Capa do livro |
Waldir Garcia, juiz e educador,
nascido em Silves (AM) registrou no livro de crônicas À sombra dos igapós (Manaus: Imprensa Oficial, 1987) uma série de
fatos não apenas de sua cidade natal, mas igualmente de sua atividade em
Manaus. O livro traz ilustrações do competente artista Edemberg Jr.
Bacharel pela Faculdade de
Direito do Amazonas (turma 1946), Garcia aposentou-se como magistrado, depois
de passar pela Auditoria Militar da PMAM, na condição de juiz. Foi nesta
atividade castrense que o conheci. Depois, ele foi guindado a secretário de
Estado da Educação pelo governador José Lindoso (1979-82).
Mestre e diretor da então Escola
Técnica de Manaus, Garcia escreveu várias crônicas sobre este estabelecimento
de ensino. Tomei de seu livro a crônica abaixo para relembrar o saudoso
professor e eminente magistrado.
Contribuição de Silves para os eventos históricos
pátrios
No
dia 7 de setembro fluente encontrava-me em Silves em companhia dos diletos
amigos José Menezes Ribeiro e Afonso Lima e de seus filhos Marco Aurélio e
Edson, e assisti ao desfile dos estudantes saracaenses pelas ruas principais e
o enaltecimento da efeméride feito por um professor local. Os estudantes, em
fila e em ordem, empunhavam bandeirinhas do Amazonas e do Brasil, sob a
entonação de hinos patrióticos emitidos por possante alto-falante.
Ilustração de Edemberg Jr. |
Aquele
acontecimento tocou-me a sensibilidade cívica e glebária, e, naquele momento,
comecei a recordar a história da fundação de Silves em meu solilóquio, a
coragem de frei Raimundo da Ordem das Mercês ao enfrentar corajosamente os
ataques dos caboquenas, bararurus e guanavenes; o grande massacre dos indígenas
da região pelo ferocíssimo selvaticida Pedro da Costa Favela; a heroica resistência
de Silves à investida dos cabanos; o
alusitanamento do município por Melo Póvoas; o romance "O
Missionário", de Inglês de Sousa, reconstruindo a vida pacata da cidade em
excelente obra de ficção, que mereceu os mais destacados encômios da crítica nacional;
o esforço de Lauro Garcia e de Renato Farias de Almeida para traçar-lhe o
perfil histórico; para, enfim, deter-me em dois fatos que merecem ser recordados
neste setembro, de tanta evocação cívica.
O
primeiro deles é o que se refere à iniciativa
da Câmara Municipal de Silves que, em 1818, instada pelo último governador
colonial do Amazonas, o coronel Manoel Joaquim do Paço e percebendo que a
Capitania tinha como dos males maiores que a infelicitavam a sujeição ao Pará,
em memorial dirigido a D. João VI, solicitou a autonomia da Capitania do
Amazonas, o que veio apressar a promulgação da Lei nº 582, de 5 de setembro de
1850, que elevou o Amazonas à categoria
de Província. O segundo fato foi a adesão de Silves à Constituição Política Portuguesa, narrado em substancioso trabalho de pesquisa histórica da lavra do conceituado, inteligente e culto historiador amazonense, que é o Dr. Geraldo de Macedo Pinheiro. Conta-nos ele:
"Dia
24 do mês de julho do ano da graça de 1823, o Brasil, nessa época, já se tornara
independente de Portugal, mas a alvissareira notícia que empolgou o ânimo de
todos os brasileiros ainda não chegara a Silves”.
"A
longa distância que se encontrava das Cortes e os sucessos e motins políticos
que tinham curso em Belém, concorreram para que em junho de 1823 os habitantes de Silves jurassem obediência à Constituição Política Portuguesa, de conformidade com o que preceituava o decreto real de 10 de outubro de 1822."
"Na igreja paroquial de Nossa Senhora da Conceição, logo depois do cerimonial católico da missa cantada, como era de praxe naquele
tempo em todas as solenidades cívicas, foi processado o juramento solene, com a presença de todas as autoridades eclesiásticas, civis, militares, empregados públicos e do povo, perante as mãos sagradas do vigário Nuno Alves do Couto".
"As palavras que foram pronunciadas com ênfase transcreveu-as o escrivão da Câmara, Antônio R. Teixeira da Cunha, no auto que lavrou: Juro guardar, e fazer guardar, a Constituição Política da Monarquia Portuguesa, que acaba de decretar as Cortes Constituintes da mesma nação".
"Mais
de 30 assinaturas constam do documento em foco, encabeçadas pelo vigário Nuno
Alves do Couto, por si e como procurador de
frei José Alves da Chagas e do padre João Pedro Pacheco. Seguem-lhe o cabo de
esquadra da milícia, Alexandre Antônio Coimbra; o presidente
da Câmara, Ciríaco Francisco; os camaristas João Evaristo Roiz, Preto e
Felizardo Ferreira Gato; o substituto Manuel Antônio Gouveia; o procurador
Pedro José Teixeira; o servente Aulete Antônio da Costa; o escrivão Antônio Lins
Teixeira da Cunha; o arrecadador João Ramos de Oliveira, como procurador do
juiz ordinário João José Dias; o tenente Crispim Lobo de Macedo como procurador
do juiz substituto Joaquim da Fruta Chaves; o tesoureiro do selo Luiz José
Coelho; os juízes de julgado Luiz José de Azevedo e Manoel Antônio Cidade; o
capitão do 9º Regimento da 2ª linha, comandante no lugar Maués, Fabio José da
Serra; ainda o tenente Crispim Lobo de Macedo; o alferes Henoch Friglono Peroglon
Calle; o cavaleiro fidalgo da Casa Real Manoel da Silva Xavier; Luiz José de
Azevedo, como procurador de d. Leonor da Cunha Xavier, o alcaide João da Costa,
os porteiros João Francisco da Silva e Antônio Zacarias e, finalmente, os
elementos do povo em número limitado".
Esses
fatos tão significativos, sob o ponto de vista histórico, são o testemunho
maior da contribuição de Silves para os eventos pátrios que se comemoram sob o
mais caloroso entusiasmo cívico neste setembro canicular, revelando a disciplina
e o patriotismo de um povo ordeiro e inflamado pelas nobres causas do nosso
Amazonas e do Brasil.
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