Álvaro Maia
Meses após a morte do acadêmico Álvaro Botelho
Maia, padre Nonato Pinheiro, também acadêmico e membro do IGHA (Instituto
Geográfico do Amazonas) publicou em O Jornal, (domingo, 19 de outubro de
1969), uma sinopse das obras do falecido. O alongado artigo vai aqui
compartilhado em duas assentadas. Efetuei a atualização da ortografia e
introduzi ligeiros detalhes, que espero não comprometa a obra do saudoso
articulista.
Recorte de O Jornal, 19 out. 1969 |
Tentarei neste meu trabalho de hoje traçar um aproximado itinerário intelectual de Álvaro Maia, que reputo, com Péricles Moraes, as duas mais altas expressões de grandeza no panorama literário de meu estado natal. Nascido em Humaitá, a 19 de fevereiro de 1894, com 13 anos iniciava os estudos de humanidades no Ginásio Amazonense (1907). Nesse tradicional estabelecimento de ensino médio, logo despertou admiração e respeito, entre os condiscípulos, a corola magnifica de sua inteligência, que se abria em púrpuras e aromas fascinantes.
Foi
gerente, redator e colaborador assíduo da revista AURA, órgão crítico e literário,
cujo primeiro número apareceu em 24 de julho de 1907. Suas brilhantes colaborações
traziam por vezes o pseudônimo ALBOMA, em que o leitor inteligente logo lhe
descobre o verdadeiro nome: AL (Álvaro); BO (Botelho); MA (Maia). O condor
ensaiava os primeiros voos, entre alunos igualmente brilhantes, como Abelardo Araújo
e Cosme Alves Ferreira Filho. No terceiro aniversário da revista (24/07/1910)
escrevia ufano:
“Sentimo-nos invadidos de
orgulho, porque a AURA, a cada passo que vai dando, cada vez que sai aos ventos
da publicidade, cai conquistando simpatias espontâneas, vai caminhando a largos
passos. A sede da glória chegou até nós e, enraizando-se em nossos corações,
lançou fulgurações cintilantes, e, vestindo a clâmide da Verdade, vamos seguindo
pela estrada iluminada pelas suas projeções, guiados pelo saber, como aqueles
Reis Magos da lenda antiga pela estreia do além.”
A
imagem fascinante da glória desde então passou a ter em seu formoso espirito
uma colorida moldura. Em 1911, 19 de agosto, volta a sonhar com a iara deslumbrante
de suas linfas cristalinas: “Sonho com a luta, sonho com a Glória. A Glória é
uma enganadora miragem: é uma luz vaporosa que brilha longe, muito longe, nos
extremos do horizonte e nós, seduzidos pelo seu fulgor, vamos em procura dela.
Muitas vezes semimortos e tristes, queremos voltar, mas não podemos. É que ouvimos
salmos harmoniosos que nos atraem, como os Cânticos das sereias aos marinheiros”.
Nesse
ano de 1911, Álvaro Maia estreou no jornal CORREIO DO NORTE, de propriedade e
direção de Germano Bentes Guerreiro. Era um belo jornal, noticioso e literário,
que diariamente publicava, sob a epígrafe URNAS, uma joia antológica da
literatura luso-brasileira. Foi para mim uma grata surpresa essa estreia,
porque o jornal lança simultaneamente Álvaro Maia e meu pai, que assinava Nonato
Pinheiro. Foi a 14 de maio de 1911, que ambos foram apresentados na primeira
página dominical do referido órgão de imprensa, sob o título “Panoramas”, e o
subtítulo “Duas revelações auspiciosas”. Álvaro tinha 17 anos e meu pai, 21. A crônica
traz o pseudônimo Diable Rouge, que apresenta os dois moços: “Hoje tenho
o prazer de publicar nesta crônica duas magníficas estreias, duas verdadeiras
revelações auspiciosas, dois trabalhos escritos por dois rapazes de visível
merecimento”. Álvaro estreou com o lindo soneto Assuntos Velhos. Meu pai
inaugurava com o poema Nos braços de Vênus. Transcrevo o soneto do aedo
de Humaitá:
ASSUNTOS
VELHOS
Quando tu passas com teu passo
altiva/ os corações altivos seduzindo,/ enamorado e triste vou seguindo/ teu
corpo divinal e fugitivo.// Porque dele evaporas um ativo/ cheio de flores nos
florais abrindo/ que, em espirais ardentes se expandindo,/ me enche o peito dum
doce lenitivo.// Quando passas serena e deslumbrante,/ ficam meus olhos
abismados ante/ a forma do teu corpo de rainha;// E dos lábios em dúlcidos
cortejos/ seguem-te, para que não vás sozinha,/ rindo e cantando turbilhões de
beijos!
Em agosto
desse mesmo ano de 1911, nosso poeta viajou para Fortaleza. Américo Guedes
ofereceu-lhe um almoço de despedida, ao qual compareceram Abelardo Araújo,
Minos Cardoso, Cosme Alves Ferreira Filho, Antônio Barbosa e Demóstenes de
Carvalho. Ao brinde, falaram: Araújo, pelo corpo redacional da revista AURA; Barbosa,
pelo CENÁCULO; Cosme Ferreira, pelos colegas; e Cardoso, em seu próprio nome. O
homenageado agradeceu comovido, proferindo um discurso estrelado de imagens deslumbrantes.
Demóstenes de Carvalho ergueu um brinde pela felicidade da família. De
Fortaleza o poeta enviava para AURA o belo soneto Alma Vagabunda, que
dedicou a Demostenes de Carvalho. (segue)
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