atrás do
Colégio Estadual. Havia, porém, uma pedra no caminho a suplantar, a Força
Policial instalada logo adiante no quartel da conhecida Praça da Polícia.
Houve então o ataque. Acerca
desta ofensiva translado a Parte Especial do oficial de dia, extraída do Boletim
Regimental n° 173 (25/VII/924):
Ontem, cerca de 19 horas, foi este quartel,
inopinadamente atacado por forças do vinte e sete Batalhão de Caçadores,
havendo forte tiroteio que durou mais ou menos trinta minutos; quando depois de
se encontrarem feridos o coronel comandante Pedro José de Souza e o primeiro tenente
Manoel Correa da Silva, combinamos parlamentar com os adversários, o fazendo
por considerar imprudência uma resistência com forças bastante superior, pois,
apenas contávamos com dezesseis homens contra duas companhias; resultando esta
Corporação entregar-se em virtude dos motivos acima, pelo que aderimos,
coagidos, ao movimento revolucionário, como nos ditou as circunstâncias do
momento.
Quartel em Manaus, vinte e quatro de julho de mil
novecentos e vinte e quatro. (a) Augusto Vaz Sodré da Costa, Capitão Oficial de
Dia.
Algumas digressões em
torno deste prefalado documento. A Força Policial possuía o efetivo previsto de
344 policiais. Como existia o claro de 115 praças, "por não comportarem as
finanças estaduais a integração do efetivo", segundo registra a Mensagem
governamental, e subtraindo-se os destacados no interior do Estado, cerca de 160
policiais guarneciam a capital. Desse resultado, menos de duas dezenas deles encontravam-se
no Quartel na hora do assalto.
Quartel e Praça da Polícia, ainda o Colégio Estadual, em foto de 1950 |
Quanto era ridículo esse
quantitativo, confrontado com o efetivo do Regimento estadual ao final do
século XIX. Para conhecer a história amazonense, foi essa força do Regimento que
assegurou ao governador Eduardo Ribeiro (1892-96) se contrapor à Guarnição
federal, assegurando-lhe a manutenção do cargo injustamente exigido.
Em julho de 1924, com o
Amazonas demonstrando sinais de decadência, o pessoal da Força Policial apresentava-se,
além de depauperado, desestimulado por uma razão simples: o soldo aviltado e sem
recebê-lo desde fevereiro! A lealdade ao comandante em momento tão crucial
estava comprometida, quanto mais ao governador, que cuidava da saúde própria na
Europa.
Outro pormenor: duas
companhias de fuzileiros do 27° BC correspondiam a cerca de 180 homens, apoiadas
por fração de material bélico de porte. A prudência aconselhava não se contrapor,
como assentiu o oficial de dia.
Enfim, a presença no
quartel do comandante da Força no horário do assalto, reforça-me a convicção de
que os policiais conheciam da sublevação. Posto que, "desde o início de
julho, corriam em Manaus boatos sobre um levante militar". Apenas a
impunidade dos membros do Governo não permitia crer naquilo que a população (e
os próprios policiais) propalava à boca pequena.
O coronel Pedro de Souza não
conseguiu, sim, arregimentar maior número de praças, seria porque, também essas,
ansiavam por mudança no Poder Executivo?
Guarda
cívica
Submetida a Força
Policial, foi esta metamorfoseada em Guarda Cívica, sob o comando do capitão
Arthur Martins da Silva, alçado ao posto de "coronel". Os Boletins
dessa organização, relíquia do arquivo da Polícia Militar, registram a
abnegação dos guardas em socorrer as mesmas Forças Federais, por ocasião do
ataque ao Forte de Óbidos, no mês seguinte. Com este objetivo, foram repassados
ao 27º BC 50 fuzis e 45 mil cartuchos, além de colocar à disposição 39 praças
do capital e as destacadas em Itacoatiara, sob o comando do tenente Francisco
Pio de Souza.
A consequência do engajamento
à rebeldia foi funesta, pois foram presos juntamente com os insurretos pelas forças
do Destacamento do Norte e, posteriormente, processados na Auditoria de Belém.
O Amazonas todo, é
verdade, beneficiou-se desse trauma constitucional, ainda que à sublevação
seguiu-se a intervenção federal. A Força Policial foi reabilitada, voltando a
ser comandada por oficiais do Exército requisitados pelo interventor Alfredo
Sá, alguns no próprio 27º BC. Esses ajudaram a refundir na Polícia Militar do
Estado as vigas mestras do progresso castrense – disciplina e hierarquia.
Concluo, reescrevendo parte
do discurso do orador oficial saudando na Câmara Municipal, em 1962, a
revolução cognominada de Redentora. O
vereador Evandro Carreira com sua capacidade orava “para que os campeadores de
23 de julho de 1924, redivivos, reacendam a chama sagrada do heroísmo nas
gerações e advirtam com a anátema indefectível da História os que, por ventura,
tentem fazer dos bens comuns do povo propriedade particular.”
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