Detalhe da Sala Arthur Reis, no IGHA |
Há quatro décadas tomei assento no Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas, ocupando a
Cadeira 24, cujo patrono é Frei Gaspar da Madre de Deus. Ocorreu em novembro de 1994, quando sucedi a Dom João de Souza Lima, que fora por décadas pastor da Igreja
amazonense.
Como é de praxe, elaborei e li o discurso de posse, que deve ter a divulgação na Revista da Casa. Como até o presente tal procedimento
administrativo não se consumou, tomei a iniciativa de fazê-lo no meu Blog. Assim
vou proceder por três postagens.
Senhor
Presidente
Comendador
Junot Carlos Frederico,
Demais autoridades
Senhoras e Senhores
Os desígnios divinos e a magnanimidade de
Vossas Excelências consentiram esta solenidade pontilhada de luzes, sobretudo das
intelectuais de seus dirigentes, para abrir-me em
definitivo as portas desta nobre Instituição. Neste
instante, em que me incorporo aos ilustres membros desta Casa de Cultura, acatando
a convocação para “sagrar-me
cavaleiro de uma cruzada de cultura regional, por graça da cordial confiança e
complacente consideração dos integrantes deste silogeu”, especialmente de seu
presidente, comendador Junot Carlos Frederico, cujo trabalho
na direção do Museu de Numismática, hoje instalado no quartel do comando-geral da Polícia
Militar, bem muito nos aproximou. A proximidade foi iniciada pela conversação singela
e pelo interesse mútuo na pesquisa; depois, pelo incentivo e pelo
devaneio em promover o Museu Tiradentes – que me cabia a direção, com
formato atualizado e, acima de tudo, dinâmico.
Detalhe da entrada principal do IGHA
O rendimento desse
trabalho ensejou a proposição de meu nome para integrar
esta Casa. Atitude efetivada pela fidalguia de seu digno presidente que, em duas
oportunidades, abriu-me as consagradas portas do Instituto Geográfico e
Histórico do Amazonas (IGHA): a primeira, quando me permitiu a leitura de livros e obras raras do acervo, com as regalias
de veterano membro; esse manuseio, essa busca incessante pela veracidade histórica, acredito, inoculou-me o vírus
da pesquisa. A segunda, ocorre neste momento
solene, quando adentro pela porta
faustosa, conduzido pela aceitação dos componentes do IGHA, entusiasmados embaixadores dos fastos
amazônicos, para tomar posse na Cadeira 24, cujo patrono é Frei Gaspar da
Madre de Deus.
DO
PATRONO
Nascido Gaspar Teixeira de Azevedo,
na cidade de Santos (SP), em 1699, descendia das mais antigas famílias
instaladas nas cercanias vicentinas. Seu pai – Domingos Teixeira de Azevedo,
era coronel do Regimento de Ordenanças de Santos, e, seu avô, fora capitão-mor
de São Vicente, hoje município de São Paulo.
A morte de seu genitor modificou a destinação da família, pois, dos seis
filhos de Domingos, apenas dois (inclusive duas irmãs) não ingressaram em
ordens religiosas. Assim, em 1715, ao professar na Ordem dos Beneditinos, na cidade de São Salvador (BA), Gaspar tomou a
designação de Madre de Deus.
Em Salvador, mais
de duas décadas adiante, em 15 de agosto de 1732, quando foi ordenado
sacerdote, já obtivera transcendência entre os irmãos religiosos, motivo pelo
qual foi enviado para a sede provincial, no Mosteiro de São Bento (RJ). Licenciado em filosofia
e teologia, por exigência de sua
formação profissional, lecionou estas disciplinas
na própria congregação. Transferido para
a cidade de São Paulo
(SP), foi provincial do mosteiro da Ordem.
Em 1746, encarou
um encargo nobilíssimo para sua irmandade: defender os direitos do mosteiro
beneditino de Santos (SP) e do santuário de Nossa Senhora do Monte Serrat, em
contestação pelos carmelitas. Para cumprimento desta obrigação, redigiu Dissertação e Explicações, calcando sua
tese em bem fundamentados conhecimentos da história da capitania de Santos.
Três anos
depois, defendeu teses de Teologia e História, ocasião em que recebeu o título
de Doutor. Nessa ocasião, declinou do cargo de abade de São Paulo, por não
desejar se retirar do Rio de Janeiro. E mais. Na capital baiana, foi eleito
membro da Academia Brasílica dos Renascidos (1759).
Enfim, frei
Gaspar da Madre de Deus aceitou o encargo de abade do convento do Rio de
Janeiro, assumindo em 2 de outubro de 1763. Durante sua gestão,
que durou três anos, este abade promoveu consideráveis melhoramentos,
essencialmente na biblioteca e no arquivo do convento.
Este encargo foi
encerrado devido sua elevação ao cargo de abade provincial dos Beneditinos no
Brasil, no qual se manteve por um triênio, quando então, aos 70 anos, se
recolheu ao mosteiro de Santos. Ainda retornou por breve tempo ao Rio de
Janeiro, como mestre de noviços.
Quando recolhido
ao claustro de Santos dedicou-se completamente às investigações históricas.
Para bem conduzir suas pesquisas, dedicou-se “em visitar os arquivos, a coordenar a enorme messe de documentos
trazidos do Rio de Janeiro e da Bahia, a traduzi-los e comentá-los”. Não somente os de Santos, mas também os das
cidades do litoral paulista, tanta
dedicação o fez alcançar a capital, a cidade de São Paulo.
Notabilizou-se pela investigação nos arquivos que manuseou, inicialmente no
Rio de Janeiro, onde colheu elementos valiosos para suas obras, quase todas inéditas.
Frei Gaspar escreveu inúmeras obras, não sendo conveniente destacar a mais notável.
Somente para ilustrar este panegirico, relembro:
Memórias para a história da capitania de
S. Vicente, publicada em Lisboa (1797),
e Notícia dos anos em que se descobriu o Brasil
e das entradas das religiões e suas fundações (1784).
A importância deste
religioso para o entendimento da história pátria se tornou incomensurável, seja
pela sua competente formação religiosa, seja como hábil administrador de uma respeitável
congregação religiosa que se espalhou pelo Brasil, seja, enfim, a do mestre de
História que soube recolher com avidez nos documentos então circulantes as
melhores e bem conceituadas asseverações sobre nossa História. Foram esses admiráveis
atributos, estou convicto, que conduziram os dirigentes do IGHA a outorgar-lhe o
patronato da Cadeira 24.
Frei Gaspar da Madre de Deus morreu em sua cidade natal, aos 81
anos, em 1800.
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