Manoel Mendonça, ao casar, 1942 |
Cumpri
ontem à tarde, ensolarada pelo verão amazônico, um sagrado dever filial:
levar à sepultura meu venerado pai. José Manoel Mendoza morreu aos 97 anos, às vésperas do centenário,
na cidade de São Paulo, onde residia transitoriamente. Amava de verdade a
capital amazonense e, sem que tenha disposto, seu corpo atravessou o Brasil,
como se despedindo do país que acolheu o peruanito
ainda na segunda década do século passado, para ser sepultado em Manaus.
Antes
de ir em frente com o registro, desejo esclarecer a diferença entre o sobrenome
dele e o meu. Primeiro o Mendonça. Quando
meu pai, imigrante analfabeto e sem documento, com dez anos, desembarcou em
Manaus, passou a ser conhecido por Manoel “peruano”. Legalmente, assinava Manoel
Mendonça. Com este sobrenome, estranhamente, casou-se em Iquitos (Peru), e deste
fato resultou na esposa e nos três primeiros filhos esta marca.
Agora
o Mendoza. Na condição de viúvo, contou-me que buscou o consulado peruano em
Manaus para regularizar sua documentação. Também estranhamente saiu dessa
repartição com um novo nome: José Manoel Mendoza. Este “novo homem” contraiu as
segundas (?) núpcias, resultando gravando este sobrenome na esposa e nos cinco filhos.
Assim foi substituído meu pai e já órfão materno, que havia falecido. Confesso, contudo, que ganhei nova mãe com
Dona Dora.
Realizamos
uma “festa”, como recomendou o vigário na homilia com que encomendou o corpo do velho
paroquiano. A morte deve uma passagem para uma nova existência, portanto,
alegremo-nos. O velório à moda antiga não dispensou almoço e merenda (lanche em
amazonês) e um amplo encontro de familiares e amigos do seu Manoel “peruano”. A todos - sem distinção - agradeço penhoradamente.
Para
encerrar, uma palavra pesarosa sobre o cemitério. É uma tristeza generalizada,
a começar pelo prédio da administração, caindo aos pedaços. “Operários” em busca de algum serviço,
amontoados a entrada, atacam qualquer visitante, com ofertas as mais variadas. Arrisquei
pagar por uma limpeza ao túmulo da família, coisa para arrancar alguma
vegetação ressequida e uma vassourada em redor. Joguei dinheiro fora, pelo porco
trabalho realizado. Contratei outro para fechar o jazigo após o enterro. O serviço
não pôde ser realizado porque o coveiro estava cansado e, pior, não havia
adquirido o material necessário. Enfim, falar em quadra, fila e número da
sepultura, no São Francisco, é um acinte, um exercício de adivinhação, tal a irregular
disposição das covas, devido ao declive do terreno e, mais ainda, da indolência
dos administradores.
São Francisco, rogai por nós!
Prefeito
Artur Neto, velai pelo nosso patrimônio!
Seu
Manoel Mendonça (za), olhai pelos seus agradecidos descendentes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário