Mapa de Manaus, 1852 |
No segundo
governo dos irmãos Nery (1904-07), circulava em Manaus a “Revista destinada a
vulgarização de documentos geográficos e históricos do Estado do Amazonas”,
intitulada ARCHIVO PÚBLICO. Tais documentos constituíam o acervo desta
repartição que, ainda em nossos dias, sem o brilho anterior, prossegue
funcionando.
Em 17 de
outubro de 1907, Bento de Figueiredo Tenreiro Aranha (filho do 1º presidente da
Província amazonense e dirigente do referido órgão), proferiu uma palestra
sobre a História e Geografia do Amazonas.
Essa alocução, realizada no Ginásio Amazonense diante de respeitável plateia e
do próprio governador, Constantino Nery, foi reproduzida no volume II, datado
de 23 de janeiro seguinte.
A seguir, a
IV e última Parte:
Vila da Barra do Rio Negro, 1849 (colorido artificialmente) |
Vastíssima
é a rede hidrográfica da Bacia do Amazonas, tendo por artéria principal o
portentoso rio do qual vem o nome, e dele ramificam-se outros que a ele se
assemelham como o Jari, Paru, Xingu,
Tapajós, Madeira, Uatumã, Urubu, Negro, Purus, Japurá, Iça, Juruá, Javari,
Ucayali, Morona etc. e, que não são menos importantes pela amplitude do
curso e volume das suas águas, que o Tocantins, que noutros tempos deverá ter
sido, como creio, também um ramo do rio Amazonas.
O
rio Amazonas, que o padre Antônio Vieira, – o Grande, chamou – mar doce, por ser na largura da sua
embocadura e no seu comprimento maior que o Mar
Mediterrâneo, nasce na cordilheira dos Andes; e querendo Tenreiro Aranha,
imortal fundador da província, que tomou o mesmo nome do rio, dar uma ideia
aproximada da sua grandeza, assevera que a navegação tem sido e há de sempre
ser, aqui, por este mar imenso do
Amazonas, a principal via de comunicação para irem todos os habitantes e
todos os produtos de uns para outros lugares, desde o leito marchetado, onde o
monarca dos rios tem a cabeça majestosa, até onde com as pontas dos pés repele
as vagas do oceano.
Todos os habitantes e todos os produtos dos outros
lugares da Bacia do Amazonas incontestavelmente estendem-se à Goiás e Maranhão pelo Tocantins; à Mato
Grosso pelo Xingu, Tapajós e Madeira; à Bolívia pelo Madeira, Purus e Juruá; ao
Peru pelo Juruá, Javari e Amazonas ou Maranon; ao Equador pelo Iça; à Colômbia
pelo Iça, Japurá, Uaupés e Içana; à Venezuela pelo rio Negro, Ixié, Cauaboris,
Padauari e Uraricuera; à Guiana Inglesa pelo Tacutu e à Guiana Holandesa pelo
Trombetas.
Os Estados do Grão Pará e Amazonas, unidos pelo grande
rio, acham-se na própria artéria da rede hidrográfica da Bacia do Amazonas.
Só depois da fundação do Estado do Maranhão e Grão-Pará, cuja sede foi São Luís, máxime da gloriosa expedição de Pedro Teixeira, intrépido capitão português, que de Belém partindo com destino à Cametá e deste porto, no rio Tocantins, dirigiu-se a Quito, hoje capital do Equador, por via do rio Amazonas, no qual foram, nessa ocasião, reconhecidas as embocaduras dos rios Xingu, Tapajós, Madeira, Negro, Coari, Japurá e Napo até o término da mesma expedição, foi que o Maranon, descoberto por Pinzon, que Orelana mais tarde denominou Amazonas, ficou definitivamente reconhecido e pertencendo a capitania do Grão Pará, e sob a jurisdição do governo geral daquele outro Estado.
As capitanias, que então o formavam, eram as do Maranhão, Cumá ou Guimarães, Piauí, Gurupi, Caeté ou Bragança, Grão-Pará, Joannes ou Marajó, Cabo do Norte ou Guiana Portuguesa, Camutá ou Cametá, e Rio Negro ou Alto Amazonas, última criada. Este vasto Estado ficou depois dividido no do Maranhão e no do Grão Pará e Rio Negro e mais tarde este ainda foi dividido, já sob o regime do Império, na província do Grão Pará e na do Amazonas.
Esta última província, que se achava convertida na qualidade de comarca da outra província, num vasto deserto, por falta de um escolhido, que trabalhasse para a felicidade de seus povos, como havia feito o seu glorioso e imortal governador Lobo d’Almada, no fim do século XVIII, teve quem dela se lembrasse a 27 de maio de 1826 na Assembleia Geral Legislativa do Império. O deputado paraense, cônego Romualdo Antônio de Seixas, foi quem submeteu à discussão um projeto seu, mandando considerar daquela data em diante, como Província, a comarca do Rio Negro da Província do Pará, dizendo: Ah! Sr. Presidente, quanto são desgraçados os povos que vivem longe da sede do Império!
Com a criação do Estado do Maranhão, por decreto de 13 de julho de 1621, o governo das conquistas do Ceará, Maranhão e Grão-Pará, ficou separado do geral do Brasil. Nomeado Diogo de Carcamo naquela mesma época, governador do novo Estado, recusou a nomeação, e por este motivo coube a Francisco de Moura ser escolhido para ocupar o cargo, que não aceitou também.
A vista da sua recusa foi então nomeado, a 23 de
setembro de 1623, Francisco Coelho de Carvalho, que a 23 de março de 1624
partiu de Lisboa com destino a Pernambuco, onde deixou-se ficar dois anos por
causa da invasão holandesa, tendo dentro desse tempo tomado posse do cargo no
Ceará, que fazia parte do território do Estado do Maranhão.
Este governador só a 3 de setembro de 1626 pôde entrar em São Luís , e em 1627 indo
ao Grão-Pará, entrou no Gurupi e ali
fundou a povoação Vera Cruz; e manifestou-se em Belém contra os bárbaros e
desumanos resgates de escravos indígenas, com desagrado geral dos poderosos
escravagistas.
Em 1636 fez outra visita ao Grão-Pará, demorando-se
pouco em Belém, onde aportara a 1º de maio desse ano, e por motivo de moléstia
mudou-se para a Vila de Cametá,
fundada ainda em dezembro de 1635, onde chegou a 1º de setembro do mesmo ano de
1636 e a 15 desse mês ali faleceu.
Em 9 de outubro do referido ano de 1636, apossou-se
intrusamente do cargo de governador do Estado Jácomo Raimundo de Noronha, e só
o deixou a 27 de janeiro de 1638, data em que entrou na sua posse Bento Maciel
Parente, 2º governador da coroa e 3º na ordem dos respectivos serventuários que
assumiram o exercício do cargo. Dos três governadores, o último que foi nomeado
dentro do domínio de Espanha, continuou no exercício por nova nomeação do Duque
de Bragança, então aclamado rei de Portugal.
Desta sorte, contando da data da fundação do Estado do
Maranhão a da do Grão-Pará e Rio Negro o número dos seus governadores e capitães
generais foi este de 30, sendo: No domínio espanhol, com residência no Maranhão
– 3; no domínio português com a mesma residência – 23; e com esta no Pará – 5,
inclusive o governo provisório de 30 de janeiro de 1644.
No domínio holandês teve o Maranhão, menos o Pará que
não se submeteu à Holanda, dois governadores desta potência, de 27 de novembro
de 1641 a
28 de fevereiro de 1644.
A capitania do Grão Pará, sujeita ao Estado do
Maranhão, contou até a data da fundação do Estado do Grão Pará e Rio Negro, no
domínio espanhol 15 governadores e capitães-mores, e no domínio português 26,
inclusive o de 19 de junho de 1650, que pelo governador e capitão-general do
Estado do Maranhão foi declarado independente da sua autoridade, e mais 4, inclusive
o de 8 de maio de 1654, de Domingos Machado, conjuntamente o Senado da Câmara,
em virtude do Decreto régio de 23 de fevereiro de 1652, que deu-lhes autoridade
independente da do governo do mesmo Estado do Maranhão.
O Estado do Grão-Pará e Rio Negro contou, da data da
sua fundação até a adesão do Pará à proclamação da independência e do Império
do Brasil, o número de 10 governadores e capitães generais, inclusive o de 24
de setembro de 1751 e o de 2 de março de 1759, que governaram o Maranhão
dependente do Pará; uma junta provisória de 19 de outubro de 1817 com três
membros; uma outra junta provisória constitucional de 1º de julho de 1820 com
três membros; uma terceira de 1º de janeiro de 1821 com oito; uma quarta de 12
de março de 1822 e uma, por último, de 10 de março de 1823 com sete cada uma.
A Capitania de S. José do Rio Negro, sujeita ao Estado
do Pará, contou da data da sua fundação em 11 de julho de 1757 até a adesão do
Pará à independência e império do Brasil, os governadores seguintes:
Nº
|
Governadores
|
Data de Posse
|
1
|
Joaquim de Mello
Povoas
|
1758 Maio
7
|
2
|
Gabriel de Souza
Filgueira
|
.......
|
3
|
Nuno Ataíde da
Cunha Varona
|
.......
|
4
|
Valério Corrêa
Botelho de Andrade
|
.......
|
5
|
Joaquim Tinoco
Valente
|
1772
|
6
|
............................
|
........
|
7
|
............................
|
........
|
8
|
José Antônio
Salgado
|
........
|
9
|
Manoel da Gama
Lobo d’Almada
|
1787
|
10
|
José Antônio
Salgado
|
1799 Outubro 27
|
11
|
José Simões de
Carvalho
|
1804
|
12
|
José Joaquim
Victorio da Costa
|
1805
|
13
|
José Joaquim
Victorio da Costa
|
1807 Outubro 10
|
14
|
Manoel Joaquim do
Paço
|
1818
|
15
|
Antônio Luís
Pires Borralho
|
.......
|
16
|
Manoel Joaquim do
Paço
|
1821 Março 31
|
17
|
Antônio Luís
Pires Borralho
|
.......
|
No
mesmo domínio contou mais uma junta administrativa provisória constitucional,
formada por eleição, e compondo-se dos cidadãos seguintes: Antônio da Silva
Craveiro, Bonifácio João de Azevedo, Manoel Joaquim da Silva Pinheiro e João
Lucas da Cruz.
CONCLUSÃO
Eis aqui quanto me foi possível produzir, animado pelo
amor e zelo de que sempre fiz timbre, do bem geral do Brasil, particularmente
do Amazonas, berço do mavioso poeta lírico e cantor primoroso da inditosa Maria
Bárbara, que
Lembrando-se que teve uma consorte,
Que por honra da fé que lhe jurara,
A mancha conjugal prefere a morte;
e vasto teatro das mais gloriosas conquistas do imortal
João Batista de Figueiredo Tenreiro Aranha por meio da imprensa e da tribuna
parlamentar brasileira à favor da navegação a vapor dos rios do Amazonas e seus
tributários, da elevação da comarca do Rio Negro 19 à província, da
exploração dos mais importantes afluentes do grande rio, da colonização
nacional e estrangeira nos rios Iça e Branco, e da catequese e civilização dos
índios, para significar a minha gratidão a esta terra futurosa, que me deu
hospitaleiro acolhimento de 1856 até hoje, e ao qual tenho procurado
corresponder condignamente sem quebra de minha dignidade e da independência do
meu caráter.
Grato, portanto, aos distintos cavalheiros e virtuosa
professora, que ornam neste momento tão seleto auditório, especialmente aos
ilustres Dr. Antônio Constantino Nery, governador do Estado, e coronel Antônio
Clemente Ribeiro Bittencourt, vice-governador, por haverem todos gentilmente
honrado com suas presenças esta modesta conferência, que lhes tributo, contando
que me hão de desculpar, se não correspondi, quanto desejava, as suas expectativas. (fim)
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