Estátua à entrada do quartel da Cavalaria |
Na condição de unidade policial, a Cavalaria surgiu
com a criação do Regimento, no meado da última década do século XIX. No
entanto, devo registar que, na reinstalação da Guarda Policial, em 1876, havia
previsão de alguns cavalos para uso do estafeta e do ordenança. Com isso,
pode-se nomear esse período e esse emprego da cavalgadura como a pré-história
desta arma na Polícia Militar do Amazonas.
Efetivada na estrutura do Regimento Militar em
1896, e a fim de operacionalizar o serviço, o Estado teve de adquirir os
cavalos. Não os encontrando em Manaus ou
adjacências, foi obrigado a importá-los, realizando-a de muito longe, do
exterior. Os cavalos vieram da Argentina, a distância e o único meio de
transporte existente me leva a imaginar essa operação. Não muito estranha,
visto que outra similar foi realizada já em nossos dias, um século depois.
Ainda que não se conheça o número desses animais, são
conhecidos dois registros sobre dessa singular importação. O primeiro, inserido
na mensagem do governador do Amazonas aos Congressistas, em 10 de julho de 1902.
Na ocasião, Silvério Nery efetuava um retrospecto de seu governo e, entre outros
subsídios, registrou que as “contas tomadas”, ou seja, os recursos dispostos
“ao tenente Luís Gomes Freire de Quadros não foram adequadamente aprovados”.
Os valores referiam-se ao “emprego de 1.000 libras
esterlinas que recebeu em Buenos Aires, para a compra da cavalhada para o
Regimento Militar do Estado, e mais 2:500$000 [dois contos e quinhentos mil
réis] que recebeu no Pará para despesas com o transporte da cavalhada até este
porto”.
Asseguram os fiscais do Tesouro que a prestação de
contas estava incorreta, “pela falta de documentos comprobatórios das despesas
que o responsável alega ter realizado”.
Tenente
Quadros era apesar da nacionalidade portuguesa, oficial do Regimento e, na
ocasião dessa negociata, exercia o cargo de Ajudante de Ordens do próprio governador.
Não alcancei as providências administrativas sobre o comprador. De igual maneira, o número de quadrupedes “hermanos”
adquiridos com as libras esterlinas.
A
única alternativa de transporte então do rio da Prata ao rio Negro era o navio.
Assim foi realizado. Apenas interrogo se o afretamento foi realizado em duas
etapas, de Buenos Aires à Belém, e deste porto para o de Manaus.
Na
verdade, a cavalhada chegou ao porto de Manaus e encaminhada ao Piquete de
Cavalaria, que existia na rua Duque de Caxias, onde hoje está assentada a
maternidade Balbina Mestrinho e um quartel da PMAM. Este terreno estendia-se
por um barranco que findava no igarapé do Mestre Chico, cuja referência hoje é
um edifício da igreja Quadrangular do Reino de Deus.
Capa do livro com o registro de Mario Ypiranga |
O
outro registro tem por fonte o governador Antonio Bittencourt, que foi vice do
governador Silvério Nery. No opúsculo circulado em 1912, sob sua
responsabilidade, intitulado Eram eles os
ladrões... (crônica de uma oligarquia nefasta), referindo-se aos Nery, delatou
seu antigo chefe. A primeira acusação diz respeito a mencionada cavalhada
comprada para o Regimento, que, todavia, acabou na fazenda do governador situada
no lago do São José do Amatari.
Um
pouco mais de delação: alguns cavalos foram “vendidos” aos oficiais, que
pagaram em módicas prestações.
Enfim,
o texto do citado panfleto sempre ocasionou uma indagação: quem era o autor dos
artigos publicados no primitivo jornal Diário
do Amazonas, que originou o Eram eles...?
Entre outras especulações, suspeitou-se do jornalista Victor Hugo Aranha. Todavia,
o saudoso mestre Mario Ypiranga dirime a dúvida: registrando de próprio punho na
capa do exemplar de sua biblioteca, assegura que o texto desta delação foi
escrito “pelo professor Agnello Bittencourt”. Dessa maneira começou a Cavalaria na
Polícia Militar do Amazonas.
Que
fim levaram os cavalos? Perderam o imperativo quando o boom da borracha
esvaziou o Estado, que entrou em decadência, levando em seu bojo a corporação
militar estadual. A Polícia Militar sentiu o reflexo e foi encolhendo ano após
ano. De sorte que, como a cavalaria desapareceu, os canhões foram recolhidos ao
museu, não havendo mais necessidade dos “beiçudos”. Não houve renovação.
Até
que... isso é para outro capítulo.
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