CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

domingo, novembro 24, 2024

POESIA DOMINICAL (3)

 

Nesta sessão, além do poema ilustrativo da postagem, que acaba de completar 95 anos de circulação, compartilho uma sentença sobre a Poesia manifestada pelo escritor Gabriel Garcia Márquez (Prêmio Nobel de Literatura 1982), em seu livro Eu não vim fazer um discurso (2011).
Em cada linha que escrevo trato sempre, com maior ou menor fortuna, de invocar os espíritos esquivos da poesia, e trato de deixar em cada palavra o testemunho de minha devoção pelas suas virtudes de adivinhação e pela sua permanente vitória sobre os surdos poderes da morte. Entendo que o prêmio que acabo de receber, com toda humildade, é a consoladora revelação de que meu intento não foi em vão. É por isso que convido todos a brindar por aquilo que um grande poeta das nossas Américas, Luis Cardoza y Aragón, definiu como a única prova concreta da existência do homem: a poesia.”

 

Revista Rionegrino nº 14, nov. 1929
ilustração de Branco Silva 

COISA FEITA

Raimundo Barretto

  • Quando você me olha nas pupilas dos meus olhos
  • Tremo de ver aquilo que você me diz ...
  • Mas, não sei por que,
  • Quando eu fito as meninas dos olhos de você,
  • Sinto o corpo lambido de enguiço,
  • Como quem tem assombração de almas do outro mundo
  • Ou está desmantelado de feitiço!
      • Todavia,
  • Acredito que você quando me espia
  • Não vê,
  • Como eu fico embiocado
  • Com a malquerença
  • Que vem saindo de bubuia
  • Pelos olhos de você!...
      • Agora,
  • Levo um tempão ruminando na lembrança
  • Pra compreender tamanha judiaria...  
  • Eu, minguando de sofrença,
  • Você, cismada de esquivança...
  • Eu, sempre atocaiado...
  • E ambos sem sustança de dizer qual a mezinha,
  • Que cura morrinha...
  • Ou serve pra fechar o corpo contra mal olhado!
      • Para mim,
  • Só sendo castigo de Deus Nosso Senhor,
  • Enxerir você na minha vida
  • Tão inquirida de amor...
  • Feita um espinho de esperança,
  • Que não se cansa
  • Nem se sente
  • De fuxicar na dor que só doe no coração da gente!
      • Mas,
  • Não é por toda esta quezília que você deixa de ser,
  • A mulher malmequer do meu bem-querer.
  • Por isso, já se vê --
  • A mais ninguém,
  • Eu quero tanto bem quanto a você!

Nenhum comentário:

Postar um comentário