Esta publicação ocorreu no jornal Amazonas Em Tempo, na temporada do
centenário deste conflito nacional, em 1997. Reproduzo o texto, com pequenos
reparos, rememorando a data (8 nov.) do retorno da tropa do Amazonas que avançou
contra os adeptos de Antonio Conselheiro.
Este episódio está sendo narrado em livro — Cândido Mariano & Canudos — do coronel PM Roberto Mendonça que será lançado, em setembro, pela Editora da Universidade do Amazonas. O autor traça a biografia de Cândido José Mariano, tenente de engenheiros, que veio para Manaus comandar o 1º batalhão da Polícia Militar, em 1896, um ano antes do conflito. Mendonça descreve a trajetória do batalhão amazonense, para combater os camponeses liderados por Antonio Mendes Maciel, o Conselheiro, com um rico material de pesquisa, desde Manaus até Monte Belo. A seguir, os primeiros preparativos da longa marcha.
4 de agosto de 1897Na manhã deste dia, embarcou o 1º batalhão para combater em Canudos. A escala inicial foi em Belém do Pará, para tomar o transporte de guerra Carlos Gomes. "Assim, a tropa, sob o comando do tenente-coronel Cândido Mariano, desfilou com garbo desde a Praça D. Pedro II, antigo Largo do Quartel, já remodelada pelo Pensador, onde assisti, em 1897, a partida das tropas amazonenses para Canudos", conforme testemunhou o mestre Agnelo Bittencourt.
O monumental roadway de Manaus ainda era projeto, pois foi inaugurado anos depois. Em razão disso, a tropa utilizou o Trapiche 15 de Novembro, onde o embarque era realizado por meio de barcos menores, pois os navios permaneciam ao largo, por falta de ancoradouro.
Imagine-se a forte presença da população, devido ao inusitado acontecimento da saída de amazonenses para a guerra. As notícias sobre o desfecho das lutas em Canudos fervilhavam no país, especialmente depois da derrota da 3ª expedição, sob o comando do coronel Moreira César (alcunhado de corta-cabeças). Imagine-se os familiares dos combatentes — mulheres e filhos, parentes e amigos, além dos inevitáveis curiosos na despedida entrecortada de lágrimas, lastimosa por tudo, devido a incerteza do retorno.
O vapor Botelho — barco regional de propriedade da Casa A. Bernaud & Cia., finalmente desatracou e partiu, levando a esperança da pátria, deixando, no entanto, a incerteza do retorno de tantos filhos. Deve ter sido um dia tenebroso para a cidade de Manaus.No Botelho embarcaram 12 oficiais (contados dois civis, assim comissionados: capitão Rafael Machado e tenente Demétrio Melo de Oliveira), entre os quais o tenente Emídio Bayma (ainda com descendentes em Manaus), mestre da Banda de Música.
O comandante da tropa era o tenente-coronel (em comissão) Cândido José Mariano, jovem de 27 anos, nascido na cidade de Alfenas (MG). Na verdade, engenheiro militar do Exército por conclusão do curso na então Escola Superior de Guerra. Na Escola Militar fora contemporâneo de alguns brilhantes colegas, convém assinalar o nome de Euclides da Cunha que, na questão conselherista, teria marcante desempenho com seu livro Os Sertões.Mariano viera do Distrito Federal (Rio) para Manaus, em setembro de 1896, a convite do governador Fileto Pires, para comandar um dos batalhões da Polícia Militar.
Embarcaram no Botelho 249 praças, incluídos 12 músicos, sem que o arquivo da Corporação possua os nomes destes comandados. Alguns poucos nomes resistiram a esta incúria. São desconhecidos em sua totalidade. Os músicos constituíam parte substancial da Banda policial, daí os diversos elogios registrados quando tocaram a música. Todavia, pode se perguntar: para que instrumento musical na guerra? Era praxe, para estimular e coordenar os combatentes na luta e, na folga, proporcionar o necessário relaxamento.
Outro fato que convém sublinhar, é a presença de um número avantajado de nordestinos na tropa. A proporção de arigós na Polícia Militar de então estava em torno de setenta por cento. Ou seja, em dez policiais, apenas três eram amazonenses.
Na madrugada de 5 de agosto, o vapor Botelho atracou em Itacoatiara. Em plena madrugada, o comandante da tropa dirigiu-se à residência do alferes Floriano Lins que, naquela cidade, convalescia, juntamente com outros praças. Narra o cronista da época que o alferes ao perceber o convite de seu comandante, vestiu-se num ápice, afivelou o cinturão, entrouxou alguma roupa, e despedindo-se da família seguiu para bordo. Outros anônimos praças devem ter copiado o gesto deste oficial.
A convalescência em Itacoatiara fundamentava-se na conduta médica do final do século, aquela que prescrevia o afastamento do doente da cidade para tomar novos ares no interior. Este fundamento médico perdurou por longos anos. E, por essa razão, o governador Silvério Nery (1900-1904) construiu naquela cidade um Sanatório Militar, para atender aos policiais. Construído em madeira, existiu onde hoje se encontra a direção dos serviços de águas e esgotos, ao lado da Matriz, segundo informa Francisco Gomes, competente estudioso dos fatos históricos da Velha Serpa.
No final deste dia, o barco e tropa chegaram a Parintins, onde aconteceram manifestações de ocasião. Prosseguiu a viagem, tocando no dia seguinte, em Santarém, já em território paraense. Mas, devido as dificuldades próprias da navegação regional, o Botelho chegou a Belém na manhã de domingo – dia 8.
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