A postagem deste Dia pertence ao meu irmão Renato, que volta a nos deleitar com um texto digno de consideração
Neste Dia
dos Pais, esquivando-me um pouco do senso comum, desejo fazer a priori uma
homenagem às mulheres. A sabedoria popular diz que “por trás de um grande
homem, há sempre uma grande mulher”. Não sei se esta máxima tem lugar-comum
apenas entre casais, pode ser que ocorra nas diversas fases da construção humana.
E, para
ilustrar este meu singelo tributo, rememoro algumas grandes mulheres que “já se
foram”, mas não foram esquecidas. Nem podem ser esquecidas pelo que
representaram na sociedade familiar em que protagonizaram; pela altivez
praticada e a tenacidade que produziram; pela disposição em amar
incondicionalmente, feito mestras a me ensinar que o Amor é o pão da vida.
No meu
ateliê, que costumo usar também como recanto de meditação, estão me
esquadrinhando, velando-me com seus olhares vivos e maternais, três dessas
personagens belíssimas de minha história. Três mulheres abnegadas, que deixaram
um passado positivo em nossa mente e em nosso coração, e por que não dizer
categoricamente, em nossa alma.
Dona
Francisca Pereira Lima foi a luz que iluminou minha vida e me doou a seiva do
amor materno. Poderia pensar que apenas isso já basta ao ser humano, mas não é
só. Antes, trilhou um penoso caminho, perambulou com meu pai numa vida nômade,
dando-lhe o suporte necessário para uma vida conjugal digna, e para um futuro
promissor para os filhos ainda miúdos, fomentando a fé e a esperança, mesmo com
sua curta biografia.
Dona
Victoria Malafaya, de nome exuberante e curto, mas de longa história de vida e
enorme sabedoria. Na sua analfabetíssima rédea de condução da vida, soube me
mostrar seu conhecimento de mundo; ensinou-me que nossas limitações humanas não
são impeditivas para o crescimento interior. Deu-me algum carinho e zelo que
não pude receber da mãe. Minha avó teve um papel fundamental na construção do caráter
humano. Renovou a cada dia minha força, injetando com seu jeito dissimulado de
rudeza um ânimo para viver as asperezas da vida. E foi embora cedo, quando eu
tinha apenas dez anos. Assim que se calou, revelou-me em sonho o seu gesto de
amor e sua preocupação com meu futuro. Ensinou-me a ter fé, tanto quanto
humildade.
Dona
Doroteia Santos colocou-se na minha vida como uma mãe substituta, e tive o
prazer da convivência por longos onze anos, dos meus oito aos dezoito, na exata
fase da vida que precisava moldar minhas atitudes, eliminar meus medos e os
fantasmas da adolescência. Ensinou-me a enfrentar as circunstâncias sociais
mesmo na fase de dificuldades financeiras; a abraçar essas dificuldades para
evitar que elas não saíssem do controle, em meio às ondas fortes ou ventos
contrários, em meio a uma gestão familiar complicada pela falta de mercado de
trabalho para meu sacrificado pai.
Fiz esse
introito também para dizer que aos pais nossos de cada dia, cabe-lhes também
essa justa homenagem. Enquanto a mãe é o suporte existencial para evitar que a
figura icônica do pai tenha “pés de barro” — e se desmorone pelos desvios apontados
para as arapucas da vida —, o pai de verdade tem a capacidade de, embora
ausente, mostrar-se como presença onipotente, e ser antes de tudo um homem
responsável. O pai de verdade é uma espécie de elo para concatenar a candura do
amor da mãe ao desejo íntimo dos filhos; é o olhar de encantamento e sem
censura pela peraltice dos filhos; é o coração macio que apaga esses pequenos
delitos e os coloca na memória para contar no futuro. O pai de verdade é a
experiência de vida que encoraja e estimula os filhos a criarem suas
expectativas dentro de uma realidade humana. É a força e a fé para que os
filhos não hesitem em suas decisões, quando das encruzilhadas do destino. Enfim,
o pai de verdade é essa chama acesa que nunca se apaga, que ilumina como um
clarão, sempre que é requisitado.
Ao pai de
verdade é reservado o panteão dos homens ilustres e inesquecíveis mesmo depois
de sua passagem para outro plano espiritual. Há um espólio a ser consumido
durante a nossa vivência física; há lições que ficam marcadas e atitudes que
ficam sublinhadas para ser usadas como modelos no tempo oportuno.
No
universo bíblico do Novo Testamento, há diversos exemplos de atitudes humanas
que reforçam a tese de que tanto o pai de verdade quanto a mãe de verdade lutam
para preservar a integridade física dos seus descendentes. O capítulo 28 de
Mateus narra o episódio da mulher cananeia que se prostra aos pés de Jesus para
Lhe implorar a cura de sua filha: “Senhor, Filho de David, tem compaixão de
mim. Minha filha está cruelmente atormentada por um demônio”. Depois de um
pequeno diálogo, quando Jesus apercebeu-se de sua perseverança e humildade, lhe
diz: “Mulher, grande é a tua fé; seja conforme desejas”.
O mesmo
evangelista, no capítulo 17, cita o apelo de um desesperado pai que ajoelhado
implora pela cura do filho: “Senhor, tem misericórdia do meu filho. Ele tem ataques e
está sofrendo muito. Muitas vezes cai no fogo ou na água. Teus discípulos não
puderam curá-lo”. Jesus vendo a fé do homem, ordena que a enfermidade mental
deixe o corpo do menino que, imediatamente, ficou curado.
Sendo
assim, a homenagem aos pais de verdade é por extensão uma homenagem às mães de verdade.
Ambos, dentro do contexto bíblico ou do contexto da nossa sociedade familiar
contemporânea, são dignos de deferência.
Sem um
pai não há mãe; sem a mãe não há pai!
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